19 Agosto 2016
Sempre que acaba um fim de semana de três dias pensamos o mesmo: quem dera fossem todos assim. Quatro dias trabalhando, no máximo, e três dias descansando.
Apesar de soar como heresia para alguns, a verdade é que isso não só é possível, como já começa a ser considerado recomendável tanto para os trabalhadores como para as empresas.
A reportagem é de Jaime Rubio Hancock, publicada por El País, 16-08-2016.
Em 2008, o Estado de Utah ofereceu uma semana laboral de quatro dias aos funcionários públicos, mantendo o total de 40 horas semanais. Participaram 18.000 pessoas (dos 25.000 trabalhadores) e quase dois terços dos participantes relataram um aumento de produtividade. Além disso, “o menor número de horas extras e a diminuição das despesas com as faltas economizaram ao Estado quatro milhões de dólares e reduziram as emissões de carbono em 400.000 toneladas naquele ano”, escreve Douglas Rushkoff no livro Throwing Rocks at the Google Bus, em que explica como as empresas tecnológicas se colocaram a serviço de um crescimento econômico insustentável e propõe novos modelos de organização e distribuição.
Dos participantes no teste de Utah, 80% pediram para manter o horário “citando benefícios nas relações pessoais e familiares e no bem-estar pessoal”, escreve Rushkoff. Entretanto, em 2011, a iniciativa foi cancelada por disputas políticas e não por problemas com os trabalhadores ou com os cidadãos.
Algumas empresas privadas também quiseram aproveitar os benefícios dessas iniciativas: “A Treehouse, uma startup de educação online, adotou uma semana laboral de quatro dias e cresce 120% ao ano”, acrescenta Rushkoff. E, nesse caso, são 32 horas semanais.
O CEO da empresa, Ryan Carson, explicava na revista Inc que as pessoas trabalham mais sabendo que a semana acabará logo. Seu objetivo é fazer de tudo para alcançar as metas e voltar para casa tranquilos na quinta-feira à tarde. “Quem é preguiçoso não sobrevive na Treehouse”, acrescenta Carson. Ele também acaba com a imagem do empreendedor que trabalha 16 horas por dia: “Acho uma bobagem. Muitos empreendedores querem trabalhar o dia todo para se sentirem importantes. Mas não precisariam trabalhar tanto”.
Algo parecido acontece na Basecamp, uma empresa que lançou uma plataforma de gestão de tarefas. Seus funcionários trabalham 32 horas semanais entre maio e outubro. Alguns continuam trabalhando na sexta, mas podem dividir essas horas como quiserem.
“Em quatro dias se faz um trabalho melhor do que em cinco” escrevia o CEO Jonathan Fried no The New York Times. “Quando você tem menos horas para trabalhar, você perde menos tempo. (...) Tende a se concentrar no que é importante”.
O fato de as empresas se verem beneficiadas por uma redução das horas de trabalho não deveria nos surpreender. “No século XIX, quando os sindicatos obrigaram os donos das fábricas a limitar a jornada laboral em 10 (e depois oito) horas, a direção se surpreendeu ao descobrir que a produção aumentou… E que diminuiu o número de erros caros e de acidentes”, lembra a diretora da revista Harvard Business Review, Sarah Green Carmichael, citada na Science of Us.
Segundo a Treehouse, muitos de seus funcionários tinham ofertas do Facebook e do Twitter, mas decidiram que um fim de semana de três dias valia a pena. Em outras palavras, enquanto os cinco dias e as 40 horas forem o padrão, algumas empresas podem atrair funcionários oferecendo melhores condições além do salário.
Isto não serve só para atrair trabalhadores, mas também para mantê-los. É o objetivo da marca de roupas japonesa Uniqlo: os funcionários de algumas de suas lojas trabalham quatro dias por semana desde o ano passado, mantendo, porém, o total em 40 horas. O objetivo é que os trabalhadores fiquem mais anos na empresa (e, de quebra, rebater as informações negativas a respeito das condições nas fábricas dos fornecedores chineses).
Os países e regiões em que a jornada de trabalho foi reduzida também testemunharam uma diminuição na pegada de carbono, como no caso de Utah. Segundo Rushkoff, se trabalharmos um dia a menos por semana, “temos tempo para fazer as coisas mais devagar, como ir ao trabalho a pé”, o que produz menos poluição. E se não vamos trabalhar na sexta (ou na segunda), é bem possível que não precisemos pegar o carro ou o ônibus nesse dia, haveria menos engarrafamentos e, portanto, perderíamos menos tempo ao volante, diz a Scientific American.
Outra vantagem, acrescenta Rushkoff, é que “se reduziriam tanto as horas extras como a sobrecarga de trabalho, e ambas as coisas estão estatisticamente vinculadas a doenças mentais e câncer”.
E não só isso: a Science of Us cita um meta estudo publicado na revista científica The Lancet, segundo o qual quem trabalha 55 horas semanais tem um risco de acidente vascular cerebral 33% superior a quem trabalha menos de 40 horas semanais. E o risco de doenças coronárias é 13% superior.
Também dormiríamos mais: segundo a mesma publicação, quem trabalha menos de 40 horas dorme mais e, além disso, pega no sono com mais facilidade que quem trabalha mais de 55 horas.
Por fim, é preciso lembrar que as 40 horas não são um imperativo genético: hoje em dia, graças à tecnologia, poderíamos trabalhar menos. Menos até que quatro dias ou 32 horas semanais, como propõe Anna Coote, diretora de política social no Think Tank New Economics. Segundo cita a New Yorker, Coote aposta em uma semana de 21 horas. Esse seria o padrão, embora cada um possa decidir se quer trabalhar mais ou menos Coote explica que a medida ajudaria a combater “o excesso de trabalho, o desemprego, o consumismo, as altas emissões de carbono, o baixo nível de bem-estar, as desigualdades e a falta de tempo para viver de maneira sustentável, cuidar dos outros e simplesmente aproveitar da vida”.
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E se todos os fins de semana tivessem três dias? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU