20 Fevereiro 2014
Hoje, na Síria, vemos a moderna tecnologia na forma de armas sendo usados para fomentar os chamados fins políticos inteligentes. Mas não parece ser inteligente ver como mais de 100 mil pessoas são mortas ou como crianças são alvejadas. Parece ser absolutamente estúpido.
A opinião é do físico teórico e cosmólogo britânico Stephen Hawking, autor de Uma Breve História do Tempo e ex-professor de matemática da Universidade de Cambridge. O artigo foi publicado no jornal The Washington Post, 14-02-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O filósofo grego Aristóteles acreditava que o universo sempre existiu. A razão pela qual a humanidade não era mais desenvolvida, acreditava ele, era que as inundações ou outros desastres naturais repetidamente faziam com que a civilização voltasse ao começo.
Hoje, os seres humanos estão se desenvolvendo cada vez mais rápido. Nosso conhecimento está crescendo exponencialmente e, com ele, a nossa tecnologia. Mas os seres humanos têm os instintos e, em particular, os impulsos agressivos que tínhamos nos tempos das cavernas. A agressão teve vantagens concretas para a sobrevivência, mas, quando a tecnologia moderna se encontra com a antiga agressão, toda a raça humana e grande parte do restante da vida na Terra está em risco.
Hoje, na Síria, vemos a moderna tecnologia na forma de bombas, produtos químicos e outras armas sendo usados para fomentar os chamados fins políticos inteligentes.
Mas não parece ser inteligente ver como mais de 100 mil pessoas são mortas ou como crianças são alvejadas. Parece ser absolutamente estúpido, ou pior, evitar que os suprimentos humanitários cheguem às clínicas onde, como a Save the Children irá documentar em um próximo relatório, as crianças estão tendo membros amputados por falta de serviços básicos e recém-nascidos estão morrendo em incubadoras por falta de energia.
O que está acontecendo na Síria é uma abominação, que o mundo está observando friamente à distância. Onde está a nossa inteligência emocional, o nosso senso de justiça coletiva?
Quando eu discuto sobre vida inteligente no universo, eu incluo nela a raça humana, embora muito do seu comportamento ao longo da história parece não ter sido calculado para ajudar a sobrevivência da espécie. E, embora não esteja claro que, ao contrário de agressão, a inteligência tem qualquer valor de sobrevivência a longo prazo, a nossa marca muito humana da inteligência denota uma capacidade de raciocinar e de planejar não só o nosso próprio futuro, mas também o nosso futuro coletivo.
Devemos trabalhar juntos para acabar com essa guerra e para proteger as crianças da Síria. A comunidade internacional assistiu do lado de fora por três anos enquanto esse conflito enraivece, engolindo toda esperança. Como pai e avô, eu vejo o sofrimento das crianças da Síria e agora devo dizer: chega!
Muitas vezes, eu me pergunto como somos vistos por outros seres que assistem do espaço profundo. Ao olharmos para fora no universo, estamos olhando para trás no tempo, porque a luz que sai dos objetos distantes chega até nós muito, muito mais tarde. O que a luz emitida da Terra hoje mostra? Quando as pessoas verem o nosso passado, ficaremos orgulhosos do que elas verão – como nós, como irmãos, tratamos uns aos outros? Como nós permitimos que os nossos irmãos tratem as nossas crianças?
Agora sabemos que Aristóteles estava errado: o universo não existiu sempre. Tudo começou cerca de 14 bilhões de anos atrás. Mas ele estava certo de que grandes desastres representam grandes passos para trás para a civilização. A guerra na Síria pode não representar o fim da humanidade, mas cada injustiça cometida é um lasca na fachada do que nos mantém unidos.
O princípio universal da justiça pode não estar enraizado na física, mas ele não é menos fundamental para a nossa existência. Pois, sem ele, muito em breve, os seres humanos certamente deixarão de existir.
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''A guerra da Síria, sinal da estupidez humana, deve acabar''. Artigo de Stephen Hawking - Instituto Humanitas Unisinos - IHU