06 Setembro 2021
Comunidade LGBT, estrelas de cinema ou TV e seus fãs, usuários da Net. Na China permeada pelo conceito de "segurança nacional" de Xi Jinping, há cada vez menos espaço para tudo que possa de alguma forma levar a qualquer forma de ativismo. Pouco importa se no mundo físico ou no digital.
A reportagem é de Lorenzo Lamperti, publicada por La Stampa, 30-08-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Pouco importa se se trata de grupos passíveis de representar instâncias políticas e sociais, de direitos de algumas categorias de cidadãos ou simplesmente de comportamentos considerados imorais. No endurecimento também estão envolvidas importantes instituições públicas. Como parte de um "censo" interno, a Universidade de Xangai solicitou que seus campi fichassem estudantes não heterossexuais ou que se identifiquem com a comunidade LGBT. A diretiva, não confirmada pela universidade, mas divulgada nas redes sociais chinesas, também exige a coleta de informações sobre posições políticas, contatos sociais e "saúde mental" dos inscritos. Tudo isso a poucas semanas do cancelamento de dezenas de contas de grupos universitários pró Lgbt do WeChat.
Nos últimos anos, a comunidade homossexual sofreu uma crescente marginalização e agora é vista também como um obstáculo às políticas de sustentação demográfica. Mais que uma perseguição homofóbica, o caso parece se enquadrar em uma necessidade mais ampla do sistema chinês de identificar e monitorar possíveis ativistas e formas de agregação potencialmente operantes fora da linha do Partido. As minorias, inclusive aquelas étnicas, são percebidas como um possível risco: devem ser privadas de seu componente associativo e dotadas heterodiretamente das corretas "características chinesas".
Entre os grupos visados, entraram também os milhões de fãs e seguidores de estrelas do cinema e da televisão. A Comissão Central de Inspeção Disciplinar anunciou que quer colocar ordem na "caótica" indústria do entretenimento, visando hábitos "não sãos" que "instilam valores incorretos" nos jovens. Um esforço que faz parte de um vasto programa de salvaguarda da segurança política e ideológica do mundo digital.
Algumas semanas atrás, os fãs de Kris Wu haviam anunciado um plano para tirá-lo da prisão depois que o cantor sinocanadense foi preso sob a acusação de estupro. Sinal de alarme para as autoridades, que iniciaram uma repressão aos fãs-clubes online, percebidos como possíveis riscos à segurança. Já foram canceladas 150.000 postagens, 4.000 contas e 1.300 grupos, enquanto 39 aplicativos foram removidos. Ação recebida pela plataforma de streaming de vídeo iQiyi, que cancelou todas as "competições de ídolos", programas em que as estrelas competem para ganhar os votos dos usuários. Um fim também para a terceira temporada do popular show de talentos Youth with You.
Tudo o que envolve a participação ativa dos espectadores e todos aqueles em condições de atrair a simpatia de massas de fãs estão envolvidos em uma "campanha de retificação" em que a fama deve ser acompanhada pelo patriotismo. Na era da "prosperidade comum", não há tolerância para salários excessivos e, claro, para a sonegação fiscal. A popular atriz Zheng Shuang foi condenada a uma multa de US $ 46 milhões por não pagar impostos sobre seus ganhos. Nos últimos meses, ela já havia entrado no radar do governo depois de ter dois filhos nos Estados Unidos por meio de barriga de aluguel, prática proibida na China.
O nome de outra estrela do cinema, Zhao Wei, foi banido de todas as plataformas onde aparecem filmes e dramas de televisão em que ele atuou. Nenhuma explicação foi fornecida, mas pode haver uma conexão com seu relacionamento privilegiado com Jack Ma, o fundador do Alibaba que caiu em desgraça nos últimos meses. Zhao, entre outras coisas, ex-embaixadora da Fendi na China e seu marido compraram ações da Alibaba Pictures anos atrás. Neste momento, estar perto de Ma certamente não é uma vantagem como Zhou Jiangyong descobriu às suas próprias custas. O chefe do partido de Hangzhou, cidade natal de Alibaba, acabou sob investigação por corrupção ao mesmo tempo em que as autoridades centrais pediram a funcionários de todos os níveis que interrompessem qualquer relacionamento com as empresas privadas que pudesse representar um conflito de interesses. O Ant Group desmentiu qualquer envolvimento, mas rumores estão circulando na mídia de que a Ant Financial possua pouco menos de 15% de uma empresa liderada pelo irmão mais novo de Zhou.
As celebridades são chamadas a ser bons exemplos. O famoso ator Zheng Zhehan tornou-se vítima de um boicote depois que circulou nas sociais uma foto sua de 2018, na qual ele estava em frente ao Santuário Yasukuni em Tóquio,. O edifício xintoísta é dedicado aos que morreram servindo ao Império Japonês, incluindo as 1.068 pessoas condenadas por crimes de guerra. Várias marcas rescindiram os contratos de colaboração com Zheng. Não demonstrar amor pelo país não é uma possibilidade.
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China, a universidade declara guerra aos homossexuais. "Registrem todos os estudantes homossexuais" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU