28 Novembro 2022
"Ele quer minha morte", "não pensei que chegaria a esse ponto": assim falava do Papa Francisco o cardeal Giovanni Angelo Becciu em um chat com amigos e familiares. Os detalhes surgiram com a divulgação de um relatório da Polícia Financeira de Oristano, que investigou os negócios da cooperativa Spes na Sardenha, onde trabalhava um irmão do cardeal, e onde nos últimos anos chegaram vultuosas doações da Secretaria de Estado.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por Repubblica, 26-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Sabia-se que Becciu não estava nada feliz com o Papa. “Até às 18h02 de ontem sentia-me amigo do Papa…” disse na entrevista de 25 de setembro de 2020: na noite anterior, de repente, Francisco o havia despedido. Pouco tempo depois, o cardeal foi indiciado no tribunal do Vaticano pelo caso da compra fraudulenta do prédio da 60 Sloane Avenue, de Londres. Bergoglio, que quer esclarecer toda situação sem olhar na cara de ninguém, também modificou o sistema judicial para permitir que um cardeal fosse a julgamento. E assim Becciu está no banco dos réus. Agora, a acusação mostrou novas evidências. Em uma linha diferente daquela do prédio de Londres, o promotor Alessandro Diddi informou que Becciu está sendo investigado por associação criminosa por uma série de negócios na Sardenha. O Vaticano enviou uma carta rogatória à promotoria de Sassari, que apreendeu telefones celulares e comunicações de familiares do cardeal.
O que resultou foi a gravação que Becciu fez de uma conversa telefônica com o Papa e os chats com parentes e amigos. O Papa - "su mannu", que em dialeto sardo significa o grande, ou "Zizzu", ou seja, Ciccio - é acusado de ter levado Becciu à desgraça. “Ele quer a minha morte”, diz o cardeal. Giovanna Pani, parceira do irmão do cardeal, escreve: “Ele é mau, quer o seu fim”. O cardeal responde: “Ele não quer causar má impressão pela condenação inicial que me aplicou”. E novamente: "Eu nunca teria imaginado não (que) um Papa, mas (que) um homem iria tão longe". A mulher lhe responde: “Ele é um grande velhaco, mas você lute e faça brilhar a verdade, é difícil eu sei, coragem venceremos em tudo”. Por fim: “Há algo podre no Vaticano”.
"Bom Dia! Um bom programa para hoje”, escreve Becciu. E alguém comenta: “Um tiro na cabeça do Papa”. O cardeal responde: “Não consigo”. “Nós fazemos isso”, respondem.
Os magistrados do Vaticano são apelidados de "puzzinosi", ou seja, fedorentos. Apreciações que "embora não pareçam fornecer fontes de prova de fatos constitutivos de um crime", escreve-se em um relatório publicado por Adnkronos, "demonstram a existência de um regime compartilhado de substancial hostilidade nutrida por eles em relação às autoridades judiciárias do Vaticano e ao Pontífice".
Nesse ínterim, monsenhor Alberto Perlasca, uma testemunha-chave da acusação, começou a depor no tribunal.
Entre muitos "não me lembro" e algumas contradições, atribuiu a seus superiores e subordinados a decisão da compra-venda de Londres. "Responda corretamente, corre o risco de ser processado por falso testemunho", intimou o presidente do tribunal, Giuseppe Pignatone. "Nada do que o monsenhor declarou até agora confirma as hipóteses da acusação", comentam os advogados de Becciu. Que não comentam os chats do cardeal.
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"O Papa me quer morto". No chat de Becciu, os insultos a Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU