29 Janeiro 2019
Antes das perguntas dos jornalistas para a tradicional coletiva de imprensa no voo papal, o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Alessandro Gisotti (que estreia nesse papel em um voo do papa), mostra uma folha com um texto escrito à mão: “Não será um documento que entrará no magistério do papa, mas é um documento de que o senhor, Santidade, gosta muito. Esta é uma canção escrita por uma jovem de Honduras, Marta Ávila”. É “contra o bullying”. Foi “um pouco o sinal de um encontro do papa com a Scholas Occurrentes. Isso para dizer como também esteve presente” na Jornada Mundial da Juventude “o elemento da dor desses jovens, assim como o da alegria que vimos em tantas ocasiões”.
A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada em Vatican Insider, 28-01-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Gisotti relata “uma imagem que me tocou muito, Santo Padre: quando o senhor passava de papamóvel e cumprimentava, eu via muitos jovens que, depois de cumprimentá-lo, talvez por um único instante, se abraçavam. Essa talvez seja uma lição para nós, adultos. Os jovens, quando estão felizes, compartilham a alegria, não a guardam para si mesmos”. Gisotti revela, depois, que Francisco, pouco antes de se despedir do Panamá, teve um encontro na nunciatura com expoentes do Unicef.
O pontífice começa saudando os jornalistas: “Boa noite e depois um bom repouso, porque é certo que todos estão cansados, depois dessa viagem tão forte. Obrigado pelo trabalho de vocês. Eu vivi coisas que não imaginava, surpresas, como essa moça de 16 anos de Honduras: vítima de bullying, ela cantou, com uma voz belíssima, uma canção que ela escreveu”.
O senhor falou aos voluntários da Jornada Mundial da Juventude que eles viveram uma missão e sabem como o coração bate quando se vive uma missão. Qual foi a sua missão na Jornada Mundial da Juventude centro-americana?
Minha missão em uma Jornada da Juventude é a missão de Pedro, confirmar na fé, e isso não com mandatos ‘frios’ ou preceptivos, mas deixando-me tocar o coração e respondendo ao que acontecia lá. Eu a vivo assim, custa-me pensar que alguém possa realizar uma missão só com a cabeça. Para cumprir uma missão, é preciso senti-la, e quando sente, você é atingido. É atingido pela vida, pelos problemas.
No aeroporto, eu estava me despedindo do presidente e trouxeram um ‘negrinho’ simpático, intenso, pequeninho. E ele me disse: “Veja, este menino estava atravessando a fronteira da Colômbia, a mãe morreu, e ele ficou sozinho. Ele devia ter uns cinco anos, da África, mas ainda não sabemos de qual país, porque não fala nem inglês, nem português, nem francês. Fala apenas a língua tribal dele. Nós o adotamos, em certo sentido”, ele me disse. E o menino cheio de frescor, de movimentava muito bem. Mas o drama de um menino abandonado pela vida – porque sua mãe morreu lá, e um policial o entregou às autoridades para que se encarregassem dele – isso esbofeteia você, e isso faz com que a missão comece a ter cor, faz com que você possa dizer algo ou acariciar. Não é uma “razão”.
A missão sempre envolve você. Pelo menos a mim, ela me envolve, vem de dentro de mim. Eu sempre digo aos jovens: vocês, o que devem fazer na vida devem fazê-lo caminhando e com as três linguagens: a da cabeça, a do coração e a das mãos. E as três linguagens harmônicas, de tal maneira que vocês pensem o que sentem e o que fazem, sintam o que pensam e o que fazem, façam o que sentem e o que pensam. Eu não sei fazer um balanço da missão. Com tudo isso, eu vou à oração e fico aí diante do Senhor, às vezes adormeço diante do Senhor, mas levando todas essas coisas que vivi na missão e peço a Ele para confirmá-los na fé através de mim. É assim que eu concebo a missão do papa e como eu a vivo. Houve alguns casos, em que foram levantadas algumas problemáticas de tipo dogmático. Não me é natural respondê-las só com a razão. É natural para mim agir de outra maneira.
A Jornada Mundial da Juventude no Panamá correspondeu às suas expectativas?
Sim, evidentemente, o termômetro é o cansaço, e eu estou destruído [re filtrado].
Existe um problema que é comum em toda a América Central, incluindo o Panamá e boa parte da América Latina: gravidez de jovens, gravidez precoces. Só no Panamá foram 10 mil no ano passado, e na América Central não foi diferente. Os detratores da Igreja Católica responsabilizam-na porque ela se opõe à educação sexual nas escolas. E a Igreja tem muitas escolas e universidades na América Latina. Qual é a opinião do Papa Francisco sobre a educação sexual?
Eu creio que nas escolas é preciso dar educação sexual. O sexo é um dom de Deus, não é o “bicho-papão”. É o dom de Deus para amar. Se alguns o usam para ganhar dinheiro ou para explorar o outro, é outro problema. Mas é preciso dar educação sexual: objetiva, como é, sem colonizações ideológicas. Porque se você der nas escolas uma educação sexual cheia de colonizações ideológicas, você destrói a pessoa. O sexo como dom de Deus necessita ser educado, não com rigidez. Educar é “educere", tirar o melhor da pessoa e acompanhá-la no caminho. O problema está nos responsáveis pela educação, seja em nível nacional, provincial ou de cada unidade escolar: que professores escolhem para isso ou que livros didáticos etc... Eu vi de todos os tipos, há coisas que amadurecem e outras que causam danos. Não sei se é objetivo dizer que não há educação sexual no Panamá. Digo isso sem entrar nos problemas políticos do Panamá: é preciso haver educação sexual para as crianças. O ideal é que comecem em casa, com os pais. Nem sempre é possível por causa de tantas situações nas famílias ou porque não sabem como fazê-lo. A escola supre isso, é preciso que o faça, senão fica um vazio que vai ser preenchido por qualquer ideologia.
Nestes dias, o senhor falou com várias pessoas e muitos jovens. Falou também com os jovens que se distanciaram da Igreja. De acordo com o senhor, quais são os motivos?
São tantos, alguns são pessoais. Mas o mais geral, o primeiro é a falta de testemunho dos cristãos, dos padres, dos bispos. Não digo dos papas porque é demais [risos], mas também. A falta de testemunho. Se um pastor é um empreendedor ou organizador de um plano pastoral, se um pastor não é próximo das pessoas, esse pastor não dá testemunho de pastor. O pastor deve estar com as pessoas. Pastor e rebanho, digamo-lo nesses termos. O pastor deve estar na frente do rebanho, para marcar o caminho. No meio do rebanho, para sentir o odor das pessoas e entender o que as pessoas sentem e de que precisam. E deve estar atrás do rebanho, para proteger a retaguarda. Mas se um pastor não vive com paixão, as pessoas se sentem abandonadas ou com um certo senso de desprezo. Sentem-se órfãs. E onde há orfandade...
Eu ressaltei os pastores, mas também os cristãos, os católicos hipócritas, não? Católicos hipócritas que vão todos os domingos à missa e depois não pagam o 13º salário, pagam por fora, exploram as pessoas. Depois, vão ao Caribe de férias com a exploração das pessoas. “Sou católico, vou todos os domingos à missa...” Mas, se você faz aquilo, dá um contratestemunho. A meu ver, isso é o que mais distancia as pessoas da Igreja. Eu diria: não diga que você é católico, se não dá testemunho. Em vez disso, diga: “Sou de educação católica, mas sou morno, sou mundano, peço desculpa, não me olhem como modelo”. Isso é o que se deve dizer. Tenho medo de católicos assim [de nariz empinado], que acreditam ser perfeitos. A história se repete, o mesmo aconteceu com Jesus com os doutores da Lei [que rezavam]: “Te agradeço, Senhor, porque não sou como esses, pobres pecadores”. A falta de testemunho. Existem outros [motivos], dificuldades pessoais, às vezes. Mas o mais geral é esse.
Vimos por quatro dias os jovens rezando com muita intensidade. Entre eles, talvez haja um certo número tenha vocação. Mas talvez alguns estão hesitando, porque pensam que é um caminho difícil, porque não podem se casar. É possível pensar que, na Igreja Católica, seguindo o rito oriental, o senhor permitirá que homens casados se tornem padres?
Na Igreja católica de rito oriental, eles podem fazer isso, e se faz a opção celibatária ou de esposo antes do diaconato. Quanto ao rito latino, lembro-me de uma frase de São Paulo VI: “Prefiro dar a vida antes de mudar a lei do celibato”. Isso me veio em mente e quero dizê-lo, porque é uma frase corajosa. Ele disse em um momento mais difícil do que este, 1968, 1970, tudo isso. Pessoalmente, penso que o celibato é um dom para a Igreja e, segundo, eu não concordo em permitir o celibato opcional. Não. Somente permaneceria alguma possibilidade nos lugares mais distantes, penso nas ilhas do Pacífico, mas é algo para se pensar. Quando há necessidade pastoral, o pastor deve pensar nos fiéis.
Existe um livro do Pe. Lobinger, interessante. É uma coisa em discussão entre os teólogos, não há uma decisão minha. A minha decisão é: celibato opcional antes do diaconato, não. É uma coisa minha, pessoal. Eu não farei isso, isso é claro. Sou fechado? Talvez, mas não me sinto bem de me colocar diante de Deus com essa decisão. O Pe. Lobinger diz: “A Igreja faz a Eucaristia, e a Eucaristia faz a Igreja. Mas onde não há Eucaristia – pense nas comunidades das ilhas do Pacífico – Lobinger pergunta: quem faz a Eucaristia? Os diretores e organizadores dessas comunidades são ou diáconos, ou freiras, ou leigos. E Lobinger diz: se poderia ordenar um idoso casado?
Essa é a sua tese. Mas apenas que exerça apenas o munus sanctificandi, isto é, que celebre a missa, que administre o sacramento da Reconciliação e que dê a unção dos enfermos. A ordenação sacerdotal dá os três munera: o munus regendi (aquele que comanda, o pastor), o docendi (que ensina) e o sanctificandi. Isso vem com a ordem. O bispo só lhe daria a licença para o munus sanctificandi. Essa é a tese. O livro é interessante, e talvez isso possa ajudar a pensar no problema. Acredito que o problema deve ser aberto nesse sentido para os lugares onde existe um problema pastoral por falta de sacerdotes. Não digo que deve ser feito, porque eu não refleti, eu não rezei o suficiente sobre isso. Mas os teólogos devem estudar, por exemplo, o Pe. Lobinger, que é um fidem donum da África do Sul, é idoso já.
Dou esse exemplo para significar os pontos que devem ser levantados. Eu estava falando com um oficial da Secretaria de Estado, um bispo, que teve que trabalhar em um país comunista no início da revolução, e, quando viram como essa revolução evoluía, nos tempos dos anos 1950, os bispos ordenaram às escondidas camponeses, agricultores, bons, religiosos. Depois que a crise passou, 30 anos depois, a coisa se resolveu. Ele me contava a emoção que sentiu quando, em uma concelebração, viu esses camponeses com mãos de camponeses colocando suas alvas para concelebrar com os bispos. Na história da Igreja isso se deu. É algo a ser estudado, a ser pensado e a se rezar.
Por fim, me esqueci de citar o Anglicanorum coetibus, de Bento XVI, para os sacerdotes anglicanos que se tornaram católicos e mantêm as suas vidas como se fossem orientais. Lembro-me de ter visto, em uma Audiência de quarta-feira, muitos deles de clergyman, com muitas mulheres, com as crianças nos braços dos padres. E me explicaram como era a coisa.
Durante a Via-Sacra, um jovem pronunciou palavras muito fortes sobre o aborto: “Há um túmulo que brada ao céu e denuncia a terrível crueldade da humanidade, é o túmulo que se abre no ventre das mães... Deus nos conceda defender com firmeza a vida e fazer de modo que as leis que matam a vida sejam eliminadas para sempre”. Trata-se de uma posição muito radical. Gostaria de saber se essa posição diz respeito também ao sofrimento das mulheres nessa situação e se corresponde à sua mensagem de misericórdia.
A mensagem da misericórdia é para todos, inclusive para a pessoa humana que está em gestação. É para todos. Após ter feito esse fracasso, há misericórdia também. Mas uma misericórdia difícil, porque o problema não é dar o perdão, mas acompanhar uma mulher que tomou consciência de ter abortado. São dramas terríveis. Uma mulher quando pensa naquilo que fez... Digo-lhe a verdade: é preciso estar no confessionário, e você ali deve dar consolação, nada de punição. E por isso eu abri a todos os padres a faculdade de absolver o aborto, por misericórdia, porque, muitas vezes – sempre –, elas devem “encontrar-se” com o filho. Quando choram e têm essa angústia, eu muitas vezes as aconselho: “Seu filho está no céu, fale com ele, cante-lhe o nana-neném que você não pôde cantar-lhe”. E ali se encontra um caminho de reconciliação da mãe com o filho. Com Deus, já está o perdão, Deus perdoa sempre. Mas que ela também elabore isso. O drama do aborto, para ser bem entendido, precisa estar em um confessionário. É terrível.
O senhor disse no Panamá que se sente muito próximo dos venezuelanos e no domingo pediu “uma solução justa e pacífica, no respeito pelos direitos humanos de todos”. Os venezuelanos querem entender o que isso significa. A solução passa mediante o reconhecimento de Juan Guaidó que foi apoiado por muitos países? Outros pedem novas eleições livres. As pessoas sentem que o senhor é um papa latino-americano e querem sentir o seu apoio.
Eu apoio neste momento todo o povo venezuelano, porque é um povo que está sofrendo, inclusive os que estão de um lado e de outro, porque é todo o povo que sofre. Se eu passasse a dizer: “Ouçam a estes países! Ouçam a estes outros países que dizem isto!”, eu estaria me metendo em um papel que não conheço, seria uma imprudência pastoral de minha parte, e faria dano. Eu pensei e repensei as palavras que disse. E creio que, com elas, expressei a minha proximidade, aquilo que eu sinto. Eu sofro com o que está acontecendo na Venezuela neste momento e por isso desejo que haja uma solução justa e pacífica. O que me assusta? O derramamento de sangue. E aí também peço grandeza para ajudar aqueles que podem ajudar a resolver o problema. O problema da violência me aterroriza, depois de todo o esforço feito na Colômbia, pensem no que aconteceu na escola de cadetes no outro dia [explosão de uma bomba por parte do Exército de Libertação Nacional], algo terrificante. Por isso eu tenho que ser... Eu não gosto da palavra “equilibrado”. Quero ser pastor: “Todos! Vamos lá!”. E, se precisam de ajuda, de comum acordo, que a peçam.
Durante o seu almoço com um grupo de jovens peregrinos, uma jovem estadunidense nos contou que lhe havia perguntado sobre a dor e o desprezo de tantos católicos, em particular dos Estados Unidos, em relação à crise dos abusos. Muitos católicos estadunidenses rezam pela Igreja, mas muitos se sentem traídos e abatidos depois das recentes notícias de abusos e acobertamento por parte de alguns bispos e perderam a confiança neles. Quais são suas expectativas e esperanças para o encontro de fevereiro, para que a Igreja possa recomeçar a reconstruir a confiança entre os fiéis e os seus bispos?
Este aqui é esperto... [referindo-se ao jornalista]. Começou na viagem e chegou lá [na questão dos abusos]. Parabéns, parabéns! [risos] Não, obrigado pela pergunta. A ideia desse encontro nasceu no C9 [Conselho dos Cardeais], porque lá nós vimos que alguns bispos não entendiam bem, ou não sabiam o que fazer, ou faziam uma coisa boa e outra errada. Sentimos a responsabilidade de dar uma “catequese” sobre esse problema às Conferências Episcopais, e é por isso que os presidentes dos episcopados são chamados. Primeiro: que se tome consciência do drama, de que se trata de um menino ou de uma menina abusados. Eu recebo regularmente pessoas vítimas de abuso. Recordo uma pessoa: 40 anos sem poder rezar. É terrível, o sofrimento é terrível. Então, que tomem consciência disso.
Segundo: que saibam o que deve ser feito, qual é o procedimento. Porque, às vezes, o bispo não sabe o que fazer. É algo que cresceu muito fortemente e não chegou a todos os “cantos”, digamo-los assim. E, depois, que se façam programas gerais, mas que cheguem a todas as Conferências Episcopais: o que o bispo deve fazer, o que o arcebispo metropolitano deve fazer, e que o presidente da Conferência Episcopal deve fazer. Mas que seja claro, que haja – digamo-lo em termos um pouco jurídicos – protocolos claros. Esse é o objetivo principal. Mas, antes do que deve ser feito, é preciso tomar consciência.
Além disso, no encontro, se rezará, haverá alguns testemunhos para ajudar a tomar consciência, alguma liturgia penitencial para pedir perdão por toda a Igreja. Estão trabalhando bem na preparação do encontro. Eu me permito dizer que percebi uma expectativa um pouco “inflada”. É preciso “desinflar” as expectativas em relação a esses pontos que eu lhes disse, porque o problema dos abusos continuará, é um problema humano, em todos os lugares. Outro dia li uma estatística, que diz: 50% dos casos é denunciado, desses 50% apenas 20% são ouvidos, e vai diminuindo... E terminava assim: 5% são condenados. É terrível, terrível. É um drama humano do qual devemos tomar consciência. Também nós, tomando consciência, resolvendo o problema na Igreja, ajudaremos a resolvê-lo na sociedade, nas famílias, onde a vergonha faz com que se encubra tudo. Mas, primeiro, devemos tomar consciência e ter os protocolos e seguir em frente.
Durante esta Jornada Mundial da Juventude, o senhor disse que é absurdo e irresponsável considerar os migrantes como portadores do mal social. Na Itália, as novas políticas sobre os migrantes levaram ao fechamento do centro de acolhimento Castelnuovo di Porto, que o senhor conhece bem. Era uma experiência na qual se viam sementes de integração, as crianças frequentavam a escola, e agora essas pessoas correm o risco de marginalização. O senhor optou por celebrar com eles a Quinta-Feira Santa de 2016. Gostaria de lhe perguntar o que sente a respeito da decisão do fechamento do centro de Castelnuovo di Porto.
Eu ouvi rumores sobre o que estava acontecendo na Itália, mas estava imerso nesta viagem. Por isso, não conheço os fatos com precisão, mas posso imaginá-los. É verdade que o problema dos migrantes é muito complexo. É preciso memória. Devemos nos perguntar se a minha pátria foi feita por migrantes. Nós, argentinos, somos todos migrantes. Os Estados Unidos, todos migrantes. Um cardeal escreveu um artigo muito bonito sobre o problema da falta de memória. Usou palavras que eu uso: receber, o coração aberto para receber, acolher; acompanhar, ajudar a crescer; e integrar. E eu digo também: o governante deve usar a prudência, porque a prudência é a virtude dos que governam. Eu disse isso aqui, no último voo. É uma equação difícil.
Recordo-me do exemplo sueco, que, nos anos 1970, com as ditaduras, a Operação Condor na América Latina recebeu muitos, muitos imigrantes, e todos foram integrados na sociedade. Também vejo o que faz a Comunidade de Santo Egídio, por exemplo, integra-os imediatamente. Mas, no ano passado, os suecos disseram: “Freiem um pouco, porque não podemos completar o percurso [de integração]”. E essa é a prudência do governante. É um problema de caridade, de amor, de solidariedade. Eu reitero que as nações mais generosas em receber foram a Itália e a Grécia e um pouco também a Turquia. A Grécia foi muito generosa, assim como a Itália, muito mesmo. É verdade que se deve pensar com realismo.
Também tem outra coisa que é importante levar em conta: um modo de resolver o problema das migrações é ajudar os países de onde vêm os migrantes. Eles vêm por causa da fome ou da guerra. A Europa tem a possibilidade de investir onde há fome, e esse é um modo de ajudar esses países a crescerem. Mas – falando da África – sempre há aquele imaginário coletivo que temos no inconsciente: a África deve ser explorada! Isso é histórico e faz mal! Os migrantes do Oriente Médio encontraram outras saídas. O Líbano é uma maravilha em generosidade, hospeda mais de um milhão de sírios. A Jordânia, faz o mesmo, são abertos, fazem o que pode, esperando integrá-los. A Turquia também recebeu alguns migrantes. Nós também, na Itália, recebemos alguns. É um problema complexo sobre o qual se deve falar sem preconceitos.
* * *
“Agradeço-lhes pelo seu trabalho”, concluiu o papa. “Somente gostaria de dizer uma coisa sobre o Panamá: eu senti um sentimento novo. Eu conheço a América Latina, mas o Panamá não. E me veio esta palavra: o Panamá é uma nação nobre. Encontrei nobreza. E também gostaria de dizer outra coisa, que eu disse quando voltei da Colômbia, falando da experiência de Cartagena e de outras cidades, uma coisa que nós, na Europa, não vemos. Qual é o orgulho, neste caso, dos panamenhos? Erguer os filhos. Erguem as crianças para você e dizem: “Esta é a minha vitória, este é o meu futuro, este é o meu orgulho”. Isso, no inverno demográfico que estamos vivendo na Europa – e na Itália está abaixo de zero – deve nos fazer pensar. Qual é o meu orgulho? O turismo, a casa, o cachorrinho? Ou erguer um filho? Obrigado. Rezem por mim, eu preciso. Obrigado.”
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''Temo o derramamento de sangue na Venezuela. No confessionário, entendi o drama do aborto.'' Entrevista com o Papa Francisco no voo de volta do Panamá - Instituto Humanitas Unisinos - IHU