31 Março 2022
Num dramático testemunho dado em uma conferência online em conexão com o Pontifício Instituto Oriental, Sua Beatitude Sviatoslav Shevchuk, Chefe e Padre da Igreja Greco-Católica Ucraniana, explicou as condições em que seu povo vive após 34 dias de guerra, falou sobre o empenho de sua Igreja no local, destacou o heroísmo do povo ucraniano, que está resistindo a uma guerra que agora se tornou uma guerra de aniquilação.
A reportagem é publicada por Igreja Greco-Católica Ucraniana, Secretariado do Arcebispo Maior, Roma, 30-03-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
"A força do povo ucraniano está provando ser um milagre que surpreende o mundo", disse Sua Beatitude. E isso apesar do fato de que apenas um milhão de pessoas permaneceram em Kiev, disse ele, enquanto dois terços deixaram a cidade. O chefe da Igreja Greco-Católica Ucraniana também lamentou a situação na cidade de Kharkiv, "a apenas 40 quilômetros da fronteira com a Rússia", que "tornou-se uma cidade fantasma, mas ainda resiste aos russos"; de Mariupol, cidade que "foi o motor econômico da Ucrânia", onde voltaram a ser vistas as "valas comuns"; de Chernihiv, completamente arrasada; de Slavutych, agora cercada, onde resiste um pároco greco-católico, que viu sua esposa dar à luz seu terceiro filho em meio a um terrível cerco.
“A criança nasceu em um hospital sem luz, sem água - disse Sua Beatitude - não tenho notícias deles há três dias. Quando a guerra começou, sabendo que o bebê estava para nascer, tentei interceder para colocar a salvo o meu pároco e sua família. Ele me disse: o senhor é o meu bispo e eu recebi o mandato do senhor para cuidar dessas pessoas. Eu não posso ir embora".
Sua Beatitude Sviatoslav, no entanto, também denuncia situações pouco conhecidas do mundo ocidental, como as deportações que estão ocorrendo na região de Donbass. A libertação do Donbass - disse o chefe da Igreja Greco-Católica Ucraniana - “foi declarada a principal razão da agressão da Rússia contra a Ucrânia. Naquela região, houve deportações forçadas de pessoas, deslocadas das aldeias em que sempre viveram para o território controlado pela Rússia. A Caritas Ucrânia contou 40.000 deportados. No território controlado, o passaporte é retirado e eles são exilados na Rússia. Muitos recebem um documento provisório que os obriga a trabalhar na Ilha Sakhalin, no Oceano Pacífico, na fronteira com o Japão, sem a possibilidade de deixar o território por dois anos. Isso nos lembra as deportações de Stalin para a Sibéria”.
O Arcebispo-Mor da Igreja Greco-Católica Ucraniana também lembrou como o ataque russo a Kiev em 24 de fevereiro despertou a cidade em estado de choque, e que ele "nunca teria imaginado ser chefe de uma Igreja em guerra". Tampouco, acrescentou, teria pensado que os porões da catedral se tornariam um refúgio para tantas pessoas, que ficaram presas na margem esquerda do rio Dnipro e impossibilitadas de voltar para casa porque todas as pontes estavam bloqueadas.
“Recebemos mais de 500 pessoas, de mãos vazias, de repente”, explicou Sua Beatitude Sviatoslav Shevchuk. Ele também denunciou como o ataque foi bem planejado e como espiões russos estavam infiltrados em todos os lugares, até no coro de sua catedral, visando os líderes religiosos e as próprias igrejas, que se tornaram o principal alvo do ataque.
"Como Igreja, nossa primeira preocupação foi ficar perto das pessoas", explicou, "e dividimos a Ucrânia em três zonas: as de combate, as de proximidade e aquelas ocidentais, onde os refugiados encontram um lugar temporário, na espera de voltar para casa ou ir para outro destino".
Sua Beatitude descreveu uma guerra cruel, onde soldados russos enriquecem para permitir que as pessoas fujam (até 1.200 dólares são pagos por um transporte para fora da zona de conflito) e onde os ataques se sucedem impiedosamente: 1.300 mísseis foram lançados sobre a Ucrânia em pouco mais de um mês de guerra (na Síria, apenas 30 foram lançados em 11 anos), enquanto 200.000 soldados russos entraram em território ucraniano.
Andriy Yurash, embaixador da Ucrânia junto à Santa Sé, reconheceu o grande trabalho da Igreja Greco-Católica Ucraniana no território em um discurso anterior ao de Sua Beatitude.
“As Igrejas", disse, "estão ajudando em quatro aspectos: realizam uma grande missão humanitária; fazem um trabalho concreto para as pessoas em diferentes níveis; servem como capelães militares; e depois, o importante papel dado pelas mensagens diárias enviadas por Sua Beatitude”.
Abrindo o evento, o cardeal Leonardo Sandri, prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais, destacou que "o que deviam ser anos para olhar para o futuro, nas últimas semanas se transformou em um triste retorno ao passado, não apenas para a Igreja greco-católica craniana, mas de todo o mundo que parece não ter aprendido o erro criado pela devastação das guerras”.
O cardeal Michael Czerny, prefeito interino do Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral e enviado especial do Papa à Hungria e à Eslováquia para supervisionar a situação dos refugiados, destacou o trabalho de todos os que prestam ajuda. “Nós os chamamos de anjos, eles geralmente permanecem anônimos. As famílias dos sacerdotes, como muitos religiosos e voluntários, oferecem cuidado e acolhimento e são certamente anjos heroicos”. O Cardeal também destacou a grande colaboração entre as religiões precisamente no apoio e acolhimento daqueles que são obrigados a deixar suas casas.
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“A força do povo ucraniano é um milagre que surpreende o mundo”, constata Sviatoslav Shevchuk, bispo católico - Instituto Humanitas Unisinos - IHU