30 Outubro 2020
O agravamento da curva de contágio levou o governo a reforçar medidas restritivas, com uma recomendação de adoção do smart working nos setores público e privado, quando possível. Apesar das dificuldades que muitas empresas tiveram (e continuam a ter) para se habituarem ao trabalho à distância, trata-se de uma modalidade organizacional e operacional que poderia continuar mesmo após a pandemia, com implicações econômicas e sociais para as cidades. Os indiscutíveis benefícios da revolução tecnológica, no entanto, têm efeitos colaterais, também causados por uma inadequada tutela do direito da desconexão do funcionário: “O smart working foi criado para permitir o desenvolvimento da atividade de trabalho fora das instalações da empresa e decidir em plena autonomia os tempo e os locais de trabalho, com vista a um melhor equilíbrio da relação entre a vida privada e profissional”, explica ao Business Insider Itália o advogado Massimo Riva da firma Rödl & Partner. Ele continua: “Infelizmente, porém, essas prerrogativas muitas vezes são apenas uma ilusão e em muitos casos se tende a trabalhar mais do que quando se está na empresa”.
A reportagem é de Marco Cimminella, publicada por Business Insider, 29-10-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Mas obrigar o funcionário a uma conexão ininterrupta, o "always on", ou o controle remoto de seu desempenho, comportam enormes riscos para os responsáveis pelas empresas. “No primeiro caso, de fato, perfila-se um problema de technostress, com implicações ao plano da tutela e segurança do pessoal. No segundo, a falta de autorização prevista no Estatuto dos Trabalhadores também poderia acarretar sanções de tipo penal”, explica o especialista.
O último Decreto de 24 de outubro de 2020, contendo as novas medidas para enfrentar a emergência epidemiológica do Covid-19, destaca a importância do smart working nos artigos 1 e 3: não apenas recomenda a utilização da modalidade de trabalho ágil no setor privado, mas convida a sua maior utilização também nas administrações públicas. “Pode ser ativado com o procedimento simplificado em derrogação da lei nº 81/2017 e consequentemente sem a necessidade de acordo entre as partes”, diz o advogado Riva, lembrando que “no que diz respeito ao direito de desconexão, a lei 22 maio de 2017, n. 81 é vaga, genérica, porque mesmo que o preveja, não define com clareza as modalidades para sua garantia”.
Por esse motivo, as soluções entre os empregadores têm sido bastante diferentes e muito disparatadas. Resumindo, “a norma prevê que as medidas sejam de dois tipos: técnicas e organizacionais”, continua Riva. As primeiras referem-se ao plano de TI. “Por exemplo, a empresa deveria prever o desligamento de servidores em determinadas faixas horárias, permitindo a necessária interrupção da conexão com as ferramentas de TI”: uma operação que nem sempre é viável e poderia gerar problemas de tipo tecnológico. As demais, por outro lado, afetam a organização do trabalho: “Algumas empresas estabeleceram faixas de disponibilidade para os funcionários nos acordos individuais firmados. Mas esses são poucos casos. A autorregulação é mais comum, ou seja, o empregado deve fazer valer o próprio direito e se desconectar automaticamente após o término do expediente normal”.
Mas nem sempre é fácil fazer valer os próprios direitos recusando-se a responder e-mails, mensagens de texto ou ligações que chegam à noite ou nos finais de semana. “Se o empregador faz pressões e ações de persuasão moral forçando o funcionário a religar os equipamentos e voltar à sua mesa, poderia ter problemas do ponto de vista de proteção e segurança do pessoal. O risco de technostress, causado pelo uso excessivo e incorreto de tecnologias digitais e equipamentos de informática por motivos de trabalho, foi reconhecido há algum tempo por uma sentença do tribunal de Turim - lembra o advogado Riva. O responsável da empresa foi condenado a uma indenização por danos, pois o desligamento dos equipamentos não havia sido garantido”. Sentença que até o momento não foi acompanhada de novas decisões, tendo em vista que outros casos desse tipo não foram apresentados à Justiça do Trabalho: “Mas não excluímos que casos similares possam ocorrer nos próximos anos”, acrescenta o especialista.
Além disso, o empregador corre o risco de incidir em uma sanção penal quando controla à distância o trabalho dos funcionários com ferramentas informáticas e software sem ter previamente obtido a autorização exigida pelos Estatutos. De fato, pode acontecer que alguns responsáveis tenham introduzido ferramentas que, entre as suas funções, também permitam a verificação à distância do desempenho do trabalho ou o controle dos horários de conexão às ferramentas da empresa.
Originalmente, o artigo 4 do Estatuto dos Trabalhadores proibia o uso de sistemas de áudio e vídeo e de outro tipo para controlar à distância a atividade do trabalhador. Posteriormente, o Job Act do governo Renzi, que modificou o texto da norma, definiu exceções a essa regra geral, estabelecendo que tais ferramentas, “das quais também deriva a possibilidade de controle à distância”, possam ser empregadas exclusivamente para necessidades organizacionais e produtivas, para a segurança do trabalho e para a tutela do patrimônio da empresa.
“A lei prevê que, caso essas três exceções ocorram, o controle com essas ferramentas possa ser viável, mas é preciso obter uma autorização, que resulta de um acordo com os representantes sindicais da categoria e da empresa. Na falta disso, é a superintendência do trabalho que dita as modalidades para a utilização dos sistemas”, esclarece o advogado Riva, lembrando ainda que “é preciso informar os funcionários de acordo com a legislação europeia sobre a privacidade”. Caso se decidisse continuar sem ter obtido a necessária autorização, aplicar-se-ia o artigo 38º do estatuto, que prevê sanções penais e até reclusão de um ano, informa o especialista, sublinhando que esses princípios são válidos tanto no setor privado como no público.
E houve casos em que o empregador não respeitou as regras antes de implementar o controle do trabalho do empregado. Em março de 2018, o garante de privacidade, em um dispositivo relativo ao tratamento de dados pessoais dos funcionários de um call center, declarou ilegal a conduta da Sky Italia por “ter adotado ferramentas que permitiam acompanhar o desempenho do pessoal, verificando quantas ligações haviam sido feitas, quanto tempo duraram e com quem”, lembra o advogado Massimo Riva.
O mesmo Job Act, no entanto, introduziu outra especificação, especificando que tal autorização não é exigida no caso de ferramentas indispensáveis à realização do trabalho executado, ou seja, "aquelas que são absolutamente necessárias ao desempenho da atividade profissional, tais como, no exemplo de trabalho de escritório, Microsoft Word e Outlook, ou software para o registro dos dados de clientes”, conclui o especialista.
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Smart working, funcionários sempre conectados e controlados a distância: aqui está o risco do empregador - Instituto Humanitas Unisinos - IHU