10 Março 2014
Uma explosão de presenças no simpósio da Congregação vaticana: efeito Francisco, escândalos e crises. "Os bens não pertencem a quem os gerencia, mas sim a Deus e aos pobres"
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada no sítio Vatican Insider, 08-03-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No fim, os pedidos de ecônomas e ecônoomos de congregações religiosas de todo o mundo para participar do simpósio "A gestão dos bens eclesiásticos dos Institutos de Vida Consagrada e das Sociedades de Vida Apostólica a serviço do humanum e da missão da Igreja", que ocorre nesse sábado e domingo em Roma, foram mais de mil. Demais até mesmo para o grande auditório da Pontifícia Universidade Antonianum. E assim a Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, que organizou o evento "desejado pelo Papa Francisco", se viu obrigada a recusar com relutância muitos pedidos.
Um sucesso inesperado no dicastério liderado pelo cardeal brasileiro João Braz de Aviz (um dos poucos com uma mulher subsecretária, a Ir. Nicla Spezzati), ao qual fazem referência 195.759 religiosos e 756.385 religiosas de todo o mundo (dados de 2012).
Em uma pausa dos trabalhos, Dom José Rodriguez Carballo, secretário da Congregação, explica a situação desta forma:
"Partindo da experiência do dicastério, estamos vendo que a gestão dos bens é um tema que interessa a todos. Por um lado, quer-se responder levando em conta os valores evangélicos, os valores eclesiológicos e os valores carismáticos. Por outro, nem sempre se consegue unir esses valores com as exigências do mercado. Portanto, realmente, esse tema preocupa", afirma.
"Outro motivo – continua – é que, como estamos vivendo uma redução de vocações para a vida consagrada, encontramo-nos diante de certos institutos que têm grandes obras para gerenciar – hospitais, escolas –, mas a mão de obra para gerir esses bens diminui. Então, há a preocupação de que os bens eclesiásticos continuem sendo bens eclesiásticos e continuem respondendo à missão para a qual foram criados. São necessárias orientações", diz.
"De fato, no fim do congresso, vamos oferecer algumas orientações e depois faremos um amplo documento, já em elaboração, para todos os consagrados, em que realmente oferecemos orientações muito precisas, que garantam, de um lado, as exigências de qualquer gestão, como a transparência, importantíssima; de outro, exigências como, por exemplo, a relação deve haver entre a Igreja local e a Igreja universal. Eu reconheço que isso nem sempre é fácil, não por má vontade de um lado ou de outro, mas simplesmente porque às vezes não há clareza sobre tudo. Acho, portanto, que desse simpósio surgirão indicações muito precisas para que essa gestão dos bens responda aos valores evangélicos, eclesiológicos, carismáticos, tendo em mente as necessidades dos pobres e, ao mesmo tempo, respondendo às expectativas da sociedade atual, como a transparência total e absoluta".
Eis a entrevista.
A gestão dos bens sempre foi a cruz e a bênção das ordens religiosas. Tem-se a impressão, no entanto, de que nesse momento veio à tona uma maior atenção. Ela está ligada à figura do Papa Francisco, aos escândalos que surgiram com relação a algumas ordens religiosas ou à crise econômica?
Eu acredito que não se pode separar nenhum desses três elementos. Um separado dos outros dois não explicaria suficientemente a preocupação pela gestão dos bens. O Papa Francisco está nos ensinando um modo concreto para gerir os bens. Devemos ouvir atentamente todas as suas indicações, e não apenas as palavras, que são importantíssimas, por exemplo a exortação apostólica Evangelii gaudium, mas também o que nos é dito com os gestos que o papa faz.
Talvez, às vezes, dissociemos as palavras dos gestos. Eu acredito que, principalmente neste pontificado, devemos estar muito atentos tanto às palavras quanto aos gestos. Por outro lado, houve escândalos. A Igreja, os consagrados onde esses escândalos ocorreram devem pedir perdão. Mas, ao mesmo tempo, devem colocar em ação diversos modos de gerir bens econômicos para que esses escândalos não se repitam. Por fim, a crise econômica: a vida consagrada nasceu particularmente para estar perto dos mais necessitados. Todos os carismas, alguns mais, outros menos, nasceram em circunstâncias em que havia a necessidade de uma determinada presença e de uma determinada atividade. E sempre em favor dos mais pobres.
Neste momento de crise econômica, nós, consagrados, não podemos viver de costas para essa realidade dramática. Portanto, também na gestão dos bens, os pobres devem estar no início, durante e depois da gestão dos bens. Eles devem ter um protagonismo particular. Porque é uma questão de justiça.
Não é comunismo, como dizia o teólogo brasileiro Hélder Câmara e como reiterou o Papa Francisco...
Certamente, é questão de justiça. Os bens não são propriedade minha, do instituto que os gerencia. São propriedade de Deus, que os dá a todos e para todos. Então, eu sou um mero gestor. Isso não é fácil de entender em uma sociedade em que o "meu" prevalece sobre o "nosso". Mas, evangelicamente, está claro.
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''Transparência absoluta a partir de agora nos bens da Igreja'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU