11 Mai 2020
O trabalho escravo não é coisa do passado, ainda está presente em muitos lugares do mundo, também no Brasil. Segundo a Comissão Pastoral da Terra – CPT, organismo ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, “é considerada escravizada uma pessoa submetida a condições degradantes de trabalho, jornada exaustiva ou a alguma forma de privação de liberdade de ir e vir, inclusive, por meio de dívida ou de trabalho forçado”.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
Podemos dizer que essa é uma realidade muitas vezes invisibilizada, inclusive com a colaboração do poder executivo, legislativo e judiciário. No Brasil, desde 2019, o combate ao trabalho escravo tem visto reduzido drasticamente seu orçamento, o que dificulta ainda mais essa labor. Ninguém pode esquecer que, segundo dados da CPT, nos últimos 24 anos, 54.778 pessoas em situação análoga à escravidão foram libertadas no Brasil.
Denunciar essa realidade sempre foi urgente, ainda mais após a ultima reforma trabalhista que recortou drasticamente os direitos dos trabalhadores, o que fez mais fácil que aconteçam situações que podem ser consideradas constitutivas de trabalho escravo. Isso tem sido reforçado pelo presidente da República, que não tem problema em dizer que o povo tem que escolher entre ter trabalho ou direitos.
Entre os dias 11 e 15 de maio, a Comissão Pastoral da Terra realizará a Semana de Comunicação em Combate ao Trabalho Escravo. Esta ação tem acontecido ao longo de vários anos na Bahia, lembrando a abolição da escravatura no Brasil, no dia 13 de maio de 1888, mas este ano será realizado em nível nacional e visa a alertar a população dos riscos e da existência do trabalho escravo contemporâneo. Durante esses cinco dias, como a própria CPT informa, vai intensificar a divulgação de materiais informativos e educativos sobre a temática, produzidos pela Campanha “De olho aberto para não virar escravo!”.
Uma live será realizada no dia 13 de maio, às 19 horas de Brasília, transmitida na página do Facebook da CPT nacional, com o tema “O trabalho escravo ainda tem cor?”. No Brasil, os portugueses trouxeram escravos africanos para trabalhar ao seu serviço, criando uma cultura onde o racismo foi tomando conta da vida social e laboral. Ainda hoje se faz presente esse racismo, o que repercute também no mundo do trabalho. Segundo diferentes estudos, os negros são as vítimas principais do trabalho escravo no Brasil. Daí o tema da live, onde tem sido convidado o jornalista Leonardo Sakamoto, um dos grandes defensores dos Direitos Humanos no Brasil, ameaçado por grupos de poder econômico e político próximos ao atual presidente do país.
Só em 2019, segundo a CPT, 130 casos de trabalho escravo foram identificados em todo o país, envolvendo 1.208 pessoas e resultando no resgate de 1.050 trabalhadores/as. Essa é uma realidade presente em todas as regiões do Brasil e em diferentes setores econômicos, como pecuária, lavouras, produção de carvão vegetal, mineração, confecção, construção civil, serviços diversos. Os dados oficiais, sistematizados pela Campanha “De olho aberto para não virar escravo!”, são recolhidos pela Secretaria de Inspeção do Trabalho, hoje lotada no Ministério da Economia, um elemento importante a ter em conta, pois o fato de fazer parte desse ministério, mostra que o combate ao trabalho escravo tem deixado de ser algo prioritário.
Num país onde os direitos trabalhistas foram drasticamente recortados, desde a CPT se reconhece que o fato de que cada vez seja mais difícil conseguir trabalho, unido a uma alta vulnerabilidade socioeconômica e uma alta informalidade trabalhista e desemprego, uma realidade que tem se tornado muito pior com a chegada do coronavírus, faz com que “mesmo submetido a humilhações, violação de direitos, sendo tratado até pior que animal, o trabalhador resiste à ideia de denunciar”. Situações que em outros tempos eram denunciadas, hoje tem provocado a existência de “focos de trabalho escravo escondidos atrás da normalidade”. Aquele que está desempregado, diante da extrema necessidade, “na maioria das vezes, não pensa duas vezes antes de aceitar um emprego”, o que gera situações de escravidão, com gente que se aproveita da miséria alheia, insistem desde a CPT.
Mais uma vez, como vem acontecendo ao longo das últimas semanas em todos os segmentos da sociedade, as atividades da Semana de Comunicação em Combate ao Trabalho Escravo, serão realizadas por meio das plataformas digitais e veículos de comunicação. A través desses instrumentos, a CPT pretende aprofundar nessa realidade do trabalho escravo no Brasil, cada vez mais escondida, e em consequência mais difícil de combater, uma realidade que tem se visto agravada com o COVID-19, que dificulta ainda mais qualquer tipo de fiscalização. O mais importante, a atitude fundamental, é não ter medo de denunciar uma situação que é crime, sabendo que a CPT sempre vai apoiar aquele que sofre as consequências de uma sociedade que explora os pequenos.
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Semana de Combate ao Trabalho Escravo: uma urgência ainda maior diante do COVID-19 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU