03 Fevereiro 2015
O encontro é fixado em Bagdá, para o próximo dia sete de fevereiro. O Patriarca Louis Raphael I Sako convocou para aquele dia, na capital iraquenha, um sínodo extraordinário dos bispos da Igreja caldaica, que seguirá a consagração de dois novos bispos e se prenuncia como uma prestação de contas. Na ordem do dia está o braço de ferro que contrapõe há tempo o Patriarca a bispos e setores da diáspora caldaica da América do Norte. Uma desavença de efeitos potencialmente devastantes, numa época em que os problemas e as emergências que revolvem o Oriente Médio estão acelerando a fuga dos cristãos autóctones das terras da antiga Babilônia.
A reportagem é de Gianni Valente, publicada pelo Vatican Insider, 30-01-2015. A tradução é de Benno Dischinger.
O ‘casus belli’ é representado pelo grupo de sacerdotes e monges que no decurso dos últimos anos haviam deixado as próprias dioceses e as próprias casas religiosas no Iraque sem a permissão dos superiores e se haviam transferido para os USA e outros países ocidentais, engrossando as fileiras das mais opulentas dioceses da diáspora caldaica. Em outubro passado, o Patriarca havia publicado um decreto pelo qual lhes ordenava reentrarem na base ou acordarem com bispos e chefes da comunidade a regularização da própria transferência. O falhado acolhimento das disposições patriarcais teria feito desencadearem-se medidas canônicas disciplinares como a suspensão do serviço sacerdotal e a anulação de toda forma de retribuição. Mas até hoje, na maior parte dos casos, as indicações do Patriarca caíram no vazio. E os sacerdotes e religiosos que se transferiram aos USA sem consenso encontraram apoio do bispo Sarhad Jammo, titular da eparquia de São Pedro dos Caldeus, com sede em San Diego, na Califórnia.
A resistência às disposições patriarcais assumiu também os caracteres da disputa teológica e canonística. O bispo Janno fez apelo aos cânones do Código que limitam territorialmente a validez dos atos disciplinares dispostos pelo Patriarca, e como bispo católico reivindicou dever responder somente ao Papa, e não ao patriarcado. Depois, nas últimas semanas, a mídia dos Estados Unidos com base na Califórnia, relançaram as vozes segundo as quais a causa dos “clérigos vagantes” teria encontro protetor também em Roma: segundo o Los Angeles Times, um recurso deles à Santa Sé teria tido êxito positivo, e o próprio Papa Francisco, com uma “decisão dirimente”, teria de fato zerado as disposições patriarcais, estabilizando os sacerdotes e religiosos caldeus envolvidos no trabalho pastoral nas dioceses USA e anulando para eles a obrigação de retornarem ao Oriente Médio. “Dizer-me que volte ao Iraque equivale a dizer-me: vai e suicida-te”, afirmou o padre Noel Gorgis, operante na paróquia caldaica de El Cajon, que numa acurada entrevista assumiu os panos da vítima de ordens desconsideradas de quem quereria constrangê-lo ao martírio, impelindo-o a retornar às terras ensangüentadas das incursões jihadistas. Além disso, na mídia USA também a acusação de insubordinação foi descarregada sobre o Patriarca e sobre sua ventilada intenção de não respeitar as presumidas indicações enviadas ao Papa.
As indiscrições feitas filtrar na mídia californiana pareceriam delinear cenários controversos, com implicações inconvenientes também do ponto de vista ecumênico: se o Bispo de Roma realmente intervém com autoridade para anularas medidas disciplinares dispostas por um Patriarca católico, os primeiros a esfregar-se as mãos seriam aqueles setores das Igrejas do Oriente separadas de Roma que continuam a denunciar o ecumenismo como instrumento insidioso do remanescente despotismo “papista”.
Na realidade, até agora, não houve nenhuma rejeição papal às ordens do Patriarca. Ao invés, no clima exasperado da controvérsia, também a intervenção “romana” foi feita filtrar na mídia de forma parcial e enganadora. De Roma, antes do Natal, se realizou a Congregação vaticana para as Igrejas orientais que enviou uma carta, firmada pelo cardeal Prefeito Leonardo Sandri, para expressar o convite a uma composição fraterna e racional da controvérsia, autorizando pro tempore os sacerdotes atingidos pelas medidas disciplinares a permanecerem nos USA e celebrarem missa para assegurar o normal desenvolvimento das celebrações litúrgicas, à espera de uma solução definitiva do caso.
O sínodo convocado em Bagdá para fevereiro é chamado a desatar os nós e a verificar a coesão do episcopado caldeu em torno ao Patriarca, num cenário assinalado por uma polarização exasperada. Segundo juízo de Louis Raphael I, a única solução praticável passa através das demissões do bispo Jammo. Este último, provavelmente, não se apresentará à assembléia sinodal, depois de já ter desertado das assembléias sinodais de 2013 e 2014 e ter-se recusado a aplicar o novo missal aprovado pelo Sínodo. Naquela situação, a Santa Sé poderia ser chamada a intervir. “Eu espero que o Vaticano apóie a linha do Patriarcado. Se assim não for, para a Igreja Caldaica será o fim”, declarou o Patriarca numa entrevista ao website Baghadhope, anunciando também que em caso contrário será ele a renunciar ao cargo patriarcal “que não teria mais nenhum sentido, senão aquele de um titulo honorífico ao qual não me atenho”.
Em todo o caso, a controvérsia pôs em relevo a fragilidade e os pontos de sofrimento que a tempo assinalam o caminho da Igreja caldaica. Chamando a atenção também sobre a relação problemática que muitas Igrejas do Oriente vivem com as respectivas comunidades na diáspora, com frequência influentes e mais dotadas também de meios financeiros.
Os sacerdotes e religiosos transmigrados ao Ocidente sem autorização, levando talvez consigo os respectivos clãs familiares, em alguns casos se apresentaram como pessoas constrangidas a escolher entre a desobediência e a morte certa. Uma auto-justificação que encontra fácil apoio nos alarmes indistintos e sumários sobre a sorte dos cristãos nos Países do Oriente Médio. Mas que soa como um forçar vitimista e ofensivo para todos os sacerdotes, os religiosos e as religiosas que continuam a servir o seu povo nas igrejas nas casas e nas tendas dos campos de prófugos. “Atualmente”, referiu o Patriarca Louis Raphael na entrevista citada, “no Iraque vivem em torno de 400 mil cristãos dos quais mais da metade caldeus, e estes últimos podem contar com 75 sacerdotes diocesanos e 15 monges. Uma realidade de sofrimento, vistos os acontecimentos dos últimos anos, que necessita de todas as forças que a Igreja pode pôr em campo. Um sacerdote ou um monge que foge não só de um mau exemplo, mas nega aos fiéis em sua Pátria aquele conforto moral e espiritual que hoje é mais do que nunca necessário”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Provas de cisma na Igreja caldaica - Instituto Humanitas Unisinos - IHU