22 Fevereiro 2019
No texto do evangelho que se lê na missa de hoje, continua-se com o capítulo 6 do evangelho de Lucas. A cena situa-se na planície onde Jesus tinha descido depois de ter escolhido os discípulos. Jesus apresenta um estilo de vida diferente da dinâmica do mundo. Nas suas palavras o amor é prioritário e coloca-o acima de tudo. Jesus apresenta um grande desafio; para viver sua proposta é preciso uma mudança de critérios e atitudes.
Leitura do Evangelho de Lucas 6, 27-38. (Correspondente ao 7° Domingo Comum, do ciclo C do Ano Litúrgico).
O comentário é de Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
“Mas, eu digo a vocês que me escutam: amem os seus inimigos, e façam o bem aos que odeiam vocês. Desejem o bem aos que os amaldiçoam, e rezem por aqueles que caluniam vocês. Se alguém lhe dá um tapa numa face, ofereça também a outra; se alguém lhe toma o manto, deixe que leve também a túnica. Dê a quem lhe pede e, se alguém tira o que é de você, não peça que devolva. O que vocês desejam que os outros lhes façam, também vocês devem fazer a eles. Se vocês amam somente aqueles que os amam, que gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores amam aqueles que os amam. Se vocês fazem o bem somente aos que lhes fazem o bem, que gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores fazem assim. E se vocês emprestam somente para aqueles de quem esperam receber, que gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores emprestam aos pecadores, para receber de volta a mesma quantia. Ao contrário, amem os inimigos, façam o bem e emprestem, sem esperar coisa alguma em troca. Então, a recompensa de vocês será grande, e vocês serão filhos do Altíssimo, porque Deus é bondoso também para com os ingratos e maus. Sejam misericordiosos, como também o Pai de vocês é misericordioso.”
“Não julguem, e vocês não serão julgados; não condenem, e não serão condenados; perdoem, e serão perdoados. Deem, e será dado a vocês; colocarão nos braços de vocês uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante. Porque a mesma medida que vocês usarem para os outros, será usada para vocês.”
“Amem os seus inimigos, e façam o bem aos que odeiam vocês. Desejem o bem aos que os amaldiçoam, e rezem por aqueles que caluniam vocês.” É uma proposta que vai além da tradição judia. Não há justificativa para o amor ao próximo. Pelo contrário, o chamado de Jesus é amar aos inimigos e fazer o bem aos que nos odeiam. Nas suas palavras apresenta a necessidade de gestos concretos. Não é simplesmente tentar esquecer a pessoa que me fez mal e excluí-la da minha vida. Jesus exorta a ter outra atitude que excede os limites da justiça proclamada em várias oportunidades no Antigo Testamento. É um convite a estar sempre disposto a acolher o outro, além da sua atitude.
Jesus propõe não responder com a mesma moeda, senão pelo contrário, acolher ao outro como um irmão mesmo quando fomos feridos e injuriados. Jesus sugere um estilo de vida em que a violência e o ódio não tenham espaço, mas sejam eliminados e desapareçam. Jesus está convidando a viver o amor como ele o viveu, amando e perdoando até quando está na cruz, junto aos criminosos que estavam crucificados com ele, como descreve Lucas: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que estão fazendo!”
As atitudes de Jesus descritas nos evangelhos são um claro testemunho deste amor sem limites, onde não existe a discriminação, onde não há fronteiras, nem raiva ou rancor que justifiquem a distância ou a rejeição.
Nesta passagem Jesus convida-nos a viver um amor diferente. Ainda que o ódio, a distância, a crítica possam ser justificados, Jesus indica uma transformação profunda: mudar o que seria lógico e até justificado por uma conversão de vida onde não tenha espaço para violência ou agressividade.
“O que vocês desejam que os outros lhes façam, também vocês devem fazer a ele.” Conhecida como a regra de ouro, Jesus apresenta não somente aquilo que não devem fazer, senão também o que deve ser realizado. A pergunta que se transforma em medida do amor é a própria pessoa: o que você deseja que outros lhe façam, faça-o também. A seguir Jesus apresenta a novidade do amor que é o núcleo da Boa Nova: um amor gratuito, desinteressado, que não está esperando a recompensa. Fazer o bem não somente àqueles que fazem o bem, como uma retribuição, mas fazer o bem a todos e todas os que estão ao nosso lado.
A proposta de Jesus é exigente e austera. Uma das motivações que Jesus oferece para atuar assim é ser diferente dos pecadores. Os que recebem as palavras de Jesus são convidados a superar a atitude dos pecadores. No seu modo de se comportar e nas suas atitudes com as outras pessoas o cristão está chamado a viver um amor diferente que supera a generalidade das pessoas.
Um amor que não tem limites, e sua medida é a gratuidade. “Se vocês amam somente aqueles que os amam, que gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores amam aqueles que os amam. Se vocês fazem o bem somente aos que lhes fazem o bem, que gratuidade é essa?”
Neste convite de viver fazendo o bem, superando uma justiça baseada em critérios puramente humanos, Jesus faz uma proposta exigente que só pode ser entendida desde o amor e a misericórdia de Deus para cada pessoa. Atuando dessa forma se recebe uma recompensa que, como disse Jesus, será grande: “Vocês serão filhos do Altíssimo, porque Deus é bondoso também para com os ingratos e maus. Sejam misericordiosos, como também o Pai de vocês é misericordioso”.
Quem atua de forma gratuita, sem cálculos e sem aguardar recompensa será chamado filho de Deus. Esta é a mensagem central da Boa Nova de Jesus: acolher um amor que supera a lógica da justiça e viver com bondade e compaixão. Um amor que supere a violência!
Como escreve José Antonio Pagola em palestra proferida no Congresso Internacional de Ávila, "Misericordiosos como o Pai”: “As várias tradições evangélicas indicam na mesma direção: a atividade profética de Jesus é colocada em movimento, motivada e dirigida pela misericórdia de Deus. Sua paixão por Deus traduz-se em compaixão pelo ser humano. É a misericórdia de Deus que atrai Jesus para os últimos: as vítimas, os que sofrem, os maltratados pela vida ou pelas injustiças dos poderosos, os pecadores e as pessoas repulsivas, desprezadas por todos. O Deus da lei e da ordem, o Deus da adoração e dos sacrifícios, o Deus do sábado, nunca poderia dar vida à atividade profética de Jesus, tão sensível ao sofrimento dos inocentes e à humilhação dos excluídos. (Texto completo: Jesus, misericórdia encarnada de Deus. Conferência de José Antonio Pagola )
As palavras de Jesus convidam-nos a perguntar-nos: Como vivemos nossa vida cristã em relação às diferentes atitudes das pessoas que estão ao nosso lado? Mantemos um secreto espírito de vingança, procurando devolver o mal com o mal? Se pensarmos nas nossas atitudes, achamos a proposta de Jesus desmedida e até exagerada?
Há misericórdia no nosso interior? Em que circunstâncias?
Cruz
Uma meta a longo prazo
nos exige esforço
duro e prolongado.
Mas um cálculo
nos dá a confiança de que vale a pena.
talvez a cruz
seja somente um investimento.
Por amor a outra pessoa,
sacrificamos com gosto
tempo, força e dinheiro.
A cruz se chama
solidariedade com o outro
que sinto de algum modo
parte de mim mesmo.
Um golpe repentino,
pode fulminar-nos em um instante,
e nossa existência
fica ferida sem remédio.
Perde-se a saúde,
um ser querido,
ou a estima pública.
Arranca-se um galho verde,
uma parte viva do eu.
Quando esta mutilação
encontra seu repouso,
a cruz se chama
aceitação.
Existe a cruz livre
a que escolho
aquela da qual não fujo.
Mas uma vez nela pregado
já não posso descer
quando quero.
Entregam-se
os projetos aos cravos
a fantasia aos espinhos
o nome aos rumores
os lábios ao vinagre
e os bens à partilha.
Aqui a cruz se chama
fidelidade ao amor no amor,
que é canto e fortaleza
ressuscitando pela ferida.
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Uma dinâmica de amor inesperada - Instituto Humanitas Unisinos - IHU