02 Julho 2018
“Francisco obviamente parece ter uma concepção diferente do caminho para a unidade dos cristãos, acreditando que ela começa com ação comum em áreas onde as igrejas já concordam e têm valores semelhantes”, escreve John L. Allen Jr., jornalista, em artigo publicado por Crux, 01-07-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
C.S. Lewis escreveu a famosa frase em Os Quatro Amores "o que atrai as pessoas por serem amigos é que eles veem a mesma verdade. Eles a compartilham". Isso foi uma afirmação filosófica para Lewis, mas pode-se dizer também que essa é a abordagem do Papa Francisco em relação a todo tipo de diálogo, incluindo o ecumênico, a fim de uma maior unidade cristã.
O próximo sábado vai ser um exemplo clássico de "ecumenismo de amizade" em ação. O Pontífice se juntará aos chefes das igrejas cristãs do Oriente Médio em Bari, na Itália, para um dia de oração pela paz.
A basílica da cidade de Bari contém as relíquias de São Nicolau, venerado igualmente pelos católicos e ortodoxos, o que a torna um destino popular de peregrinação para muitos cristãos orientais, e tem sido um ponto de encontro para reuniões ecumênicas. Há uma capela ortodoxa dentro da basílica católica, e liturgias ortodoxas são celebradas periodicamente em um altar ao lado do túmulo de São Nicolau.
Por isso, Bari é muitas vezes descrita como uma cidade ecumênica "por excelência".
Francisco convidou os patriarcas e os chefes de todas as Igrejas orientais e de outras comunidades cristãs, para se juntarem a ele em Bari, estando eles ou não em comunhão com Roma. No momento, ainda não se sabe quem vem, sobretudo se o Patriarca Kirill da Igreja Ortodoxa Russa, que é historicamente ambivalente em relação a muitos exercícios ecumênicos, aceitará o convite do Papa.
O paralelo mais próximo ao evento, provavelmente remonta a 1991, quando Papa São João Paulo II convidou representantes dos países envolvidos na primeira guerra do Golfo a irem a Roma para se juntarem a ele em orações pela paz. Nessa ocasião, no entanto, apenas os chefes das igrejas católicas que estavam na lista de convidados.
À espera de grandes multidões, as autoridades municipais de Bari anunciaram que determinadas áreas da cidade vão ter acesso limitado para carros durante o sábado, oferecendo incentivos para que as pessoas convidadas utilizem ônibus e trens.
No passado, o diálogo ecumênico era muito focado em questões teológicas e eclesiológicas – e explorava conceitos diferentes de salvação, por exemplo, ou em relação aos sacramentos, ou às ordenações, ou à interpretação bíblica. O problema com esta abordagem é que ela parece sempre acentuar onde as igrejas discordam, mesmo que haja um sincero desejo de encontrar um ponto comum entre aqueles que tomam parte no exercício.
Francisco obviamente parece ter uma concepção diferente do caminho para a unidade dos cristãos, acreditando que ela começa com ação comum em áreas onde as igrejas já concordam e têm valores semelhantes. Evidentemente, o Oriente Médio é um claro exemplo disso.
Qualquer pessoa que tenha passado muito tempo em círculos cristãos no Oriente Médio, sabe o quão profundos são os laços ecumênicos entre fiéis comuns, com muitas pessoas indiferentes, às vezes até sem conhecimento, das distinções denominacionais que parecem tão grandes em outros lugares. Esse senso de causa comum nasce do sentimento de partilha de uma identidade entre uma minoria em contraste com uma maioria islâmica.
Como se sabe, a população cristã em toda a região vem diminuindo por algum tempo e atualmente no Iraque e na Síria a ameaça que o cristianismo enfrenta é existencial. Em outros lugares, como no Egito e no Líbano, consideráveis minorias cristãs ainda não enfrentam risco de vida, mas sim uma série de enormes desafios, bem como crônicos surtos de violência e repressão.
Opressores do cristianismo geralmente não fazem nenhuma distinção entre os vários ramos da família cristã, e nem a maioria dos próprios cristãos. Francisco tem se referido a este vínculo como um "ecumenismo de sangue".
Da maneira como Francisco vê, se unir para fazer algo em nome do sofrimento dos cristãos do Oriente Médio, não só é valioso em si mesmo, mas também é uma rota mais rápida e mais confiável para a unidade do que o debate teológico.
Arcebispo Francesco Cacucci de Bari-Bitonto explicou recentemente a visão de ecumenismo do Papa num ensaio para a revista chamada Vita Pastorale, ou "Vida Pastoral".
"Na perspectiva do Santo Padre, a comunhão entre as igrejas não é apenas fruto de um anseio e de um caminho comum, mas também a unidade para uma proclamação comum de paz" escreveu Cacucci.
O bispo previu que a oração comum do próximo sábado "ajudará a nos sentirmos como um só povo cristão, com o mesmo olhar de fé e de amor, que vê a tragédia humanitária que envolve todo o Oriente Médio."
Cacucci argumentou que a urgência da situação no Oriente Médio combinada com o legado ecumênico de Bari, fazem o evento de 7 de Julho ser um potencial ponto de virada.
"Se naquelas terras cristãos vivem o ecumenismo do martírio, uma vez que o derramamento de sangue cristão não faz distinções confessionais, o ecumenismo do povo de Bari nos permite apresentar ao Senhor, unidos, uma oração para os sofrimentos da vida através da intercessão de São Nicolau."
Falta saber que diferença o sábado de oração pode fazer para o Oriente Médio.
Em si, no entanto, o encontro representa um avanço notável na campanha de Francisco para um ecumenismo de amizade, que, conforme descrito por Lewis, nasce de uma mesma verdade - e, neste caso, a vontade de se fazer algo pelo Oriente Médio em parceria.
Confira no mapa onde Bari se localiza:
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Em Bari, Francisco busca um ‘ecumenismo de amizade' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU