27 Agosto 2013
Imagens chocantes divulgadas nos últimos dias mostram o que ativistas da oposição na Síria dizem ser os resultados de ataques com armas químicas nos arredores de Damasco.
O Exército sírio nega ter usado gás venenoso e diz que as alegações são "falsas e completamente infundadas".
Até o momento, não foi possível verificar as informações de forma independente, mas a BBC reúne abaixo o que se sabe até agora sobre o ocorrido.
A reportagem é publicada pela BBC Brasil, 27-08-2013.
O que aconteceu?
Na tentativa de expulsar forças rebeldes de uma área próxima ao leste da capital Damasco, as forças do governo iniciaram um intenso bombardeio na manhã de 21 de agosto.
Grupos de oposição dizem que, durante esse ataque, foguetes com agentes tóxicos foram lançados em áreas civis na região de Ghouta.
Eles dizem que mais de 300 pessoas morreram, muitas delas mulheres e crianças. Organizações independentes, como os Médicos Sem Fronteiras (MSF), divulgaram números semelhantes. Mas alguns ativistas da oposição dizem que as mortes podem ser ainda mais numerosas.
Segundo os ativistas, foram registradas vítimas nas áreas de Irbin, Duma e Muadhamiya, a oeste, entre outros lugares.
O Exército sírio nega as alegações e diz que elas são uma "tentativa desesperada" dos rebeldes de encobrir suas derrotas na região e parte de uma "propaganda suja de guerra".
O que os vídeos parecem mostrar?
As imagens divulgadas na internet, que não foram verificadas, mostram adultos e crianças aparentemente sofrendo de sequelas de um ataque com armas químicas.
Os médicos aparecem tratando pessoas muito doentes, sem nenhuma lesão externa à vista. Alguns pacientes parecem estar sonolentos ou inconscientes.
Dezenas de corpos, incluindo os de crianças pequenas e bebês, são vistos em fileiras no chão de uma clínica.
Correspondentes dizem que a situação das vítimas do mais recente ataque parece muito pior do que os supostos ataques químicos registrados anteriormente na Síria.
O que os sintomas aparentes sugerem?
Analistas dizem que a ausência de lesões externas podem ser um sinal de agentes químicos.
"Alguns dos sintomas, como a boca aberta e os olhares congelados, são muito semelhantes aos que vimos em Halabja (no Iraque), onde milhares de pessoas foram mortas por agentes que atacam o sistema nervoso", afirma Hamish de Bretton-Gordon, ex-comandante das forças britânicas contra terrorismo químico e biológico.
"Outras imagens no vídeo, como as de pessoas com tremores e com as pupilas diminuídas, mostram características do contato com algum tipo de agente químico."
Especialistas também dizem que um grande número de pacientes parece ter morrido em um curto espaço de tempo, sugerindo o uso de um agente químico.
"Um gás mostarda, que foi usado extensivamente durante a guerra Irã-Iraque, tende a matar pessoas em dias, em vez de horas e minutos. Por isso, um agente que ataca o sistema nervoso poderia muito bem ter sido usado", avalia Bretton-Gordon.
Alexander Kekule, professor do Instituto de Microbiologia Médica da Universidade de Halle, na Alemanha, concorda que um agente químico parece ter sido usado e acrescenta que não havia sinais de agentes que criam bolhas (que teriam causado queimaduras na pele).
Vítimas que sobreviveram também pareciam estar sofrendo de graves dificuldades respiratórias.
Jean Pascal Zanders, analista de armas químicas e biológicas, diz que havia "evidências convincentes de intoxicação por asfixia", devido ao "tom rosado-azulado" dos rostos de alguns dos mortos.
No dia 24 de agosto, o grupo Médicos Sem Fronteiras (MSF) disse que, na manhã de quarta-feira, três hospitais na região de Damasco trataram cerca de 3,6 mil pacientes com "sintomas neurotóxicos" e que 355 morreram.
A organização acrescentou que sintomas como convulsões, pupilas diminuídas e problemas respiratórios sugerem o uso de armas químicas, mas que não podia "confirmar cientificamente" se isso realmente aconteceu.
Que perguntas permanecem?
Especialistas têm expressado ressalvas sobre o que exatamente o vídeo mostra e que armas poderiam ter sido usadas.
"Não estou totalmente convencido, porque as pessoas que estão ajudando estão sem roupas de proteção e sem máscaras", diz Paula Vanninen, diretora do VERIFIN, o Instituto Finlandês de Verificação da Convenção sobre Armas Químicas. "Em um caso real, eles também seriam contaminados e apresentariam sintomas."
Zanders também tem dúvidas. "Não vi ninguém aplicando antídotos para agentes que atacam o sistema nervoso", escreveu em seu blog. "Nem os médicos e as pessoas que estão ajudando parecem sofrer de exposição secundária enquanto tratam das vítimas."
O pesquisador Alexander Kekule diz que os sintomas não se encaixam com o uso de armas químicas típicas, já que as vítimas não parecem estar sofrendo de dor ou irritação dos olhos, nariz e boca.
"No vídeo, alguns pacientes são brevemente descontaminados com água e detergente. A água é derramada sobre o peito, mas (pelo menos no vídeo) não sobre a face e os olhos."
As imagens do vídeo poderiam ser falsas?
O ministro de Informação da Síria, Imran al-Zu'bi, disse ao canal de televisão do Hezbollah, grupo militante muçulmano xiita do Líbano, que "as imagens foram fabricadas e que a campanha foi planejada com antecedência".
Mas analistas estrangeiros disseram à BBC que isso é improvável, devido à escala e aos detalhes das imagens.
Kekule diz que a ideia de que as imagens seriam "uma encenação política" não pode ser totalmente excluída, mas "neste caso, seria uma encenação muito boa".
Segundo Bretton-Gordon, seria também particularmente difícil para os conspiradores fazer várias crianças parecerem mortas durante um longo período de tempo.
A maioria dos especialistas concorda que "algo terrível aconteceu", como escreveu Zanders. Exatamente o que esse "algo" significa, no entanto, pode levar algum tempo para ser descoberto.
Quem seria capaz de tal ataque?
O governo sírio admitiu ter estoques de armas químicas, mas diz que nunca as usaria "dentro da Síria".
O Ministério de Informação sírio disse que ataques, como os relatados na quarta-feira também não seriam possíveis por causa da presença de forças do próprio governo na área supostamente afetada.
A Rússia afirma que há indícios de que o ataque foi obra da oposição. Mas os Estados Unidos e a Grã-Betanha dizem não acreditar que os rebeldes têm acesso a armas químicas.
Por que agora?
Inspetores da ONU chegaram à Síria no dia 18 de agosto para investigar três locais onde armas químicas foram supostamente usadas, incluindo a cidade de Khan al-Assal, no norte do país, onde cerca de 26 pessoas foram mortas em março.
Eles já receberam permissão para visitar os locais ao redor de Damasco, onde ataques com armas químicas teriam ocorrido no dia 21 de agosto.
Correspondentes dizem que é difícil acreditar que o governo sírio, que conseguiu recentemente retomar áreas ocupadas pelos rebeldes, realizaria um ataque com armas químicas enquanto inspetores estão presentes no país.
O Ministério das Relações Exteriores da Rússia disse que o momento dos ataques "nos faz pensar que estamos mais uma vez lidando com uma provocação premeditada" por parte dos rebeldes.
No entanto, um ataque das forças rebeldes em uma área controlada pelos próprios oposicionistas parece improvável para muitos observadores.
Como as reivindicações podem ser verificadas?
Espera-se agora que os inspetores da ONU sejam capazes de determinar conclusivamente se armas químicas foram usadas perto da capital.
O Conselho de Segurança da ONU realizou uma reunião de emergência no dia 21 de agosto. Após o encontro, um porta-voz disse que há "um sentimento geral de que deve haver clareza sobre o que aconteceu".
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O que já se sabe sobre o suposto ataque químico na Síria - Instituto Humanitas Unisinos - IHU