06 Dezembro 2022
Mas com quem o Papa Francisco estava zangado quando, em 24 de novembro, ao se encontrar com os membros da Comissão Teológica Internacional e exortando-os a uma "fidelidade criativa à Tradição", falou do risco de "voltar para trás" que, em sua opinião, se vive atualmente?
A reportagem é publicada por Adista, 01-12-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Presumivelmente, ele estava falando daqueles setores da Igreja Romana que contestam de forma sectária o Concílio Vaticano II, mas talvez não apenas deles, porque também disse: “Penso - para fazer uma referência histórica - em algum movimento nascido no final do Vaticano I, tentando ser fiel à tradição, e assim hoje se desenvolvem de forma a ordenar mulheres, e outras coisas, fora dessa direção vertical, onde cresce, a consciência moral cresce, a consciência da fé cresce”.
A Igreja Cristã Veterocatólica e a Igreja Cristã Veterocatólica Independente, na "suspeita" de serem incluídas entre os "que andam para trás", sentiram-se profundamente atingidas. Assim, em 29 de novembro, emitiram um comunicado – assinado pela bispa veterocatólica Teodora Tosatti e pelo bispo veterocatólico independente Giacomo Motta, com a adesão do bispo da Igreja Protestante Unida Andrea Panerini – na qual “em plena comunhão de fé e sacramentos, expressam sua perplexidade diante das novas declarações do Papa Francisco, que – embora não nomeie explicitamente o veterocatolicismo – faz abertas alusões a ele".
Portanto, é o caso de colocar os pontinhos nos Is. Depois de ter recordado as boas relações anteriores com o Papa Francisco, os signatários intervêm com “esclarecimentos históricos e eclesiológicos que se esperavam adquiridos” mas que, aparentemente, se tornam necessários. Escrevem assim:
“1) O movimento veterocatólico surgiu bem antes do Concílio Vaticano I, e de modo algum pode ser entendido como um 'um passo para trás' ou uma interrupção no desenvolvimento da tradição.
Como todo movimento de retorno às fontes, representa, ao contrário, uma superação de posições esclerosadas e, de fato, antecipou e deu vida a muitas inovações do Concílio Vaticano II, sobretudo no campo eclesiológico (a redescoberta da sinodalidade) e litúrgico: nosso Missal foi estudado por vários padres conciliares e o Missal Católico Romano adotou importantes escolhas, a começar pelo vernáculo.
2) A ordenação feminina é novamente propagandeada como um sinal da perversão da tradição, enquanto que é o fruto da pesquisa exegética no Novo Testamento e nas antigas fontes históricas cristãs; descartá-la com uma piada não é respeitoso nem do diálogo ecumênico nem das Igrejas que a praticam.
Em vez disso, dever-se-ia recordar a resposta da Pontifícia Comissão Bíblica, presidida pelo Prefeito para a Doutrina da Fé, que já em abril de 1976 declarava que as Escrituras não excluem o ministério ordenado feminino, e que o permitir não transgrediria o desígnio de Deus, uma resposta que não foi publicada na Itália (aparentemente por proibição de Paulo VI) e que não foi levada em conta nos documentos posteriores, que se limitaram a reiterar alegremente os velhos clichês.
3) Não está claro a que 'outras coisas' se está aludindo... talvez a algumas de nossas posições no campo ético.
Certamente, considerar-nos fora do desenvolvimento da consciência moral e da fé reflete a atitude – fatal para o ecumenismo – pela qual se deixa de escutar e respeitar as outras Igrejas e de nos fecharmos apoditicamente em nosso próprio sistema doutrinário.
Consequentemente, as nossas Igrejas:
a) Convidam a Igreja de Roma a evitar nos denegrir como expressão de conservadorismo de duvidosas derivas, mesmo que isso realmente tenha a intenção de fazer refletir sobre posições retrógradas dentro dela.
A nosso ver, o Pontífice Romano não parece distinguir entre costume, que se torna imobilismo, e a fidelidade ao patrimônio originário de fé, cuja riqueza exige contínuo aprofundamento e consequente concretização com adesão às exigências da realidade atual.
Os veterocatólicos colocam-se sobre esta última vertente, a da adesão à fé acolhida pela comunidade cristã das origens e do seu aprofundamento contínuo, que deve concretizar-se na acolhida daqueles 'sinais dos tempos' de que tanto fala o Concílio Vaticano II.
b) Reafirmam a atualidade e a validade da sua oposição aos dogmas promulgados pelo Concílio Vaticano I, e a necessidade no plano ecumênico e pastoral de um catolicismo alternativo, não vinculado em posições infalíveis.
c) Reafirmam a vontade comum de constituir uma instância de renovação dentro da expressão católica do cristianismo e a sua disponibilidade para a escuta, o diálogo, a compreensão e o respeito mútuo, para a ajuda fraterna concreta na contínua conversão a Cristo e para a colaboração na evangelização. Almejando um entendimento renovado entre as nossas diversas Igrejas, vos garantimos a nossa oração".
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Veterocatólicos: caro papa, vamos deixar as coisas claras, não somos nós que “voltamos para trás” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU