03 Novembro 2019
"A tragédia ocorrida na Terra Indígena Arariboia se insere no contexto onde o Estado brasileiro vê o chefe do Poder Executivo atentar contra a Constituição, a democracia e os direitos humanos, incentivando uma corrida assassina rumo às Terras Indígenas", afirma o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em nota sobre o assassinato do indígena Paulo Paulino Guajajara.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), com indignação e tristeza, acusa e responsabiliza o Estado e o governo brasileiro pelo covarde assassinato de Paulo Paulino Guajajara, ocorrido na noite desta sexta-feira (1) no interior da Terra Indígena Arariboia, no Maranhão. O indígena tinha 26 anos e deixa esposa e um filho.
Paulino Guajajara e Laércio Souza Silva partiram da aldeia Lagoa Comprida, norte da Terra Indígena, a 100 km do município de Amarante, para caçar. Já na mata, foram surpreendidos por cinco madeireiros armados.
Os homens, com as armas em punho, exigiram que Paulino e Laércio entregassem arcos e flechas, instrumentos tradicionais usados para caçar. Como Guardiões da Floresta, portanto conhecidos destes habituais invasores da Terra Indígena, os Guajajara não tiveram muita chance de defesa.
Sem esperar qualquer reação, os madeireiros, em maior número, começaram a atirar contra os indígenas. Um dos disparos atingiu Paulino no rosto. Laércio foi alvejado no braço e nas costas.
Conforme Laércio, que relatou todo o trágico episódio, eles não tiveram tempo de fugir ou se proteger. Só depois que viu Paulino caído, já sem vida, Laércio percebeu que não teria chance e escapou pela mata, debaixo de tiros, regressando à aldeia, onde pediu ajuda.
Um batalhão da Polícia Civil de Amarante se dirigiu ao local, com o apoio de um helicóptero, e retirou o corpo do Paulino da mata levando-o para a comunidade realizar o velório. Em análise preliminar, os policiais acreditam que se tratou de uma emboscada. Também afirmaram que não há nenhuma notícia de morte entre os madeireiros, conforme se ventila pela região.
A região da aldeia Lagoa Comprida é regularmente, e há muitos anos, invadida por madeireiros. Em 2007, o indígena Tomé Guajajara foi assassinado no local. No ano seguinte, em 2008, os madeireiros invadiram a aldeia Cabeceira, atirando contra os indígenas. Em 2015, foi a vez de um agente do Ibama ser atacado a tiros e escapar por pouco.
Na Terra Indígena Arariboia, homologada e registrada em 1990 com 413 mil hectares, vivem cerca de 6 mil indígenas Guajajara, ou Tenetehar, e Awá-Guajá livres, ou seja, em situação de isolamento voluntário.
O Cimi vem denunciando o aumento das invasões dos territórios indígenas, fruto do incentivo dos agentes públicos e privados que se somam contra a regularização dos territórios concebidos pela Constituição Federal. Hoje não é exagero dizer que os indígenas não podem mais circular em seus territórios com segurança.
De tal forma que não nos cabe apenas exigir a apuração do fato em si, mas de denunciar quem tem incentivado e permitido invasões a Terras Indígenas associadas a atentados, assassinatos, ameaças, esbulhos, incêndios criminosos. E quem tem incentivado é o próprio presidente, como ele mesmo admitiu no caso das queimadas.
As recorrentes falas do presidente da República contra a demarcação e regularização dos territórios, seguidas de um ambiente regional preconceituoso contra os indígenas, têm sido o principal vetor para invasões e violência contra os povos indígenas no Brasil.
Portanto, a tragédia ocorrida na Terra Indígena Arariboia se insere neste contexto, onde o Estado brasileiro vê o chefe do Poder Executivo atentar contra a Constituição, a democracia e os direitos humanos, incentivando uma corrida assassina rumo às Terras Indígenas, sem reagir, acovardado.
O sangue de Paulino e de tantos outros indígenas foi e será derramado porque aqueles que podem impedir a barbárie se calam, nada fazem. O Ibama e a Funai, órgãos que poderiam atuar de maneira direta na proteção à Terra Indígena, foram desmantelados e desonerados, tomados por ruralistas capatazes do agronegócio e do latifúndio.
Reiteramos a necessária apuração dos fatos e a exemplar punição aos culpados como o mínimo que se pode fazer perante tal situação. Assim defendemos mesmo que as invasões ocorridas nos territórios em 2019, com suas consequências nefastas, não estejam sendo apuradas; pelo contrário, estão sendo motivadas e mais tragédias poderão ocorrer.
O Conselho Indigenista Missionário se solidariza com os familiares do indígena assassinado e de Laércio, que sofreu uma tentativa de homicídio, e vem responsabilizar o atual governo por não cumprir a Constituição Federal na defesa dos territórios indígenas.
Brasília, 2 de novembro de 2019
Secretariado Nacional – Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
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Responsabilizamos o Estado e o governo federal pelo assassinato de Paulo Paulino Guajajara. Nota do Cimi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU