12 Agosto 2015
Nos últimos anos Roger Waters dedicou muito do seu tempo para o movimento chamado “Boicote, desinvestimento e sanções” (Bds). Cada artista que pretende se apresentar em Israel recebe dele uma carta de reprovação. Durante a guerra de Gaza, no ano passado, Neil Young acabou cancelado os seus shows – segundo Waters, porém, nenhum artista admite ter trocado sua programação graças a ele. Cindy Lauper, Robbie Williams e Alan Parsons, para citar apenas alguns, ignoraram suas súplicas efetuando shows em Israel. Não existe dúvida, porém que Waters tenha instaurado um clima a nível mundial. Seu envolvimento com Israel nasceu na sequencia de uma apresentação sua ocorrida aqui há nove anos.
A entrevista é de Gideon Levy, publicada no jornal La Repubblica, 09-08-2015. A tradução é de Ivan Pedro Lazzarotto.
Eis a entrevista.
Quando e de que forma iniciou o seu envolvimento político no Oriente Médio?
Haviam solicitado que eu tocasse em Israel, e é exatamente aqui que tudo começou. Na realidade o meu envolvimento nasceu sem que eu percebesse porque em 2006 eu era muito ingênuo. Não pensava. Quando o meu agente firmou o contrato para o meu show em Tel Aviv, eu, com a minha eterna vergonha, resolvia todo o restante. Depois porém, comecei a receber e-mails.
De quem?
Centenas de organizações. Eram acima de tudo organizações do oriente médio, mas havia também os europeus que diziam: "Já ouviu falar dessa nova organização?". A Bds tinha um tom comedido e convincente, então comecei a dialogar com eles.
Diziam para que você não fosse?
Sim. Diziam que se eu fosse teria favorecido a ocupação. Quanto eu era ingênuo! Claro que, nos Estados Unidos a hasbara, ou seja, aquela chamando a diplomacia publica israelense, é extremamente forte. No final cancelei o show e o fizemos em Neve Shalom.
Quem o sugeriu Neve Shalom?
Não me lembro. É uma comunidade agrícola na qual judeus, cristãos e muçulmanos tentam viver juntos. Era e continua a ser um experimento fantástico que seria encorajado de todas as formas possíveis. No final fiz um breve discurso, no qual sugeri que aquela era a maneira na qual os jovens israelenses deveriam querer fazer paz com os próprios vizinhos. O público se silenciou completamente. Na sequencia, refletindo sobre as implicações das restrições sobre as mudanças, me dei conta que era mais improvável que entre os presentes existisse palestinos ou árabes, e me desagrada muito.
Acha que descobriu a verdade sobre o Oriente Médio?
Não sou um profeta, mas fico do lado oposto àquele de quem – ao se achar no direito – lança bombas e mata crianças.
E aqui chegamos na raiz do discurso. Muitos se questionam: porquê Israel, quando muitos outros países fazem o mesmo?
Bem, se está determinado a fazer parte da justiça, dos direitos humanos, das liberdades individuais, da igualdade política e da liberdade de religião, de tempos em tempos acontecem situações que requerem sua atenção mais do que outras. Existe também quem se lamenta pela comparação com a África do Sul e o Apartheid. No caso dos territórios ocupados, a comparação é legítima. Nos anos 70 e 80 nos concentramos todos sobre a África do Sul porque pensávamos que conseguiríamos determinar uma mudança naquela pequena parte do mundo. Hoje aquela pequena parte do mundo é Israel.
Não existe o risco que a Bds se uma com os israelenses tornando-os ainda mais nacionalistas?
Não acredito nisso. Acho que a consciência de poder contar, fora do seu país, com amigos e apoiadores que admirem a coragem dos israelenses que se batem por aquilo que é justo, dará maior força aos israelenses que não estão satisfeitos com a política interna e externa do seu governo. Que alternativa temos? Qualquer um me mostre uma alternativa aos protestos não violentos de quem acredita que a ocupação esteja errada e que os cidadãos palestinos de Israel devam se submeter as mesmas leis dos cidadãos judeus de Israel.
O senhor apoia a solução que prevê um ou dois estados?
Prefiro um único Estado democrático, laico, com direitos iguais para todos, sufrágio universal, igualdade de direitos sobre a propriedade, liberdade absoluta de religião. Sou totalmente contrário a teocracias.
O que fala a quem assume que seja suficiente boicotar o projeto das colônias?
As colônias representam um grande problema porque anexam territórios ocupados. Todavia é sobre o governo de Israel que devem ser executadas as pressões.
Consegue imaginar uma situação na qual você volte a se apresentar em Israel?
Quando vemos que atingimos nosso objetivo, que todos se alegram por direitos iguais e ninguém mata ninguém. Então virei e tocarei todo The Wall.
O que gostaria de falar aos israelenses?
Que em 1945, ou em 1947-1948, vocês tiveram a solidariedade do resto do mundo e, infelizmente, vocês têm desperdiçado esse sentimento de benevolência. Devem encontrar coragem de viver juntos aos seus vizinhos. Olhar a realidade antes de ficarem ligados às imagens de uma falsa realidade requer coragem.
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“Assim decidi boicotar Israel: é o caminho não violento para encontrar a paz” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU