09 Novembro 2015
"Para alimentar uma população crescente de seres humanos mais de 60 bilhões de animais terrestres são mortos todos os anos e a escravidão animal é responsável pelo confinamento de 19 bilhões de galinhas, 1,4 bilhão de bovinos, 1 bilhão de porcos, 1 bilhão de ovelhas e um número considerável de cabritos, búfalos, coelhos, capivaras, javalis, avestruzes, gansos, perus, patos, etc., segundo dados da FAO. O sofrimento imposto às outras espécies é imenso", escreve José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, em artigo publicado por EcoDebate, 06-11-2015.
Eis o artigo.
A invisibilidade da escravidão e do sofrimento animal é um fato real que a miopia humana finge desconhecer. A dominação e a exploração animal é uma realidade que o cérebro evoluído, inteligentemente e egoisticamente, ignora. Por conta disto, o movimento abolicionista animal é pouco conhecido e valorizado.
O abolicionismo animal é um movimento que defende os direitos das espécies, advoga a abolição da dominação e da exploração dos animais por meio de uma ética biocêntrica que respeita a vida de todos os seres sencientes da Terra. Em geral, defende o veganismo e a educação não violenta e criativa, como base moral da posição dos direitos animais.
Para Peter Singer, grande número de animais são suficientemente semelhantes aos humanos, quando se adota o critério da senciência ou consciência, com ênfase na capacidade de sofrer dor e ter prazer, merecendo uma consideração moral semelhante. Os animais sencientes não devem ser instrumentalizados pela racionalidade gananciosa do ser humano, mas sim devem ser sujeitos de direito. O movimento pelo abolicionismo animal defende atitudes, tais como:
Pela dieta vegetariana;
Pela dieta vegana;
Pelo fim da comercialização do patê de fígado gordo – o foie gras;
Pelo fim da exploração e do enjaulamento animal;
Pelo fim dos rodeios;
Pelo fim da touradas;
Pelo fim das corridas de cavalo;
Pelo fim do uso de animais nos círcos;
Pelo fim dos aquários;
Pelo fim da experimentação animal;
Pelo fim dos zoológicos;
Pelo fim do mau trato animal;
Pelo aumento das áreas anecúmenas;
Pelo aumento das áreas selvagens e pela liberdade animal;
Etc.
O grande economista inglês John Stuart Mill, além de defender o Estado Estacionário já em 1848, também era adepto das ideias de Jeremy Bentham (que foi amigo de seu pai e fundador do utilitarismo). O utilitarismo reconhece o princípio hedonista segundo o qual a finalidade da vida humana é a felicidade e a fruição dos diferentes prazeres, aqueles ligados ao corpo, ou os prazeres ligados ao espírito e aos sentimentos nobres da amizade, da honestidade, do amor, etc. Estes prazeres permitem ao ser humano encontrar a felicidade.
A utilidade (princípio da maior felicidade), sustenta que as ações são certas na medida em que elas tendem a promover a felicidade e erradas quando tendem a produzir o contrário da felicidade. A felicidade é um Bem Supremo e todas as atitudes moralmente boas surgem como instrumentos para alcançar a felicidade. Por felicidade entende-se prazer e ausência de dor, por infelicidade, dor e privação do prazer. Sem ser antropocêntrico, Stuart Mill considerava que cabe às pessoas inteligentes escolher agir com retidão no sentido do bem de todas as espécies.
Mas os humanos, em geral, são narcisistas, egoístas e egocêntricos e menosprezam as demais espécies do Planeta. O biólogo da Universidade de Harvard, Edward Osborne Wilson, duas vezes vencedor do Prêmio Pulitzer, acredita que o ser humano está provocando um “holocausto biológico” e para evitar a “sexta extinção em massa de espécies”, ele propõe uma estratégia para destinar METADE DO PLANETA exclusivamente para a proteção dos animais. A tese também é defendida pela jornalista Elizabeth Kolbert no livro The Sixth Extinction. A alternativa de redução das áreas ecúmenas seria uma forma de se contrapor ao humor humano, que varia entre o ódio e a indiferença em relação a existência e a felicidade das demais espécies sencientes da Terra.
Para alimentar uma população crescente de seres humanos mais de 60 bilhões de animais terrestres são mortos todos os anos e a escravidão animal é responsável pelo confinamento de 19 bilhões de galinhas, 1,4 bilhão de bovinos, 1 bilhão de porcos, 1 bilhão de ovelhas e um número considerável de cabritos, búfalos, coelhos, capivaras, javalis, avestruzes, gansos, perus, patos, etc., segundo dados da FAO. O sofrimento imposto às outras espécies é imenso. Além disto, o boi e a vaca, por exemplo, são animais ruminantes cujo processo digestivo provoca uma fermentação que faz o animal liberar muito gás metano. O metano é o segundo gás que mais contribui para o efeito estufa, sendo 21 vezes mais poluente do que o gás carbonico (CO2). Cada animal bovino adulto libera cerca de 56 quilos de metano por ano. Portanto, os 1,4 bilhão de bois e vacas do mundo liberam algo em torno de 78 milhões de toneladas de metano por ano, o que é uma contribuição significativa para o aquecimento global.
No dia 26/10/2015, a Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC, na sigla em inglês) da Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou a classificação das carnes processadas como produtos carcinogênicos, ou seja, que causam câncer, e das carnes vermelhas como produtos “provavelmente carcinogênicos”. Como mostra Martín Caparrós, em matéria do jornal El País (31/10/2015), comer um bife/chuleta/filé, um grande pedaço de carne, é uma das formas mais eficazes de validar e aproveitar um mundo injusto: “Consumir animais é um luxo: uma forma muito clara de concentração da riqueza. A carne acumula recursos que poderiam ser compartilhados: são necessárias quatro calorias vegetais para produzir uma caloria de carne de frango; seis para produzir uma de porco; dez calorias vegetais para produzir uma caloria de vaca ou de cordeiro. A mesma coisa acontece com a água: são necessários 1.500 litros para produzir um quilo de milho, 15.000 para um quilo de carne de vaca. Isto é, quando alguém come carne se apropria de recursos que, compartilhados, seriam suficientes para cinco, oito, dez pessoas. Comer carne é estabelecer uma desigualdade brutal: sou eu quem pode engolir os recursos de que vocês precisam. A carne é um estandarte e é uma mensagem: que este planeta só pode ser usado assim se bilhões de pessoas se resignarem a usá-lo muito menos. Se todos quiserem usá-lo igualmente não pode funcionar: a exclusão é condição necessária — e nunca suficiente”.
Como mostraram Luiz Carlos Susin e Gilmar Zampieri no livro “A vida dos outros: Ética e teologia da libertação animal” (São Paulo: Paulinas, 2015), a relação entre humanos e animais sempre foi cruel: “mas com o incremento da indústria da carne, ovos, leite e seus derivados, com a indústria do couro, pele, com indústria dos cosméticos e produtos químicos testados em animais, aumentou assustadoramente, a ponto de o prêmio Nobel de literatura, J.M. Coetzee, em seu livro A vida dos animais (São Paulo: Companhia das Letras, 2002), sugerir uma instigante analogia entre o holocausto humano perpetrado aos judeus na segunda guerra mundial, e o holocausto animal imposto, diariamente, pelo homem aos indefesos e inocentes animais. A conclusão é que o termo ‘campos de concentração’ é o que melhor define a nossa relação com os ‘outros’ animais. A primeira parte do livro se debruça sobre esses ‘campos de concentração’ (estimação, pesquisa, instrumentos, entretenimento, alimentação) mostrando como os animais, no atual estágio da indústria, são coisificados, sem consideração para com seus interesses e direitos” (IHU, 01/11/2015).
Não dá para ignorar o holocausto animal. Não dá para ser feliz com base na infelicidade alheia. Utilitarismo é diferente de utilidade. O princípio da utilidade deveria valer para todos os seres sencientes. Como disse Brian Dominick: “É absurdo pensar que uma sociedade que oprime animais será capaz de se tornar numa sociedade que não oprime pessoas”. Ou seja, a sociedade humana jamais será feliz, com base na infelicidade das comunidades de animais sencientes.
Referências:
ALVES, JED. Dia Mundial pelo fim do Especismo: 22 de agosto. Ecodebate, RJ, 19/08/2015
ALVES, JED. Dia Mundial do Meio Ambiente: vergonha de ser humano. Ecodebate, RJ, 04/06/2014
OLIVEIRA, Gabriela D. A teoria dos direitos animais humanos e não-humanos, de Tom Regan. Ethic@,Florianópolis, v.3, n.3, p. 283-299, Dez 2004
Brasil está atrasado em direito dos animais, diz ONG que coloca o tema em debate, Ecodebate, 02/10/2015
CAPARRÓS, Martín. A Era da Carne, El país, 31/10/2015
http://brasil.elpais.com/brasil/2015/10/30/internacional/1446220690_355590.html
Por uma teologia da libertação animal. Entrevista especial com Luiz Carlos Susin e Gilmar Zampieri, IHU, 01/11/2015
SINGER, Peter. Libertação animal, Martins Fontes, 1975
SMAJE, Chris. Re-wilding: Joined-up Thinking Needed, Resilience, Oct 29, 2015
Instituto Abolicionista Animal
ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais
ANDRADE, Rodrigo. Introdução ao Abolicionismo Animal, 2012
Pelo fim da Escravidão Animal
Escravidão animal
Eradicating Ecocide
Dia mundial (22/08) contra o Especismo:
http://end-of-speciesism.org/
http://www.end-of-speciesism.org/pt/reivindicacoes/
Anima: http://www.anima.org.ar/novidades/index.html
Ana María Aboglio. Direitos animais: O enfoque abolicionista.
Ética e Direitos Animais – Sônia T. Felipe
A Carne é Fraca – documentário completo
“Carne Sofriboi”, do chargista Maurício Ricardo
Documentário “Linha de Desmontagem”
Se os abatedouros tivessem paredes de vidro – com Paul McCartney (dublado em português)
Ser humano espécie invasora e praga sobre a Terra?
Como o ser humano destrói o planeta http://www.youtube.com/watch?v=WfGMYdalClU
http://www.huffingtonpost.com/2014/03/27/everything-wrong-with-humanity-animation_n_5037496.html?utm_hp_ref=mostpopular
Ubuntu 4 Animals https://www.facebook.com/Ubuntu4Animals
Escravidão e Movimento Abolicionista Animal
Abolicionismo Pelos Animais 1/3
Meat The Truth: https://youtu.be/u7LBPHtOBnk
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