17 Junho 2020
"No exemplo das foibas, na história, ainda existem falsificações. Mas estudar história serve para não fornecer um falso testemunho. É por isso que a escola deve ser mantida livre e independente", escreve Chiara Frugoni, historiadora italiana, em artigo publicado por Il Fatto Quotidiano, 12-06-2020. A tradução é de Luísa Rabolini.
Por que estudar história? Em 1967, o Dr. Stephenson trancou cinco macacos em uma gaiola do teto da qual pendia uma banana; debaixo da banana, uma escada. O macaco que tentou subir a escada para pegar a fruta foi "punido" com um jato de água gelada; e juntos foram atingidos os outros macacos que haviam ficado no chão. E toda vez que alguém se aproximava da escada, os jatos de água atingiam todos os macacos.
Quando Stephenson percebeu que todo mundo havia aprendido a "lição", ele substituiu um macaco por outro, inconsciente da dinâmica da gaiola. O primata naturalmente tentou várias vezes alcançar a banana, mas os outros sempre a pararam, antes que o jato punitivo de água o atingisse. O macaco assim desistiu de seu propósito. Gradualmente, todos os macacos foram substituídos, até que houvesse apenas animais na gaiola que nunca haviam recebido o jato de água, cientes da proibição, mas sem saber o motivo. É por isso que se estuda história, pode-se concluir: para não acabar como os macacos desse experimento. Certo?
Mas, se checarmos as fontes desse experimento, veremos que não foi como é contado: não havia nenhuma escada e nenhuma banana, os jatos eram de ar e não de água, os macacos eram treinados para não manipular um objeto (não uma banana) individualmente e, em seguida, um animal inconsciente dos jatos de ar era introduzido, procedendo em pares do mesmo sexo. Vamos deixar de lado a validade ou não do experimento: de qualquer forma, sua fama nos ensina a importância de conferir as fontes históricas e não dar aval de verdade ao que circula por aí por ser funcional ao nosso pensamento. É verdade, a história deve ser estudada, mas também se deve tomar cuidado com sua falsificação.
Um exemplo impressionante, que para muitos não é óbvio, diz respeito ao caso das foibas (cavernas verticais), porque se trata de evitar falsos historiadores (interessados, mas muito resistentes). Segundo a Enciclopédia Treccani "as foibas foram amplamente utilizadas durante a Segunda Guerra Mundial e no pós-guerra para livrar-se dos corpos daqueles que haviam morrido devido aos confrontos entre nazifascistas e resistência e, sobretudo, para ocultar as vítimas das ondas de violência em massa desencadeadas em duas ocasiões [...] pelo movimento de libertação esloveno e pelas estruturas do novo estado iugoslavo criado por Tito". A direita, na Itália, jogou-se de cabeça sobre o tema, com uma dupla equação baseada em uma matemática de valores tão criativa quanto enganosa e interessada:
1) a resistência iugoslava que matou os italianos (fascistas e civis) era composta primeiramente por pessoal da resistência = a resistência italiana também cometeu massacres de civis italianos e
2) os fascistas cometeram crimes, mas também a resistência o fez = crimes fascistas e crimes da resistência são equiparáveis. A imagem mais famosa que acompanha as matérias nos jornais no aniversário das vítimas das foibas mostra cinco pessoas prestes a ser fuziladas pelas costas enquanto aguardam os disparos mortais.
Uma foto de grande impacto, mas que retrata o assassinato de cinco reféns eslovenos por tropas italianas durante a ocupação italiana da Eslovênia (1941-1943). Estudar a história também serve a esse propósito: não dar falso testemunho.
Estou falando de coisas dadas como certas sem questionamentos como, por exemplo, quando relembro que o fim do trabalho na fábrica, de um trabalho no qual estamos unidos, mas podemos nos confrontar, a aprovada flexibilidade e a precariedade do trabalho, a queda das grandes ideologias levaram a uma perda também dos ideais que as geraram, a um grande individualismo, no qual - penso nos jovens – luta-se para poder trabalhar, sempre em busca de um contrato com prazo de término. Essa vida tão instável tem como resultado a impossibilidade de fazer planos, na própria vida privada e na vida coletiva.
Até o voluntariado ou o engajamento mais sério de uma parte católica se reduz a mitigar, reparar, mas não construir, projetando-se para um futuro melhor. Tudo isso produz outra consequência que, paradoxalmente, inverte o ditado dos meus tempos: "Sem memória, não há futuro". Acredito que se deve dizer que "sem futuro, não há memória", porque a necessidade de sobreviver, a impossibilidade de planejar, o ter que viver cada um por si, atrofiaram o sentido de uma continuidade com as pessoas que nos precederam e necessariamente tiraram ao passado seu impulso ideal e modelador, a sensação de que ser homens e mulheres significa ser herdeiros, herdeiros conscientes do passado. A tal difícil situação deram uma ajuda poderosa - em sentido negativo - as reformas escolares que foram se seguindo de Berlinguer até hoje.
Antiguidades gregas e romanas são cada vez mais colocadas em segundo plano, cada vez mais ouvimos quão pouco e quase inútil é o conhecimento de grego e latim, sem mencionar a Idade Média, aliás, a "idade das trevas" da Idade Média (embora as verdadeiras trevas são de quem assim as chama, evidentemente sem conhecê-las), com uma escola reduzida a um papel auxiliar da empresa (basta dizer "a escola trabalho"!), ] pronta a formar mão-de-obra a baixo custo. A escola não é mais o papel da cultura, mas da empresa: um termo que mostra o abismo de incultura ou o cinismo de quem a formulou.
Os frutos envenenados já podem ser vistos: os garotos do rico nordeste italiano que deixaram a escola para obter um ganho imediato estão em dificuldades com o trabalho, porque estão competindo com a mão-de-obra mais barata dos imigrantes, não sabendo projetar, mas apenas "reproduzir a peça". As pessoas qualificadas, por outro lado, têm dificuldade em encontrar um trabalho em uma Itália cada vez mais incapaz de planejar o próprio futuro; em muitos casos, resolvem ir para outro país (mais que do "problema" da imigração, deveríamos falar efetivamente daquele da "emigração") dos nossos jovens, depois de ter terminado os estudos).
As várias reformas escolares também tendem a privar os alunos do estudo do passado para torná-los incapazes de refletir e entender. Enfraquecer o estudo da história e sua importância significa pensar que a civilização possa ser transmitida sem uma relação de filiação, que tempo e espaço possam ser fragmentados em ilhas artificiais, desprovidas de ligação e de uma visão de conjunto? Mas Veneza não teria sido Veneza se não fosse um arquipélago. Na Itália, as cidades mostram cada uma a sua própria história claramente visível em palácios, praças, monumentos, igrejas (e depois em museus), repletos de referências do passado e obras de arte. Tornar sua compreensão problemática, acrítica, significa condenar nossos jovens à apatia, à falta de curiosidade intelectual, modificar, em sentido negativo, a maneira de perceber a realidade. Sem um vínculo consciente e ativo com o próprio passado, a história se torna uma voz muda, a profundidade da vida humana se reduz, como se a humanidade nunca tivesse aprendido a escrever, mas apenas se limitasse a repetir, geração após geração, admiráveis atos sem memória, sem consciência de si em relação aos outros, de si mesmos em relação aos companheiros que precederam e seguirão.
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Sem futuro, não há memória. Artigo de Chiara Frugoni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU