13 Outubro 2017
Deus quer que todos se salvem, diz o oráculo de Isaías e a parábola de Jesus, sobre o grande festim messiânico e nupcial. Mas cada um está livre para responder ao convite de Deus, fazendo-se digno.
A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando as leituras do 28º Domingo do Tempo Comum A. A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
Eis o texto.
Referências bíblicas
1ª leitura: O Senhor dará um banquete, eliminará a morte e enxugará as lágrimas de todas as faces (Isaías 25,6-9)
Salmo: Sl. 22(23) - R/ Na casa do Senhor habitarei eternamente.
2ª leitura: “Tudo posso naquele que me dá força” (Filipenses 4,12-14.19-20)
Evangelho: “Convidai para a festa todos os que encontrardes” (Mateus 22,1-14 ou 1-10)
Notemos em primeiro lugar que o Reino de Deus, o poder divino sobre todas as coisas, apresenta-se como uma festa: os trabalhos cessam, para se entregar à alegria. Pensemos nas núpcias do Cordeiro, em Apocalipse 21. Núpcias de Deus com a humanidade, para que, com Ele, tornemo-nos uma só carne. Nesta parábola, somos apenas convidados, mas outros textos dirão que fazemos somente um com o Filho. Em todo caso, aqui somos convidados para um banquete. Sabemos a importância do alimento na Bíblia. Este tema é abordado desde o primeiro capítulo de Gênesis, no versículo 29. E continua: logo no capítulo 2, lemos que quem come do fruto da árvore proibida, para fazer a experiência do mal, morrerá. No outro extremo da Bíblia, as coisas se invertem. Temos ali uma nova árvore, na qual se afixa o espetáculo do nosso mal, da nossa loucura homicida, e a revelação do bem absoluto, do amor que leva o Filho a dar a própria vida, para que dela vivamos. Desta vez, ao contrário de Gênesis 2, quem come do fruto desta árvore viverá, e quem se recusa a comer dele, morrerá (reler João 6). Não precisamos retomar todos os textos das Escrituras que colocam o tema do alimento e da refeição em primeiro plano, como o Maná, a mesa preparada no deserto de sede e de fome (Salmo 78,29). Concentremo-nos somente em que a cruz é o leito nupcial das bodas do Filho com a humanidade, e que o banquete de núpcias torna-se Eucaristia, ou seja, Ação de Graças.
Acabo de dizer que somos ao mesmo tempo os convidados e os esposados. Quando dizemos «esposados», queremos insistir em que, no Filho, Deus vem fazer Sua a nossa carne. E quando dizemos «convidados», queremos sublinhar que isto não se produz sem o assentimento da nossa liberdade. É preciso que, de nossa parte, haja um deslocamento em resposta ao «deslocamento» realizado por Deus, que veio juntar-se a nós. É indispensável o nosso «sim», como eco do «sim» de Maria no «relato» da Anunciação. Nesta parábola, nos é dito que os primeiros convidados, os que o Rei havia escolhido, recusaram o convite. Não vamos esquecer que, desde o princípio do capítulo 21, Jesus está se dirigindo aos sumos sacerdotes, aos anciãos do povo e aos fariseus. Temos aí os convidados que se esquivaram. No lugar deles, estarão presentes nas núpcias todos os desconhecidos, recrutados nas “encruzilhadas dos caminhos” das cidades e dos campos. “Todos os que encontrardes”, diz o texto, fazendo questão de precisar, “maus e bons”. O que pode surpreender! Mas, no fundo, a questão não está em ser bom ou ser mau: quem verdadeiramente pode pretender-se bom? De fato, a questão está em responder ou não responder ao convite: convite que é endereçado a todo o mundo. Recusar corresponde a desprezar o dom de Deus: dom de Si mesmo. Os primeiros convidados não se interessaram pelas núpcias propostas. Chegaram até mesmo a matar os que lhes transmitiram o convite. Prelúdio ao homicídio do Filho e de muitos que, mais tarde, irão anunciar o seu Evangelho.
Surpreendente este Jesus. Poderíamos crer que a parábola terminaria com o convite aos que não têm nenhum título a fazer valer, para participarem do banquete de núpcias. E, no entanto, eis que se abre um novo capítulo; o da expulsão do homem que não se encontra vestido com o traje de festa! Alguns comentaristas falaram em «estado de graça», em retidão moral, etc. Penso que, de novo, é preciso evocar o tema das vestes no conjunto da Bíblia, sem mais inconvenientes que os de omissão e de resumo. É um tema que começa logo no início: em Gênesis 3, fala-se da vergonha de Adão e de Eva quando descobrem estarem nus. Nudez simbólica, com certeza: haviam projetado fazerem-se «como Deus» (versículo 5), e eis que se descobrem como a serpente (o «astuto», do versículo 1, pode também ser traduzido por «nu».) Despojados e sem defesa. É Deus quem finalmente os vestirá com “túnicas de pele” de animal: ei-los assim de volta à imagem desta animalidade que deveriam dominar. No outro extremo do relato bíblico, pregado na cruz, vamos encontrar o homem nu: seus algozes o haviam desnudado e repartiram entre si as suas vestes. A nudez, portanto, é o traje de festa que o Cristo usa em seu leito de núpcias com a humanidade. Penso ser a partir daí que devemos interpretar a imagem do homem excluído do banquete, nesta parábola. Não podemos alcançar a unidade com Deus a não ser se desprovidos de tudo, despojados, sem nenhum título que fazer valer. O dom de Deus não pode ser senão totalmente gratuito.
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