Na França,
Audun Lysbakken certamente passaria por um político um tanto irreverente: no outono de 2010, após o nascimento de sua filha Aurora, o ministro norueguês da Infância, da Igualdade e da Coesão Social tirou quatro meses de licença-paternidade. Durante dezesseis semanas,
Audun Lysbakken trocou fraldas, fez compras e preparou as refeições enquanto sua mulher voltava para o trabalho. “Eu queria passar tempo com meu bebê e mostrar que o trabalho, por mais importante que seja, não justifica que se fuja das responsabilidades familiares”, explica. “Estar em casa é preocupar-se ao mesmo tempo com pequenas e grandes coisas: saber quando o bebê comeu, conhecer seus hábitos, arrumar suas roupas e estar lá quando ele sorrir pela primeira vez.”
A reportagem é de
Anne Chemin, publicada pelo jornal
Le Monde e reproduzida pelo
Portal Uol, 28-06-2011.
Audun Lysbakken não tem nada de original: algumas semanas depois que ele saiu, o ministro da Justiça,
Knut Storberget, tirou uma licença-paternidade de três meses para cuidar de sua filhinha, Ingrid. “Alguns anos atrás, essas licenças certamente teriam suscitado uma grande polêmica”, sorri
Audun Lysbakken. “Mas hoje é o contrário: não tirá-las é que criaria uma controvérsia! Em vinte anos, as mentalidades mudaram completamente: os noruegueses acham normal que os pais passem tempo junto de seus filhos. Se queremos que as mulheres consigam a igualdade no mundo do trabalho, é preciso que as responsabilidades sejam mais bem divididas em casa.”
Na Noruega, essa pequena revolução familiar tem nome: pappapermisjon. A cada nascimento, os pais, que depois do parto têm direito a uma dupla licença de quinze dias, em seguida dividem uma licença parental de 46 semanas com pagamento de 100% do salário, ou uma licença parental de 56 semanas com pagamento de 80% do salário. Os pequenos noruegueses passam, portanto, seu primeiro ano junto de suas mães... e de seus pais: para incentivar os homens a cuidarem de seus filhos, uma cota de dez semanas é reservada inteiramente a eles. Se eles recusam sua pappapermisjon, essas dez semanas que a mãe não pode tirar em seu lugar são perdidas, o que penaliza a família inteira. O resultado é impressionante: na Noruega, 90% dos pais tiram pelo menos 12 semanas de licença parental.
Grete Berget era ministra da Infância e da Família quando a lei sobre a pappapermisjon foi votada, em 1993, por um governo socialdemocrata. Hoje, ela sorri quando pensa nas gozações e no desprezo suscitados na época por essa reforma, inspirada no modelo sueco. “Mas nossa constatação era simples”, explica
Grete Berget, que hoje é conselheira junto à Ombudsman para a Igualdade. “Viemos de uma sociedade em que a divisão de papéis era muito distinta: os homens se encarregavam do trabalho, e as mulheres, da família. Agora que as mulheres entraram no mercado de trabalho, os homens precisam assumir sua parte de responsabilidade dentro da família. Igualdade é isso!”
Antes da votação da lei, em 1993, somente 3% dos pais tiravam uma licença parental após o nascimento da criança. Dois anos mais tarde, o número saltou para 70%, e agora chega aos 90%. “É uma verdadeira revolução!”, constata
Elin Kvande, professora de Sociologia na Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU) e autora de um livro sobre a paternidade. “Hoje, os pais estão mais próximos de seus filhos e participam mais ativamente da vida familiar, durante, mas também após a licença parental. É uma ótima notícia para os casais: as pesquisas mostram que quanto mais igualitários são os casais, menor é a ocorrência de divórcios. Muitas separações acontecem por tensões geradas pelas desigualdades que persistem nos lares”.
Petter Merok, diretor de tecnologia da Microsoft na Noruega, faz parte desses “novos pais” que vemos nas ruas de Oslo, à tarde, passeando com seus carrinhos de bebê. Para
Olav, seu filho mais velho, ele parou de trabalhar por nove meses; para
Erik e
Astrid, os menores, ele tirou duas licenças de três meses cada. Sua esposa, que é cirurgiã, voltou para o trabalho:
Petter Merok ficou sozinho com as crianças. “No início, pensamos que vamos fazer um monte de coisas extraordinárias, e aos poucos simplesmente aprendemos a aproveitar o tempo passado junto com as crianças”, conta. “Lembro-me de ter feito alguns recrutamentos para a Microsoft nesse período: eu chamava os candidatos até minha casa e fazíamos as entrevistas em parques, passeando com o carrinho!”
Hoje,
Petter Merok voltou para o escritório, mas seu ritmo de trabalho mudou: mesmo sendo membro do conselho administrativo da Microsoft-Noruega, ele acompanha seus filhos até a escola todas as manhãs, almoça rapidamente um sanduíche ao meio-dia e sai de seu escritório por volta das 16h30. Os bons hábitos adquiridos durante sua pappapermisjon parecem estar durando. “Se você me perguntasse qual minha participação no trabalho doméstico, eu diria que é certamente mais de 50%, e se perguntar à minha mulher, ela dirá que são 50%!”, ele brinca. “Meu pai e meu avô certamente tiveram uma vida mais fácil! Mas não acho ruim: até os empregos mais empolgantes parecem sem graça perto dos momentos que passo junto com as crianças.”
Quando
Petter Merok pediu uma licença, na ocasião do nascimento de seus filhos, a Microsoft não torceu o nariz: assim como a maior parte das empresas norueguesas, esta acabou se adaptando às novas regras... a ponto de obter, em 2011, o título de “
Great place to work”, sobretudo pela forma como administra as licenças-paternidade. “Hoje, a licença-paternidade está totalmente integrada aos costumes”, afirma
Liv Ragnhild Teig, uma das dirigentes do NHO, o sindicato patronal norueguês. “As empresas não têm o direito de recusá-lo, uma vez que se trata de um direito concedido aos pais. E elas encontram soluções com bastante facilidade: dividem a carga de trabalho extra entre os outros funcionários ou empregam um substituto por alguns meses ou por um ano. No final, não é muito complicado.”
São raras as empresas que agem de má vontade: em 2010, a Ombudsman para Igualdade e Combate às Discriminações, Sunniva Orstavik, recebeu somente dez queixas relacionadas à pappapermisjon. “Foi o caso, por exemplo, de um homem que deixou de ser contratado porque declarou que queria tirar sua licença-paternidade”, explica. “Algumas empresas continuam reticentes, mas em geral elas não entravam os pedidos. De qualquer maneira, elas não podem porque a licença-paternidade é um direito garantido por lei. As mentalidades realmente mudaram: os noruegueses acreditam hoje que é bom, para o bem-estar do bebê, que ele passe tempo com seu papai: um pai próximo de seus filhos durante a infância continuará assim por toda a vida”.
O sistema das licenças parentais custa caro, mas isso pouco importa para a Noruega: graças ao seu petróleo, ela não tem déficit público... Além disso, não é seu custo que preocupa os raros opositores da pappapermisjon: para o partido conservador, é o próprio princípio da cota que causa problemas. “Cada família é única, e cabe a ela, não ao Estado, organizar a vida cotidiana de seus filhos”, afirma
Julie Brodtkorb, uma das dirigentes do partido de direita
Hoyre. “Com a pappapermisjon, a política entra na vida familiar. O sistema é rígido demais: preferimos os incentivos – sobretudo fiscais – do feminismo de direita às obrigações impostas pelo feminismo do Estado. É preciso confiar nas famílias.”
Já o primeiro-ministro trabalhista
Jens Stoltenberg pretende prosseguir no caminho aberto pela lei de 1993: no dia 1º de julho de 2011, a cota reservada aos pais passará de dez para doze semanas, e em 2012 deverá atingir quatorze semanas. O sindicato de esquerda,
LO, mas também o
NHO, querem ir ainda mais longe; eles pedem por uma licença parental dividida em três: um terço para a mãe, um terço para o pai, e um terço à escolha. “É um pouco rígido”, modera o ministro da Infância, da Igualdade e da Coesão Social,
Audun Lysbakken. “Queremos que cada família possa se sentar em torno de uma mesa, conversar e dividir a licença da melhor forma possível. Está acontecendo uma verdadeira transformação cultural: não é necessário dividir em três terços para que os pais passem cada vez mais tempo junto de seus filhos.”
A instauração da pappapermisjon evidentemente não bastou para apagar todas as desigualdades entre homens e mulheres: na Noruega, as diferenças de salário chegam a 15%, sendo que as mulheres representam o grosso da força de trabalho em meio-período e muitas vezes elas permanecem relegadas ao setor público. “Estamos em uma sociedade de igualdade ‘light’”, resume a ombudsman
Sunniva Orstavik.
A cota norueguesa, no entanto, lançou uma pequena revolução que aos poucos se espalha por toda a Europa: a Islândia, a Alemanha e, mais recentemente, Portugal, optaram por reservar parte da licença ao pai. A França poderá um dia enveredar por esse caminho: pelo menos é o que propõe o relatório preparatório da mesa-redonda sobre a igualdade entre homens e mulheres, que deverá ocorrer no dia 28 de junho, presidida pela ministra da Solidariedade e da Coesão Social
Roselyne Bachelot.
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Na Noruega, pai pode ficar com recém-nascido pelos três primeiros meses - Instituto Humanitas Unisinos - IHU