Em declaração conjunta, Angela Mendes deu voz às denúncias de trinta e sete organizações durante a 48ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.
A reportagem é publicada pela Assessoria de Comunicação do Cimi, 05-10-2021.
Na manhã da última segunda-feira, 4 de outubro, em declaração conjunta de organizações indígenas, indigenistas, ambientalistas e de direitos humanos, Angela Mendes, filha do líder extrativista Chico Mendes, defendeu o reconhecimento do direito ao meio ambiente saudável e a criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas e direitos humanos.
A manifestação foi realizada em Debate Geral, durante a 48ª sessão do Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas (ONU). Entre as organizações signatárias da Declaração Conjunta, estão: a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib); a Collectif Alerte France Brésil / MD18; o Comitê Chico Mendes; o Conselho Indígena de Roraima (CIR); o Conselho Indigenista Missionário (CIMI); a Human Rights Watch; o Instituto Socioambiental (ISA); a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); a Plataforma Dhesca Brasil; a Terra de Direitos; e a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT).
Angela Mendes defendeu o reconhecimento do direito ao meio ambiente saudável e a criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas e direitos humanos
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O Debate Geral sobre o item 8 da agenda do CDH da ONU visa o acompanhamento e implementação da Declaração e Programa de Ação de Viena, de 1993. As organizações que aderiram à declaração defenderam o reconhecimento do meio ambiente como um direito humano e a criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas e direitos humanos.
Angela Mendes, representando também o Comitê Chico Mendes, afirma:
“A criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas aproximará conceitos ainda distantes, como direitos, clima, conservação, gênero e participação igualitária, servindo de uma plataforma de empoderamento global dos setores mais afetados pela crise climática”, afirma.
Há experiências interamericanas que reconhecem o direito a um meio ambiente saudável, também reconhecido por 156 países, incluindo a Constituição do Brasil em termos individuais, coletivos e difusos.
"A criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas aproximará conceitos ainda distantes, como direitos, clima, conservação, gênero e participação igualitária" - Angela Mendes
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A Opinião Consultiva nº 23 de 2017 (OC-23/17), destacado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), menciona o desenvolvimento do conceito e análise mais detida do direito ao meio ambiente saudável/equilibrado à luz da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), especificamente no art.26, combinado com o que prevê o art.11 do Protocolo de São Salvador, no tema de direitos econômicos, sociais e culturais.
Outra preocupação abordada foi sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), adotados durante a Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, em setembro de 2015. A agenda é composta por 17 objetivos e 169 metas a serem atingidos até 2030.
No Brasil, o papel ativo de povos indígenas, tradicionais, quilombolas e ribeirinhos na conservação da temperatura global, o que os classifica como agentes de mudança, são indispensáveis. “Sem os quais nenhum país alcançará os objetivos do desenvolvimento sustentável nem evitará o aquecimento global”, alertou Mendes.
Na oportunidade, também foi feito um chamado aos membros do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas para que aprovem os respectivos projetos de resolução que serão apresentados ao fim desta 48ª sessão.
No Brasil, o papel ativo de povos indígenas, tradicionais, quilombolas e ribeirinhos na conservação da temperatura global, o que os classifica como agentes de mudança, são indispensáveis
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Terra Indígena Karipuna. (Foto: Tiago Miotto/Cimi)
O representante do Governo brasileiro, durante o diálogo interativo com o Grupo de Trabalho sobre Afrodescendentes do Conselho, contestou o uso do termo “racismo ambiental”, pelas Organizações das Nações Unidas. O tema racismo ambiental era o foco do estudo desse GT na presente sessão. Em resposta ao GT, a delegação brasileira comentou:
“Notamos que o chamado racismo ambiental não é uma terminologia internacionalmente reconhecida”, desconversou o representante do Itamaraty. “Para o Brasil, a discussão sobre a relação entre problemas ambientais e questões sociais, como racismo, deve levar em consideração um enfoque equilibrado e integrado à dimensão social, econômica e ambiental”, completou.
Por sua vez, a ONU indicou que a “raça foi utilizada para normalizar a exploração e o descaso, abrindo oportunidades para gerar lucro às custas da vida, dos recursos e das terras das pessoas”, por meio do relatório que serviu de base para o Debate Geral na 48ª sessão do CDH da entidade. É importante lembrar que o relatório da ONU usa como exemplo de situação de racismo ambiental o caso das comunidades quilombolas no Brasil.
A ONU indicou que a “raça foi utilizada para normalizar a exploração e o descaso, abrindo oportunidades para gerar lucro às custas da vida, dos recursos e das terras das pessoas
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1º Encontro da Juventude Xakriabá, agosto de 2017. (Foto: Guilherme Cavalli/Cimi)
Assim como a ONU, o Cimi entende que o racismo é estrutural e, portanto, multifacetado em diversos âmbitos sociais. O racismo ambiental é um exemplo de como este tema não pode ser discutido de forma isolada, por se manifestar tanto nacional quanto internacionalmente. No Brasil, incide de forma direta sobre os territórios e na vida dos povos indígenas, comunidades tradicionais, quilombolas e ribeirinhas.
O próprio marco temporal pode ser considerado no contexto de racismo ambiental, pois impede que os povos indígenas exerçam seus direitos fundamentais de sua maneira tradicional, em relação com a natureza e os recursos naturais adjacentes, os retirando o caráter fundamental de ancestralidade e limitando seus direitos a 1988.
O marco temporal pode ser considerado no contexto de racismo ambiental, pois impede que os povos indígenas exerçam seus direitos fundamentais de sua maneira tradicional
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Os povos indígenas reafirmam sua posição contra o marco temporal. (Foto: Tiago Miotto/Cimi)
A afirmação do governo brasileiro ocorre às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021, a COP-26, prevista para os dias 31 de outubro e 12 de novembro na cidade de Glasgow, na Escócia. Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), as lideranças irão levar temas como o marco temporal, demarcações dos territórios, o aumento do desmatamento no Brasil e a falta de políticas públicas de proteção aos territórios.
Confira a íntegra da Declaração Conjunta:
Declaração Conjunta, Debate Geral na 48ª sessão do CDH da ONU
Angela Mendes
Do Comitê Chico Mendes, em declaração conjunta de 36 organizações
04 de outubro de 2021
Senhora Presidenta,
Apoiamos duas importantes iniciativas levadas a cabo durante a presente sessão: o reconhecimento do direito ao meio ambiente saudável e a criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas e direitos humanos.
A partir da experiência interamericana, exemplificamos a Opinião Consultiva 23/17 e o artigo 11 do Protocolo de São Salvador que reconhecem o direito a um meio ambiente saudável, que também é reconhecido por 156 países, incluindo a Constituição do Brasil, em termos individuais, coletivos e difusos.
A criação de um mandato especial sobre mudanças climáticas aproximará conceitos ainda distantes, como direitos, clima, conservação, gênero e participação igualitária, servindo de uma plataforma de empoderamento global dos setores mais afetados pela crise climática.
Não poderíamos esquecer, no espírito dos ODS, o papel ativo de povos indígenas, tradicionais, quilombolas e ribeirinhos na conservação da temperatura global, o que os classifica como agentes de mudança, sem os quais nenhum país alcançará os objetivos do desenvolvimento sustentável nem evitará o aquecimento global.
Fazemos um chamado aos membros do Conselho a aprovarem os respectivos projetos de resolução que serão apresentados ao fim desta sessão.
Muito obrigada.
Organizações signatárias:
ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos
Amazon Rebellion / UK
Amnesty International
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
Articulações dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo
Associação Juízes para a Democracia – AJD
Centro pela Justiça e o Direito Internacional – CEJIL
Coletivo Brasil-Montréal
Coletivo Grito
Coletivo Por Um Brasil Democrático – Los Angeles
Coletivo Taoca
Collectif Alerte France Brésil / MD18
Comissão Regional de Justiça e Paz de Mato Grosso do Sul – CRJPMS
Comitê Belgo Brasileiro (CBB) Asbl
Comitê Chico Mendes
Comitê Italiano Lula Livre
Comitê Latino Americano e do Caribe pelos Direitos da Mulher – Cladem Brasil
Conselho do Povo Terena
Conselho Indígena de Roraima – CIR
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Conselho pela Democracia no Brasília, Zurique
Criola
Defend Democracy in Brazil Committee NY
Human Rights Watch
Instituto De Pesquisa e Formação Indígena – Iepé
Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – Ibase
Instituto Brasileiro de Direitos Humanos – IBDH
Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos – IDDH
Instituto Socioambiental – ISA
Maré Socioambiental
Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH Brasil
Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Bahia
Ordem dos Advogados do Brasil – Conselho Federal
Paz, Educação Ambiental e Consciência Ecológica – PEACE
Plataforma Dhesca Brasil
Terra de Direitos