15 Agosto 2018
Esta é a segunda matéria, de uma série de duas partes, que traz entrevistas sobre a participação do território de Manguinhos no 12° Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva. Na primeira matéria sobre o 12° Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva relatamos sobre a importância de se discutir sobre saúde coletiva, o fortalecimento de direitos, especialmente do acesso aos serviços públicos de saúde, através da entrevista com Leonídio Santos, coordenador da Cooperação Social da Fiocruz.
A entrevista é de Edilano Cavalcante, produzida por parceria entre RioOnWatch e Fala Manguinhos! e publicada por Abrasco, 13-08-2018.
Como forma de popularizar o debate, o Fala Manguinhos! realizou em sua página a cobertura do evento, transmitindo vídeos ao vivo. Um dos momentos que capturamos foi uma importante fala de Patrícia Evangelista, moradora de Manguinhos, militante e sócia-fundadora da Organização Mulheres de Atitude. Tivemos ainda a oportunidade de conversar um pouco mais com Patrícia, que nos relatou sobre a relação entre as discussões feitas no evento e o território de Manguinhos, onde ele ocorreu, e como os moradores ocuparam o espaço do evento para debater as suas demandas.
Patrícia, você participou da mesa de abertura em homenagem à Marielle Franco, mencionando o desmonte do SUS e as violações de direitos que têm ocorrido nos últimos meses. Qual é a importância de falar sobre direito à vida e sobre o adoecimento diário de nós favelados por conta da “guerra às drogas” em um evento como esse? Como você vê a relação da saúde pública com a segurança pública nas favelas?
A “guerra às drogas” é a desculpa dada pela sociedade, por meio dos órgãos do Estado responsáveis pela segurança pública, para cometer todo tipo de violência e de violação de direitos na favela, inclusive violando a direito [dos moradores] de exercer seu direito de ir e vir nesses territórios e de se deslocar para outros lugares da cidade. Essa política de “guerras às drogas” serve para cometer o genocídio da população da favela e mantê-la sob controle e, de preferência, isolada na favela, evitando sua circulação pela cidade.
A partir de suas experiências e vivências dentro de Manguinhos, construindo junto aos movimentos e debatendo sobre justiça e direitos, o que você acredita que deveria constar no relatório final da ABRASCÃO para impactar diretamente a saúde de pessoas moradoras de áreas de favela?
No meu entender, acho que não é possível produzir justiça, direitos e, em especial, saúde nas favelas sem uma participação efetiva de quem vive nesses lugares. As favelas surgem da necessidade das pessoas de construírem uma alternativa de moradia em uma sociedade que não garante para a maioria das pessoas as condições mínimas necessárias a uma vida com saúde. Nós temos uma sociedade estruturada em torno de uma concentração de renda, que é produtora de uma extrema desigualdade social. Essa injustiça social que produz as favelas, acaba caracterizando-as como um território no qual a população sofre uma intensa e continuada violação de direitos, onde as pessoas vivem uma realidade sem as condições básicas para uma vida com saúde. Um território no qual impera um estado de opressão e de exceção. [O relatório deve] mostrar as desigualdades produzidas também pelos serviços públicos, e que a violência estrutural está colocada no nosso cotidiano.
E como você vê a participação dos moradores de Manguinhos no congresso?
A participação de moradores de Manguinhos nas atividades do ABRASCÃO foi restrita à participação de oito pessoas inscritas pelo Conselho Gestor Intersetorial de Manguinhos que atuaram na condição de público desse evento, além de três ou quatro moradores que foram convidados a participarem de mesas no evento. Foram convites feitos a esses indivíduos não pela condição dessas pessoas serem moradoras de Manguinhos e sim por outros motivos, como as suas inserções nas discussões sobre as temáticas que estavam sendo debatidas na mesa. Essa falta de participação coletiva da favela de Manguinhos na construção de atividades desse evento nos mostra que o conhecimento e o saber popular ainda não são valorizados. Esse abismo incomodou um grupo de moradores e trabalhadores de Manguinhos e levou à organização do “Favela Ocupa ABRASCÃO”. Considerei essa atividade uma excelente oportunidade para trazer para o ABRASCÃO 2018 a possibilidade de uma aproximação com a realidade de Manguinhos, território que abrigou esse evento. Assim como outras favelas do Rio de Janeiro, os moradores têm muito a dizer sobre o tema desse congresso: “Fortalecer o SUS, os Direitos e a Democracia”. E é claro que eu não poderia deixar de divulgar essa atividade no final da minha fala na mesa de abertura do ABRASCÃO 2018.
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Abrascão em Manguinhos: a Favela ocupa os espaços acadêmicos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU