“Bolsonaro fez uma guerra contra os indígenas”, diz Marina Silva

Marina Silva no Acampamento Terra Livre (Foto: Amazônia.org)

07 Abril 2022

 

Enquanto sete mil indígenas ocupam o espaço próximo à Funarte em Brasília na tentativa de chamar a atenção para suas demandas, o Congresso Nacional, a três quilômetros dali, pode reduzir os seus direitos aprovando Projetos de Leis que estão para serem votados. Entre eles, o PL 191, que pode aprovar a mineração em territórios indígenas.

 

O assunto tem mobilizado não só os indígenas. Personalidades políticas e artísticas costumam visitar o acampamento para demonstrar apoio. E nesta terça-feira (5), a ex-ministra esteve presente no acampamento para a divulgação de uma carta aberta contra o PL. Marina é experiente na temática ambiental, nascida em Rio Branco, no estado Acre, é historiadora, professora, psicopedagoga, ambientalista, ex-ministra do Meio Ambiente e hoje política brasileira pelo partido Rede.

 

Quando ministra, os índices de desmatamento da Amazônia caíram 83%. Hoje, o índice tem batido recordes a cada nova divulgação. Quando questionada se era possível retomarmos os que perdemos na área ambiental, Marina foi direta: “É muito difícil fazer a reconstrução de tudo o que foi destruído é quase que uma reconstrução pós-guerra. O Bolsonaro fez uma guerra contra os indígenas, contra o meio ambiente, contra os direitos humanos, contra a saúde pública, é um processo de destruição generalizada”.

 

Ainda assim, parece disposta a lutar. Marina aproveitou a ocasião para citar a juventude indígena e também lembrar que em ano de eleições as lideranças jovens indígenas estão lançando suas candidaturas. “Eu conheci o Chico Mendes aos 17 anos, entrei nessa luta e estamos aqui até hoje aos 74 anos. E isso é um combustível, ver tantas lideranças jovens assumindo a luta”.

 

 

Marina conversou com o site Amazônia.org.br sobre o acampamento e meio ambiente.

 

A entrevista é de Anna Francischini e Aldrey Riechel, publicada por Amazônia.org.br, 06-04-2022.

 

Eis a entrevista.

 

Qual a importância de estar presente em um evento como este?

 

É um momento histórico da luta dos povos indígenas onde eles fazem a grande concentração de esforços e de forças para combater os grandes ataques que são feitos à eles do ponto de vista social, cultural, de saúde pública e, principalmente, do ponto de vista legal das mudanças que estão sendo proposta já há muito tempo, mas agora muito mais agravadas contra os seus direitos, como é o caso de liberar a mineração de Terras Indígenas e uma lei que vai regulamentar áreas que foram ocupadas ilegalmente, que são áreas que a gente aqui chama de áreas griladas, geralmente é invasão em terra pública, unidades de conservação e terras indígenas. O acampamento Terra Livre é a luta, a resistência social, cultural territorial e política dos povos indígenas.

 

Divulgação da Carta contra o PL 191. Acampamento Terra Indígena. (Foto: Aldrey Riechel/Amazônia.org.br)

 

E sobre o projeto de mineração, tem alguma perspectiva? Acha que vai caminhar?

 

Há uma grande mobilização da sociedade para que não caminhe, mas o presidente da Câmara dos Deputados, que é do Centrão, hoje manda mais no governo do que o próprio [Jair] Bolsonaro. Ele em um ato de afronta, no dia em que os artistas estiveram aqui fazendo uma grande manifestação contra os retrocessos ambientais, aprovou o pedido de urgência para esses projetos, inclusive esse da mineração.

E agora um grande receio que se tem é que, como um ato de provocação e afronta, ele coloque em votação no plenário durante o acampamento Terra Livre, porque esse governo trabalha o tempo inteiro incentivando o desrespeito à Constituição, o desrespeito à legislação, e principalmente, o desrespeito à diversidade cultural.

 

Esse ano de eleições, muitas pessoas estão lançando candidaturas, você talvez em São Paulo…

 

Ainda não decidi. Estou avaliando.

 

Acha que vamos ter mais representatividade?

 

Eu espero que a gente possa eleger uma boa bancada indígena, a Joênia (Wapichana) está fazendo um excelente trabalho e isso tem servido de referência e de muito incentivo. Então nós já temos no Estado do Amazonas, essa linda jovem indígena, a Vanda Witoto, temos a Maial Kayapó, lá no Estado do Pará. Nós precisamos eleger a Joênia e temos várias candidaturas no país inteiro e com a ajuda do povo brasileiro e principalmente do povo indígena de cada estado, queremos ampliar a bancada indígena no Congresso Nacional.

 

E então você acha que dessa forma finalmente vamos ter um ano bom para o meio ambiente?

 

É muito difícil fazer a reconstrução de tudo o que foi destruído é quase que uma reconstrução pós-guerra. O Bolsonaro fez uma guerra contra os indígenas, contra o meio ambiente, contra os direitos humanos, contra a saúde pública, é um processo de destruição generalizada. Agora, obviamente que se tivermos um debate na sociedade que deixe claramente o que está sendo apoiado para ganhar a eleição e quais são os compromissos para ganhar a eleição, aí se sairá legitimado para fazer as mudanças. O que não pode é ser apenas uma guerra despolitizada como se fosse contra o bem e o mal. Porque aí as propostas não aparecem. E se as propostas não aparecem, elas não se legitimam na sociedade.

 

A minha insistência é: mais do que as pessoas ficarem ansiosas para ouvir apoios, a melhor forma de receber apoios é dizendo claramente para a sociedade o que se está apoiando e o que não se está apoiando. Nesse momento é fundamental dizer que não vai mais ter projeto como Belo Monte, porque já tem um projeto lá para o Tapajós. E aquilo vai ser pior ainda do que Belo Monte. É preciso que se deixe muito claro, de certa forma como fez o Biden, quais são as questões que são essenciais para que a sociedade brasileira dê vitória a quem sai respaldado para poder implementar essas mudanças.

 

O Biden, mesmo a questão climática sendo quase um tabu na realidade americana, falou claramente “eu vou voltar ao Acordo de Paris”. Tem algumas questões que são um ato de legítima defesa. O direito dos povos indígenas tem que ficar muito claro, de que essa questão é algo inegociável. É um inegociável político, um inegociável ético, um inegociável cultural, um inegociável humanitário.

 

Sobre o ATL

 

O Acampamento Terra Livre teve início nesta segunda-feira (04) e vai acontecer até o dia 14. Confira a agenda oficial da mobilização no site da APIB (disponível aqui) e acompanhe também os principais destaques do ATL por aqui.

 

 

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