30 Novembro 2022
"Que cada um de vocês possa se tornar 'poeta da paz'!".
Reproduzimos a seguir o discurso do Papa Francisco por ocasião da audiência com os estudantes e professores participantes do Encontro para a educação à paz e ao cuidado. O texto é publicado por Santa Sé, 28-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Caros garotos e garotas, caros professores, bom dia e bem-vindos!
Alegra-me que tenham respondido com entusiasmo ao convite da Rede Nacional de Escolas para a Paz. Obrigado por ter vindo! E obrigado a todos aqueles que organizaram este encontro, especialmente ao Dr. Lotti.
Felicito vocês, alunos, e seus educadores, pelo rico programa de atividades e de formação que realizaram, que culminará com a Marcha Perugia-Assis em maio do próximo ano, onde terão a oportunidade de apresentar os resultados do seu trabalho e as suas propostas.
Assis já se tornou um centro mundial de promoção da paz, graças à figura carismática daquele jovem despreocupado e rebelde de Assis chamado Francisco, que deixou sua família e as riquezas para seguir o Senhor e se casar com Nossa Senhora Pobreza. Aquele jovem sonhador é ainda hoje fonte de inspiração no que diz respeito à paz, à fraternidade, ao amor aos pobres, à ecologia, à economia. Ao longo dos séculos, São Francisco fascinou muitas pessoas, assim como fascinou também a mim que, como Papa, quis assumir o seu nome.
O seu programa educativo “Pela paz, com o cuidado” quer responder ao apelo a um Pacto Educativo Global, que há três anos apresentei a todos os que atuam no campo da educação, para que “se tornem promotores dos valores do cuidado, da paz, da justiça, do bem, da beleza, do acolhimento do outro e da fraternidade" (Vídeo-mensagem de 15 de outubro de 2020). E alegro-me por ver que não só as escolas, as universidades e as organizações católicas estão respondendo a esse apelo, mas também as instituições públicas, leigas e de outras religiões.
Para que haja paz, como bem diz o seu lema, é preciso "cuidar". Muitas vezes falamos de paz quando nos sentimos diretamente ameaçados, como no caso de um possível ataque nuclear ou de uma guerra travada às nossas portas. Assim como nos interessamos pelos direitos dos migrantes quando temos algum parente ou amigo que emigrou. Na realidade, a paz sempre nos diz respeito, sempre! Como sempre, nos diz respeito o outro, o irmão e a irmã, e devemos cuidar dele e dela.
Um modelo de cuidado por excelência é aquele samaritano do Evangelho, que socorreu um desconhecido que encontrou ferido no caminho. O samaritano não sabia se aquele infeliz era uma boa pessoa ou um patife, se era rico ou pobre, instruído ou ignorante, judeu, samaritano como ele ou estrangeiro; não sabia se "tinha provocado" aquele infortúnio ou não. O Evangelho diz: "Ele o viu e teve compaixão" (Lc 10,33). Ele o viu e teve compaixão. Outros, antes dele, também viram o homem, mas seguiram por seu caminho. O samaritano não se fez tantas perguntas, seguiu o movimento da compaixão.
Também em nosso tempo podemos encontrar testemunhos válidos de pessoas ou instituições que trabalham pela paz e cuidam dos necessitados. Pensemos, por exemplo, naqueles que receberam o Prêmio Nobel da Paz, mas também nos muitos desconhecidos que de maneira silenciosa trabalham por essa causa.
Hoje gostaria de recordar duas figuras de testemunhas. A primeira é a de São João XXIII. Foi chamado de "Papa Bom", e também de "Papa da Paz", porque naqueles difíceis inícios da década de 1960 marcados por fortes tensões - a construção do Muro de Berlim, a crise de Cuba, a Guerra Fria e a ameaça nuclear - publicou a famosa e profética encíclica Pacem in terris. No ano que vem completará 60 anos, e é muito atual! O Papa João dirigiu-se a todos os homens de boa vontade, pedindo a solução pacífica de todas as guerras através do diálogo e do desarmamento. Foi um apelo que recebeu grande atenção no mundo, muito além da comunidade católica, porque havia captado uma necessidade de toda a humanidade, que ainda é a mesma de hoje. É por isso que os convido a ler e estudar a Pacem in terris, e a seguir esse caminho para defender e difundir a paz.
Poucos meses depois da publicação daquela Encíclica, outro profeta do nosso tempo, Martin Luther King, Prêmio Nobel da Paz em 1964, proferiu o histórico discurso no qual disse: "Eu tenho um sonho". Em um contexto estadunidense fortemente marcado pelas discriminações raciais, ele havia feito todos sonharem com a ideia de um mundo de justiça, liberdade e igualdade. Ele disse: "Eu tenho um sonho: que meus quatro filhos pequenos um dia vivam em uma nação onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas pela dignidade de sua pessoa".
E vocês, garotas e garotos: qual é o seu sonho para o mundo de hoje e de amanhã? Encorajo vocês a sonhar grande, como João XXIII e Martin Luther King. E por isso convido a participar na Jornada Mundial da Juventude no próximo ano, que celebraremos em Lisboa. Quem puder vir encontrará muitos outros jovens de todo o mundo, todos unidos pelo sonho da fraternidade baseada na fé no Deus que é Paz, o Pai de Jesus Cristo e nosso Pai. E se vocês não puderem vir fisicamente, ainda assim convido a acompanhar e participar, porque agora, com os meios atuais, isso é possível.
Desejo a todos um bom caminho no tempo do Advento que ontem iniciamos: um caminho feito de tantos pequenos gestos de paz, todos os dias: gestos de acolhida, encontro, compreensão, proximidade, perdão, serviço... Gestos feitos com o coração, como passos rumo a Belém, rumo a Jesus que é o Rei da paz, aliás, que Ele mesmo é a paz.
O poeta Borges termina, ou melhor, não termina uma de suas poesias com estas palavras: "Quero dar graças... por Whitman e Francisco de Assis que já escreveram o poema, pelo fato de o poema é inesgotável e se confunde com a soma das criaturas e não chegará jamais ao último verso e varia conforme os homens”. Que também vocês, garotos e garotas, possam acolher o convite do poeta para continuar a sua poesia, acrescentando cada um o que quer agradecer, o que quiser. Que cada um de vocês possa se tornar "poeta da paz"! Tornem-se poetas da paz: entenderam? Poetas da paz.
Obrigado por ter vindo! Abençoo a todos de coração. E, por favor, orem por mim. Obrigado.
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Paz e cuidado: João XXIII e Martin Luther King, segundo o Papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU