11 Agosto 2022
A floresta removida pelo desmatamento motivado por eleições é antiga, estabelecida e floresta primária, cujos pequenos remanescentes podem ser cruciais para a conservação da biodiversidade dentro desse bioma.
A reportagem é publicada por EcoDebate, 09-08-2022.
Estudo publicado na revista Conservation Letters mostra que o desmatamento na Mata Atlântica cresce em anos de eleição. Os autores avaliaram 2253 municípios do bioma por meio dos mapas anuais de cobertura e uso da terra do projeto MapBiomas em anos eleitorais e não eleitorais entre 1991 e 2014. Os resultados mostram que o desmatamento cresce tanto em anos de eleições federais e estaduais, como municipais. O trabalho, inscrito na 4a Edição do Prêmio MapBiomas por uma das autoras, Patricia Ruggiero, da FEA/USP, foi um dos vencedores na categoria Geral.
O estudo constatou que em anos de eleições federais e estaduais, o aumento no desmatamento ocorre em municípios que sofrem maior pressão por desmatamento. Já os municípios com menor pressão de desmatamento, os anos de eleições federais e estaduais têm pouco ou nenhum efeito: o aumento se dá em anos de eleições municipais. Para os municípios onde a pressão por desmatamento é intermediária, qualquer ano eleitoral, seja para cargos federais e estaduais como municipais, afetam as taxas de desmatamento. Os dados sugerem ainda que a floresta removida pelo desmatamento motivado por eleições é antiga, estabelecida e floresta primária, cujos pequenos remanescentes podem ser cruciais para a conservação da biodiversidade dentro desse bioma extremamente ameaçado.
Comparado a anos não eleitorais, um ano de eleições apresenta uma área desmatada adicional de 3.652 ha em média, no caso de pleitos federais e estaduais. Quando a corrida é por cargos municipais, a média de área desmatada adicional é de 4.409 ha. Embora a magnitude deste impacto do ciclo eleitoral (por volta de 4.000 ha) seja pequena quando comparada com a perda média por ano (que é de 136.000 ha), esta perda de floresta é suficiente para causar danos reais, pois pode anular os ganhos das políticas de conservação.
Os autores citam como exemplo programas de pagamento por serviços ecossistêmicos, que empregam vários gerentes e técnicos para engajar proprietários de terra a mudar suas decisões em relação à conservação. Esses pagamentos em dois dos municípios da região da Mata Atlântica contribuíram com 3,74 ha/ano/município após 5 anos de dedicação. Ou seja, ao longo de cinco anos, esses ganhos podem ser cancelados por um ciclo eleitoral municipal e um federal e estadual.
O estudo também descobriu que o aumento das taxas de desmatamento é maior durante os anos de eleições federais e estaduais para os casos em que há alinhamento estadual-federal, isto é, quando o partido do governador pertence à coligação presidencial em exercício. Em menor escala, o aumento do desmatamento vinculado a eleições é maior em municípios com menor pressão de desmatamento quando o prefeito e o governador pertencem ao mesmo partido. Quando há vínculo entre prefeito e governador em anos de eleições federais e estaduais, bem como municipais, o alinhamento também eleva o desmatamento.
Uma relação entre eleições municipais e desmatamento já havia sido demonstrada para a região amazônica em estudo publicado no Journal of Environmental Economics and Management. O trabalho mostrou que o desmatamento aumentou de 8% a 10% nos anos de eleições municipais quando os prefeitos em exercício concorreram à reeleição e que o desmatamento aumentou significativamente, até 40%–60%, para casos em que o titular em exercício teve seu mandato associado a irregularidades fiscais significativas documentadas por auditorias.
Os autores acreditam que tais ciclos políticos de desmatamento podem ser reduzidos por meio do monitoramento em tempo real das florestas e da disponibilização ampla de dados aos eleitores durante as campanhas eleitorais.
A Mata Atlântica apresenta uma ocupação humana densa, que modificou radicalmente o ambiente natural desde a colonização, deixando a cobertura florestal abaixo de 26%, segundo dados da SOS Mata Atlântica, e com limitada expansão agrícola em andamento. A região também possui algumas das legislações florestais mais abrangentes do mundo e as instituições estatais têm recursos financeiros e técnicos para implementar e fazer cumprir políticas e legislação ambiental, bem como gerenciar áreas protegidas em nível estadual.
Os autores advertem que o Brasil está passando por uma degradação de suas políticas e instituições ambientais e sociais incluindo todo o rebaixamento, downsizing e desclassificação de áreas protegidas, redução dos requisitos de licença ambiental, desmantelamento da fiscalização e sinalizando aos atores do setor público e privado que desmatamento é permitido. Com mudanças políticas e instabilidade, o Brasil pode estar voltando para a situação em que os ciclos de desmatamento político gerarão grandes números de perda de florestas tropicais.
Mata Atlântica – Bioma / Estados / Municípios, in Election cycles affect deforestation within Brazil’s Atlantic Forest, disponível aqui.
(Foto: EcoDebate)
Sobre MapBiomas: iniciativa multi-institucional, que envolve universidades, ONGs e empresas de tecnologia, focada em monitorar as transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil, para buscar a conservação e o manejo sustentável dos recursos naturais, como forma de combate às mudanças climáticas.
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Mata Atlântica é mais desmatada em anos eleitorais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU