07 Julho 2012
A física Teresa Rodrigo é uma veterana do experimento CMS, um dos que descobriram no Laboratório Europeu de Física de Partículas (Cern) um novo bóson que certamente é o de Higgs. Além disso, desempenha nessa colaboração uma alta responsabilidade: preside o conselho das instituições científicas participantes do CMS (Compact Muon Solenoid). Há 20 anos trabalhava nos EUA no Fermilab e participou plenamente da descoberta da última partícula das famílias do Modelo Padrão, o quark top, e agora no Higgs. Essa pesquisadora da Universidade de Cantábria, de 55 anos, que trabalha no Cern, conta por e-mail como foi o dia depois da descoberta da famosa partícula no laboratório europeu.
A entrevista é de Alicia Rivera, publicada pelo jornal El País e reproduzida pelo Portal Uol, 07-07-2012.
Eis a entrevista.
Que ambiente se respira hoje entre os cientistas do Cern? Como foram os últimos dias de análise de dados?
Tudo parece com um dia normal, mas os rostos sorriem hoje [quinta-feira, 5]. Os últimos dias foram um turbilhão. Já em dezembro parecia que tínhamos indícios, mas até algumas semanas atrás pelo menos no CMS não tínhamos certeza de que o Higgs (ou algo muito semelhante) estivesse ali. E duas semanas não são nada para assimilar uma descoberta dessa magnitude e ter certeza de que todos no CMS entendemos bem o que acontece e estamos convencidos de sua solidez para divulgá-lo.
Normalmente há uma enorme concorrência entre os dois grandes experimentos do LHC, o CMS e o Atlas. Trabalharam em colaboração ou o resultado era secreto também entre vocês?
Era na verdade um segredo. Os rumores foram crescendo, mas todos eram diferentes, quer dizer, muito poucas pessoas (se é que as havia) sabiam realmente dos resultados das duas corporações. Isso é muito bom, porque evita possíveis desvios e exige que você realmente esteja muito segura de seus dados. E sim, há uma enorme competitividade.
Por que foi tão difícil? Tantos anos, tanta gente...
Realmente é difícil de entender que previsões precisem de quase 50 anos para ser confirmadas. Não é como em outros ramos da física, nosso campo é especialmente complicado, e por isso, difícil de explicar. Nossos microscópios são muito potentes e complexos, e só se estivermos capacitados tecnologicamente para construí-los poderemos seguir adiante com nosso programa. Daí que leve tantos anos e tanto talento.
A senhora participou da descoberta do quark top em 1995 e agora da do Higgs. Foi diferente?
Teresa Rodrigo: O processo é muito parecido. É apaixonante, mas a grande diferença é a rapidez com que tudo está ocorrendo no LHC e no CMS. O ritmo é vertiginoso. O que significa para a física, para a compreensão da natureza, encontrar essa partícula de Higgs?
Como explicam meus colegas, essa partícula é muito especial. É o primeiro exemplar que conhecemos e havia muitos céticos sobre sua existência... Pode ser um utensílio muito valioso para entender muito mais do universo.
Por que ainda deixam essa margem de dúvida sobre se é realmente o Higgs do Modelo Padrão?
Porque é preciso estudar e poder confirmar com mais dados suas propriedades. Também nos aconteceu com o quark top. Salvando as diferenças, até que haja estatísticas suficientes para estudar bem todas as suas propriedades, sempre resta a possibilidade de que não se adapte 100% às previsões teóricas.
Como é trabalhar com 3 mil pessoas em uma experiência? Certamente nem se conhecem uns aos outros.
A verdade é que você tem razão, talvez não conheçamos nossas caras em muitos casos, mas pelo menos conhecemos nossas vozes! Muitas reuniões são feitas por vídeo ou audioconferência, mas sempre há um momento em que coincidimos no Cern. Isso é muito útil, porque nos permite participar da vida do experimento em qualquer lugar do mundo. Enfim, no CMS o sol não se põe, mas encontramos um modo de trabalhar juntos efetivamente.
Os físicos jovens, que participam pela primeira vez de um experimento tão importante, influem ou são meros aprendizes dos veteranos?
São os que realmente fazem a maior parte do trabalho e têm toda a nossa confiança. É uma maravilha a intensidade com que estão vivendo tudo. E certamente uma lição e uma experiência que não esquecerão.
Agora começa o trabalho mais emocionante em busca de fenômenos novos? É mais difícil ainda?
Sim, é mais difícil ainda. Mas isto nos animou muito, e temos certeza de que é apenas o começo. Veremos se com os dados deste ano poderemos concluir uma boa parte dos estudos dessa nova partícula. E depois o importante é aumentar a energia do acelerador LHC e abrir novas portas na investigação.
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"Descoberta da partícula de Higgs é apenas o começo", diz física do Cern - Instituto Humanitas Unisinos - IHU