19 Janeiro 2019
O bispo alemão da diocese de Würzburg, Franz Jung, em uma entrevista para o jornal Tagespost, respondendo às perguntas de Oliver Maksan, Regina Einig e Kilian Martin, 09-01-2019, traçou um quadro de uma Igreja pastoralmente renovada e capaz de futuro. O ponto de partida é que uma era já acabou – a de uma Igreja de povo, como era no passado –, e não é mais possível continuar assim. São necessárias ideias, propostas e iniciativas novas. Quais?
A entrevista foi republicada por Settimana News, 16-01-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Dom Jung, você não é um político, mas, no ano passado, no início do seu mandato, assumiu um programa de governo que pretende pôr em prática?
Parece-me que três pontos são decisivos para o futuro da Igreja, para além de qualquer problema organizacional ou estrutural da paróquia, como as finanças da Igreja ou a reforma da paróquia: a oração contemplativa, o anúncio da fé e o serviço aos pobres. Só seremos credíveis como Igreja se levarmos a sério a nossa missão para com os pobres. A pergunta é: quem são os pobres? São as famílias? Os solteiros? Aqueles que estão em busca? Se quisermos que a Igreja seja sacramento de salvação para o mundo, devemos estar presentes para todos. Substancialmente, esse programa não inclui nada mais do que os três serviços fundamentais clássicos: liturgia, catequese e caritas.
Então, você não pretende idealizar algo novo?
Não. Esses pontos não são originais, mas centrais para nós como Igreja. Devemos novamente pôr a contemplação no centro. Eu noto nos padres e nos empregados de turno integral uma grande disponibilidade para assumir os compromissos. Mas talvez o encontro com o Senhor, às vezes, não tem a devida atenção. A missão começa a partir da missão para consigo mesmo. Devo me pôr em oração diante da realidade da minha vida e me perguntar: sou realmente aquilo que anuncio ou sou apenas um funcionário?
Tempos atrás, uma pesquisa sobre a vida espiritual dos padres provocou uma certa admiração. Nem todos celebram diariamente, e a confissão também é parcialmente negligenciada. Isso lhe preocupa?
Eu sempre digo aos meus padres: se vocês mesmos não se confessam, como podem pretender que as pessoas confessem? As pessoas percebem que algo não está certo. Isso também vale para a celebração. Chegar na sacristia poucos momentos antes do início da celebração não está certo. É preciso um tempo de recolhimento, e isso só é possível se estivermos presentes por um tempo antes da Santa Missa. Em última análise, podemos dizer: eu só posso anunciar aquilo que vivo. É preciso falar a partir da própria experiência. Só então poderemos nos dirigir frutuosamente aos outros. Isso significa encontrar novas formas de catequese e de aprofundamento da fé.
Em que você pensa?
O problema é que nós, para a fase decisiva da vida dos jovens adultos e dos adolescentes, não temos nenhuma proposta de catequese: ensinamos catecismo por longos anos no tempo que precede a Primeira Comunhão e a Crisma. E, depois, isso se interrompe. Na Igreja antiga, o aprofundamento da catequese, propriamente dito, começava depois de receber os sacramentos. Pense-se nas famosas catequeses mistagógicas que Ambrósio nos transmitiu. Em vez disso, nós fazemos o contrário. Isso funcionou nos tempos de uma Igreja de povo. Supunha-se que o verdadeiro aprofundamento continuava na família ou na comunidade paroquial com a participação regular na vida paroquial e com a vida de fé na família. Hoje não é mais assim.
O que deve mudar?
Primeiro, precisamos criar cristãos que tenham uma certa formação. O que não temos. Pensamos muito ainda de acordo com a lógica de uma Igreja de povo, em que todos nós crescemos. Seria significativo, por exemplo, fortalecer o catecumenato e também a celebração litúrgica da fase de crescimento na fé.
Atualmente, ensinamos catecismo durante anos. Por que produzimos apenas analfabetos em questões religiosas?
É uma pergunta importante. Eu também tive a experiência disso como professor de religião: todos os anos, começamos do zero. Isso depende do fato de que aquilo que se aprendeu não tem conexão alguma com a vida concreta. Esquece-se aquilo que aprendeu, porque parece irrelevante. O ensino da fé e a vida concreta constituem uma coisa só. Tive experiências maravilhosas na equipe formativa em um hospital. Nesse ambiente, a transmissão da fé da Igreja, a doutrina sobre a morte e sobre o que nos espera após a morte encontram logo um terreno adequado.
Você deseja novas propostas de catequese para adultos. Mas é plenamente valorizado o potencial de anúncio oferecido à pastoral comum da paróquia e em circunstâncias privilegiadas como batismos e funerais?
Os párocos às vezes reclamam dos inúmeros funerais, esquecendo-se de que são oportunidades missionárias por excelência. São momentos em que vamos ao encontro de pessoas que, caso contrário, nunca são vistas. A concorrência, aliás, não dorme no ponto. Hoje, as funerárias oferecem um pacote completo e abrangente, incluindo um orador fúnebre gratuito. Muitas pessoas o reservam quando o pároco não pode.
As situações para o anúncio da fé, portanto, não faltam. Mas as pessoas estão abertas para acolher a mensagem? De acordo com Marx, Darwin e Freud, o caminho para a fé geralmente nasce de uma cultura elementar.
Antes de crer na mensagem, a pergunta que se faz é: eu acredito no mensageiro? Em tempos de escândalos financeiros e de abusos, não damos uma boa imagem. Se alguém abusa das crianças, todo anúncio da fé acaba.
É claro, mas a fé cristã exige muito do ponto de vista cognitivo. Encarnação de Deus, morte expiatória de Jesus, ressurreição etc. O homem de hoje está fechado a essa abordagem?
O grande problema do anúncio é – como reconheceu o cardeal Kasper justamente – a pergunta sobre Deus: Deus existe e tem um papel na minha vida? Como afirma Bert Brecht: se a resposta à pergunta sobre Deus muda algo na sua vida, então você pode continuar a fazê-la, mas, se não muda nada na sua vida, então tudo acabou. Eu a considero, acima de tudo, como uma pergunta dirigida a nós: a fé muda alguma coisa na minha vida? Sem Deus, falta alguma coisa ou podemos viver sem Ele? Por isso, precisamos não só de mestres, mas acima de tudo de testemunhas.
Falamos da mudança na catequese devida ao fim da Igreja de povo. A falta de padres requer o uso de leigos na liderança da comunidade? Na Arquidiocese de Munique-Freising, segue-se esse caminho. Você pretende propô-lo também em Würzburg?
A liderança de uma paróquia é tarefa do pároco. A pergunta é se, in loco, há interlocutores que atuem como moderadores daquilo que o pároco com a sua equipe decidiu depois de ouvir os grupos. Nós nos confiamos aos voluntários porque o número de pessoal leigo em tempo integral continua diminuindo.
Em que sentido?
Nos próximos anos, em todas as dioceses alemãs, um grande número de referências pastorais e comunitárias se aposentará. E não temos novas levas que possam ocupar os lugares que ficarão vagos. O número de estudantes diminui, não só entre os candidatos ao sacerdócio.
Palavra-chave: “vocações ao sacerdócio”. Recentemente, você disse em uma entrevista que a homossexualidade não constitui um obstáculo no caminho para o sacerdócio. Mas como uma orientação homossexual pode entrar em acordo com a ideia do celibato para o Reino dos Céus?
Vários estudos dizem que a porcentagem de homens com orientação homossexual no presbitério católico é superior à média social. Como bispo, tenho que lidar com isso. Para mim, é muito importante que os sacerdotes homossexuais vivam como prometeram na sua ordenação e, assim como espero de qualquer outro, que sejam fiéis ao celibato.
Você agora pensa nos padres. O que diria aos homossexuais que querem se tornar padres?
O celibato é o dom da vida para o Reino dos Céus. “Ele foi, vendeu tudo o que tinha e comprou a pérola.” Isso para mim é o essencial. Isso vale para os candidatos heterossexuais e homossexuais.
O aspecto da renúncia consciente de um casamento heterossexual não tem papel algum?
O homossexual também renuncia à união com outro.
Mas isso significaria colocar a união homossexual e o casamento no mesmo nível.
Não, não disse isso. Eu considero a disponibilidade de seguir a Cristo e o dom de si pelo Reino dos Céus como elementos cruciais para a seriedade de uma vocação.
Você ainda está no início do seu mandato. Se tentar ir com esse pensamento até o fim, o que entrevê? Uma nova imagem de Igreja ou as ruínas fumegantes da Igreja de povo?
Em todo o caso, uma nova forma de Igreja tem início. Agora, devemos preparar o terreno. Neste momento, estamos como que paralisados, um pouco como o coelho na frente da cobra, e preferimos deixar que tudo continue assim. Mas isso está errado. É claro que grande parte das coisas em que confiávamos mais estão destinadas a desaparecer. Também por falta de dinheiro. Teremos menos colaboradores em tempo integral. Não poderemos mais manter todos os edifícios que possuímos agora. A pergunta, portanto, é: o que resta? A minha esperança é de que a oração, um anúncio renovado da fé e o serviço aos pobres constituam a riqueza de uma Igreja institucionalmente mais pobre.
Então, uma mudança radical espera por nós?
Sim. As nossas instituições eclesiásticas têm um valor. Mas, em outros países, a Igreja não as possui e, mesmo assim, continua a sua missão. O que importa é que aquilo que temos e realizamos nas nossas instituições seja aperfeiçoado por um conteúdo de fé. Ainda confiamos em muitas estruturas de apoio que, no fim, não servem. Tome a lei da Igreja sobre o trabalho. Ela é esvaziada passo a passo pelos tribunais. Mas, mais do que privilégios sociais, precisamos de pessoas que estejam convencidas da Igreja e da sua fé, e que façam as suas obras com base nela. Só isso nos ajudará a seguir em frente. Como lema para 2019, eu escolhi um versículo da Segunda Carta a Timóteo (2Tm 1, 7): “Deus não nos deu um espírito de timidez, mas de força, de caridade e de prudência”. Diante dos desafios existentes, é importante não perder o ânimo, mas sim trabalhar com a força do Espírito Santo e tentar moldar a Igreja do futuro de maneira séria e fazer isso com amor.
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''Na Igreja, precisamos de testemunhas, não de mestres.'' Entrevista com Franz Jung, bispo de Würzburg, Alemanha - Instituto Humanitas Unisinos - IHU