Menos armas, mais luta contra a fome: de quanto dinheiro o papa está falando?

Foto: Oxfam International

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21 Dezembro 2020

Na mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2021, o Papa Francisco renova o seu apelo. De acordo com os dados do Stockholm International Peace Research Institute (Sipri), bastaria que o mundo voltasse aos níveis de gastos com armas de 2010 para disponibilizar 138 bilhões de dólares para o combate à fome, quase duplicando os recursos que os países da OCDE investem hoje na cooperação para o desenvolvimento.

A reportagem é de Giorgio Bernardelli, publicada por Mondo e Missione, 18-12-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

“Como seria corajosa a decisão de criar um ‘Fundo mundial’ com o dinheiro que se gasta em armas e outras despesas militares, para poder eliminar a fome e contribuir para o desenvolvimento dos países mais pobres!”

Na mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2021 – divulgada no dia 17 – o Papa Francisco volta a lançar um apelo contido na sua encíclica Fratelli tutti. A ideia é criar um fundo alimentado pelos países individualmente, destinando à luta contra a fome pelo menos uma parte do dinheiro que seria utilizado na compra de novas armas.

É uma ideia que tem uma longa história: foi Paulo VI quem a lançou pela primeira vez ainda nos anos 1960, nos tempos da primeira corrida à fabricação de armas atômicas cada vez mais poderosas e caras. Mas ela assume uma atualidade muito particular hoje, quando – como sabemos –, como resultado da pandemia, o número daqueles que não têm o necessário para viver está aumentando vertiginosamente.

Então, surge a pergunta: trata-se de uma bela utopia ou realmente liberar recursos da corrida armamentista poderia ter um impacto decisivo no combate à fome?

Para responder, é preciso se perguntar quanto dinheiro seria necessário hoje para vencer a fome no mundo. As estimativas evidentemente variam muito, dependendo do tipo de intervenções hipotetizadas, mas, assumindo a proposta mais ambiciosa – formulada pela FAO, Ifad e Programa Mundial de Alimentos, os três órgãos da ONU que lidam com a alimentação –, incluindo ajudas a áreas pobres, desenvolvimento agrícola, gastos para o desenvolvimento de modernos sistemas de irrigação e infraestruturas, seriam necessários 265 bilhões de dólares por ano.

E quanto dinheiro é gasto em armamentos? A estimativa do Sipri, o instituto de Estocolmo considerado o mais confiável no monitoramento nesse assunto, fala em 1,917 trilhão de dólares, ou seja, mais de sete vezes. E há também outro dado ainda mais significativo: entre 2010 e 2019, os gastos com armamentos cresceram 7,2% (cerca de 138 bilhões de dólares).

Com os números em mãos, isso significa que, se o mundo tivesse optado por não aumentar ainda mais a quantidade de dinheiro destinada à compra de material bélico, a metade da quantia aparentemente astronômica indicada pela FAO, Ifad e o Programa Mundial de Alimentos como necessária para derrotar a fome estaria disponível.

E só para fazer outra comparação: de acordo com os dados da OCDE, a quantia total disponibilizada pelos países membros para a cooperação para o desenvolvimento em 2019 foi de 152,8 bilhões de dólares.

São apenas aproximações de números em uma realidade que – como bem sabemos – é complexa. E, certamente, devemos pensar também na forma como esses grandes órgãos internacionais gastam os recursos já destinados hoje ao combate à insegurança alimentar.

Mas o fato de que, precisamente enquanto aumentam os gastos com armas, também aumentam os famintos deveria nos sugerir alguma coisa. Admitindo-se que realmente queremos um mundo com “fome zero”...

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