18 Setembro 2018
“Mas não, não é verdade que somos contra o papa.” Benjamin Harnwell afasta a hipótese. Certamente, é difícil pensar que a nova academia promovida pelo instituto do qual é presidente, o Dignitatis Humanae – que abrirá em breve na Cartuxa de Trisulti, em Ciociaria, na Itália, patrocinada pelo ex-estrategista de Trump, Steve Bannon, junto com o cardeal Raymond Leo Burke, líder dos opositores de Bergoglio –, não contenha em si um espírito crítico em relação a este pontificado.
A reportagem é de Salvatore Cernuzio, publicada por Vatican Insider, 17-09-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
“Trata-se de um projeto para promover a civilização ocidental e os seus fundamentos judaico-cristãos, de acordo com o pensamento nacionalista populista desenvolvido por Bannon”, explica Harnwell por telefone ao La Stampa. E só isso já entra em choque com as recentes palavras de Francisco na Sicília, para quem o único populismo admissível é o “cristão”: “Servir e escutar”.
“Sim, mas não é óbvio que se deve compartilhar cada palavra do papa para ser católico”, rebate Harnwell, ex-assistente em Estrasburgo do europarlamentar conservador britânico de origem cingalês Nirj Deva.
“Somos leigos. Ter outras opiniões ou expressar o mesmo conceito com palavras diferentes não significa que não somos católicos ou mesmo contra o papa. Além disso, posso lhe dizer mais uma coisa? Não se deve ler aquilo que os jornais escrevem sobre Bannon. Nas suas palavras, está enraizado o ensinamento da Igreja, e o seu populismo também é orientado por um pensamento muito cristão, o da defesa e da promoção do trabalhador, do operário, uma categoria vulnerável.”
Nesse mesmo pensamento, no entanto, coagulam uma islamofobia que se desvanece na supremacia branca, a denúncia do “capitalismo clientelista” das finanças globais, o “sangrento conflito” necessário para preservar as raízes ocidentais, o surgimento de um movimento mundial de centro-direita (uma espécie de “tea party” em escala global.
Pelo menos era isso que, em 2014, portanto muito antes de Donald Trump desembarcar na Casa Branca, teorizava o próprio Bannon, então diretor do Breitbar News, em uma longa conexão via Skype com o Dignitatis Humanae Institute, órgão conservador católico com sede a poucos passos da Basílica de São Pedro, conectado, entre outras coisas, com políticos de vários países, em cujos organogramas se registram os nomes dos diversos cardeais.
Parece que a visão de mundo bannoniana toma forma nessa série de cursos que serão realizados na antiga abadia em Collepardo (sudeste de Roma), abandonada pelos últimos três monges idosos que se mudaram para Casamari e que foi reerguida pelo instituto depois de um leilão.
“São cursos de filosofia, teologia, história e economia”, explica Harnwell, que serão ministrados por quatro professores provenientes de universidades da Itália e dos Estados Unidos, dirigidos principalmente a jovens de 21 a 22 anos, que desejam receber uma “formação” (“e não um adestramento”) segundo um modelo já experimentado nos Estados Unidos com diversos think tanks ou cursos de verão de natureza católico-tradicionalista. “Depois, se também houver sacerdotes e políticos interessados, serão bem-vindos. Mas não são o nosso alvo.”
O objetivo ou, melhor, aquilo que Harnwell define como “pilar fundamental” de todo o projeto é que “cada homem é feito à imagem e semelhança de Deus. Sobre esse conceito, verterão todos os cursos”. Cada pessoa, portanto. Os homossexuais também? “Boa pergunta. De qualquer modo, sim, toda pessoa, porque somos todos pecadores. Isso não significa que a Igreja não possa propor regras justas para viver.”
E os migrantes? “Também. O tema da imigração, no entanto, é um assunto sobre o qual é preciso refletir bem. Eu não acho que seja errado para um povo dar um limite ao fluxo migratório. É razoável querer defender a própria identidade.”
O mesmo que diz o ministro italiano [Matteo] Salvini, em suma. “Sim, de certo modo, estamos de acordo com o que Salvini diz.” Em todo o caso, Benjamin Harnwell não pode dizer mais a respeito: “Ainda está tudo em construção. Por enquanto, apenas dois professores aceitaram. Os outros dois ainda têm que responder. Ainda devemos preparar aulas, horários e assim por diante”.
Na realidade, explica, “não queríamos publicizar a iniciativa ainda. Apenas dissemos que se começaria um projeto para aprofundar o tema da defesa da civilização ocidental. Depois, alguns jornais souberam de Bannon e de Burke, e montaram uma narrativa – a de uma ala anti-Francisco – que eu entendo que seja cativante, mas não corresponde à verdade”.
Veremos. Enquanto isso, as palavras à Reuters do cardeal Burke – o purpurado que figura entre os quatro signatários das “dubia” sobre a Amoris laetitia de Bergoglio por causa do acesso dos divorciados em segunda união aos sacramentos – sobre a sua colaboração com Bannon levarão a entender o contrário.
“Promover diversos projetos que deverão fazer uma contribuição decisiva à defesa daquilo que se costumava chamar de cristandade”, disse ele. Como que dizendo que é melhor intervir antes que se chegue ao “declínio” definitivo da Igreja Católica. O que, segundo os modernos teocon, já começou há seis pontificados.
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Uma academia ''teocon'' em defesa da cristandade: ''Não é verdade que somos contra o Papa Francisco'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU