05 Agosto 2015
Eis as novas superpotências: negócios e religião. Os trabalhos e os deuses. Quanto mais entramos no terceiro milênio global, mais emana sua força. Desta tudo depende: a riqueza material e espiritual, om bem estar das famílias, empresas e comunidades, a cultura e a identidade, o espaço e o tempo.
A reportagem é de Marco Ventura, publicado por La Lettura, 02-08-2015. A tradução é de Ivan Pedro Lazzarotto.
Negócios e religião controlam as engrenagens cruciais: o crédito e o débito, a fé e a fidelidade, a pobreza e a riqueza. Dão estabilidade e movimento, fazem uma ponte entre o passado e o futuro. Tem o perfume antigo do incenso e do papel moeda, e o gosto instantâneo do e-commerce e dos tweets de um imame. Resistem no tempo como bancos e mosteiros, e se reinventam como os derivados da cientologia. Nenhum poder melhor que estes sabe interpretar a polaridade da era global.
Negócios e religião são mestres de valores intangíveis – de tesouros investidos no próximo produto financeiro ou nas orações que abrem as portas do paraíso – mas também em dar valor aquilo que se toca, da água sagrada do Ganges ao petróleo nigeriano. Movem-se além dos confins, incentivam a circulação, e ao mesmo tempo se plantam no território, enraizando. Estão confortáveis com a emoção e o desejo; com a adrenalina e o desconforto.
Depois do fim do mundo bipolar, no caos do terceiro milênio, os negócios e a religião estão cada vez mais potentes. Podem cair, mesmo que estrondosamente, como nas cabeças cortadas pelos muçulmanos e nas crianças violadas pelo cristianismo, como nas bolhas especulativas e nos tremores da Bolsa, mas se retomam. Erguem-se novamente. Comandam indivíduos e massas, dão forma a sociedade e a política. Têm poder de vida e de morte. Insinuam-se por toda parte: nem mesmo o ateu inverterado ou o militante radical podem evitar.
Quanto mais cresce a sua energia, mais os negócios e a religião são tentados a duelar entre si, como fazem desde o início dos tempos. A religião coloca Deus acima da carne: nem só de pão vive o homem. Os negócios colocam o homem acima dos anjos: dai-nos hoje o nosso pão de cada dia, e nos promete mais pão, e melhor, também para amanhã.
O nosso tempo, porém, parece propício a um pacto entre as duas forças. A uma aliança entre o mundo do trabalho e o mundo do divino. O eixo entre os negócios e a religião venceu a guerra fria contra o comunismo ateu, inimigo da liberdade de imprensa e do culto. Por 25 anos, se consolidou no modelo ocidental, principalmente americano, da liberdade de religião na liberdade de mercado.
Superou a própria matriz protestante e conquistou espaço no catolicismo, islamismo e nas religiões orientais. Superou a crise de crédito e das finanças sem economia inventando as empresas e os investimentos socialmente responsáveis. Se multiplicam os sinais, hoje, que a aliança entre negócios e religião é uma forte ideia, capaz de ações e de estratégias.
A Religious Freedom and Business Foundation é a organização não governamental e não confessional americana mais ativa na busca por uma fundação teórico-empírica na aliança entre a religião e os negócios e na mobilização de protagonistas internacionais da política, da fé e da economia. A Fundação é parceira da Global Compact das Nações Unidas, a plataforma que reúne participantes, sejam comerciais ou não, interessados no desenvolvimento de uma economia global “sustentável e inclusiva”. O último fruto da parceria, anunciado há poucos dias, é a instituição de um prêmio para os projetos empreendedores que melhor combinarem a ética nos negócios, o diálogo inter-religioso, desenvolvimento e pa.
A partir dos jogos paraolímpicos do Rio de Janeiro em 2016, os Global Business & amp; Interfaith Peace Awards serão atribuídos a cada dois anos, por ocasião das olimpíadas de verão e de inverno. Poderão concorrer ao prêmio quatro categorias de empreendores: multinacionais, nacionais, jovens e mulheres.
A Religious Freedom and Business Foundation foi criada por Brian Grim, batista americano convertido ao catolicismo em 1994 e testemunha da repressão antirreligiosa ao longo dos anos como educador e evangelizador na União Soviética, China e Arábia Saudita. Como cientista social, Grim trabalhou para o Pew Research Center com questões importantes sobre o tema da demografia religiosa e das restrições à liberdade de culto. O destino de uma vida intensa é a visão de uma aliança entre negócios e religião, a ser construído em duas fases. Na primeira fase, a religião contribui a um modelo de negócio global sustentável e igualitário. Na segunda fase, o negócio sustentável se estende ao mundo, gera desenvolvimento, estimula culturas e religiões ao diálogo e constrói a paz.
Se é justa no início, a aliança entre negócios e religião é acima de tudo benéfica na prática. Em diversas publicações Brian Grim ressaltou, com base em dados, como os países onde a liberdade de imprensa e a liberdade de religião são pisoteadas, e por consequência é maior a taxa de hostilidade religiosa, são os menos desenvolvidos em relação aos mais importantes indicadores de competitividade global. Questionado pelo “La Lettura”, Grim se mostra seguro nas próprias teorias e convencido da necessidade e da possibilidade de um projeto de desenvolvimento baseado na liberdade de negócio e de religião. Não teme a crítica feita pelo Papa Francisco às injustiças da economia global, a reconhece em seu modelo.
Está exatamente em negócios sustentáveis, sustenta Grim, a resposta “às duas pobrezas, aquela com P maiúsculo da corrupção endêmica e dos grandes desequilíbrios, e aquela com p minúsculo de um desenvolvimento insuficiente”. O estudioso é também persuasivo sobre o valor universal da sua proposta: “Este não é um projeto americano, mas um projeto humano, adaptável a cada pessoa e a cada cultura, porque a economia e a fé podem unir aquilo que está dividido”.
Daí o apoio a Fundação dado pelo ex Primeiro Ministro Britânico Tony Blair para o que Grim define como o único real “antídoto à radicalização” em particular no islamismo, ou a ação comum de parceiros econômicos e religiosos. As superpotências do novo milênio, os negócios, a religião, se procuram, conversam, se voltam uns para os outros. Dessa e de outras milhares de maneiras. Quanto mais isso acontece, mais se torna difícil distinguir um do outro. Os negócios se transformam em deuses. Deus se transforma num negócio.
O estudioso francês Lionel Obadia, autor de um importante libro sobre a comercialização do que é religioso, captou o fenômeno. A religião é cada vez mais utilizada na empresa, para dar gás ao gerente depressivo, ou para narcotizar o pessoal rebelado. Os negócios são cada vez mais utilizados nas comunidades religiosas para melhorar a organização, a propaganda, a gestão. O islamismo penetra na Bolsa americana impondo a Dow Jones um Islamic Market Index compatível com a Sharia. Índices análogos não são mais uma novidade.
A separação entre Estado e Igreja do século XIX, para Cavour “Igreja livre no Estado livre”, era conhecida como a melhor maneira de proteger a identidade peculiar de integrantes profundamente diferentes. No declínio atual do Estado nacional e das organizações religiosas tradicionais, a proposta de uma “fé livre em um mercado livre” vai na direção oposta. Embarcações com certezas econômicas e religiosas em um mundo com bordas suaves e fronteiras porosas. No entanto, homens de negócios e homens de Deus, creem de se aliar em prol de um objetivo claro e relativamente certo, no intuito de identidades definidas.
A aliança entre negócios e religião é do contrário um extraordinário caldeirão de híbridos, um experimento do qual sairão novos povos. Acima de tudo, um negócio novo e uma nova religião.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A santa aliança entre negócios e fé - Instituto Humanitas Unisinos - IHU