20 Agosto 2017
"Nada haveria de estranho no pedido de oração pelo Brasil, se ele fosse acompanhado de algum estímulo à participação na principal manifestação pública de protesto social: o Grito dos Excluídos", afirma Pedro A. Ribeiro de Oliveira, doutor em Sociologia, professor aposentado dos PPGs em Ciências da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC Minas.
Quem acompanha atentamente a conjuntura eclesiástica percebe a polarização do episcopado brasileiro entre aqueles que assumem as lutas dos Movimentos Sociais por Terra, Teto e Trabalho, e os que defendem a ordem estabelecida hoje representada pelo governo federal. Entre esses dois polos encontra-se a maioria dos bispos e sua expressão oficial – a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB.
A CNBB conquistou prestígio na sociedade quando se colocou como “voz de quem não tem voz” durante a ditadura de 1964-84. A autoridade moral então adquirida contribuiu decisivamente para o êxito de movimentos da sociedade civil como a inscrição dos Direitos de Cidadania na Constituição de 1988, o combate à Fome e à Miséria, e a Ética na Política. Gradualmente, porém, ela foi-se retirando das mobilizações sociais e prestando-lhes um apoio pouco mais do que formal. No dia 10 de agosto, ao concluir a reunião do Conselho Permanente – instância que responde pelo conjunto do episcopado brasileiro entre as Assembleias Gerais – veio o sinal de que essa retirada atingiu novo patamar.
A Presidência da CNBB lançou uma nota acompanhada de uma carta aos bispos, onde diz: “Vivemos um momento difícil e de apreensão no Brasil. A realidade econômica, política, ética vem acompanhada de violência e desesperança. O Conselho Permanente, ao refletir o momento vivido, pediu que a Presidência enviasse carta ao irmão, sugerindo um Dia de jejum e oração pelo Brasil. Pediu igualmente que fosse enviada uma oração que pudesse ser rezada nas comunidades e famílias. O dia de oração e jejum sugerido é o dia 7 de setembro próximo.”
Nada haveria de estranho no pedido de oração pelo Brasil, se ele fosse acompanhado de algum estímulo à participação na principal manifestação pública de protesto social: o Grito dos Excluídos. Criado pela própria Igreja Católica como contraponto ao ufanismo que acompanha a parada militar e civil do Dia da Pátria, ele já está em sua 23ª edição. Sem violência, com criatividade, humor e senso crítico, ele acontece logo após o encerramento das comemorações oficiais mostrando o avesso da realidade brasileira. Vários grupos de cristãos participam desse ato, marcando sua presença entre os excluídos e excluídas do banquete do mercado.
Desconheço o processo que levou a CNBB a pedir oração e jejum mas não apoiar o ato público que acontecerá nas ruas de muitas cidades brasileiras, porque esse silêncio desclassifica o Grito dos Excluídos como legítima manifestação de protesto contra o “momento triste, marcado por injustiças e violência” a que se refere a mesma carta aos bispos. Desconfio, porém, que esse silêncio obsequioso sinaliza o recolhimento da Igreja Católica para dentro de si mesma” – no aconchego dos templos e dos lares – na direção inversa da que pede Francisco: “Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo! Repito aqui, para toda a Igreja, aquilo que muitas vezes disse aos sacerdotes e aos leigos de Buenos Aires: prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças”. (A Alegria do Evangelho, 49).
Se essa hipótese é verdadeira, torna-se preocupante o atual momento eclesiástico porque sinaliza divergência entre a orientação pastoral dada pelo Papa e uma das principais Conferências Episcopais do mundo. Espero, portanto, estar enganado nesta análise da CNBB. Os fatos vindouros darão a resposta.
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A CNBB recolhida em jejum e oração - Instituto Humanitas Unisinos - IHU