10 Janeiro 2019
Por uma década foi o “microfone” do Papa. Ou melhor, de dois. Diretor da Sala de Imprensa do Vaticano de 2006 até 2013 sob o pontificado de Bento XVI, e de 2013 a 2016 com Francisco ao leme da barca de Pedro, o padre Federico Lombardi, 76 anos de idade, fez seu trabalho com elegância, equilíbrio e sem protagonismos, apesar do legado de um sobrenome importante no panorama eclesial. Nascido em Saluzzo, Cuneo, além de um avô senador, teve como tios o jurista Gabrio Lombardi, líder inquestionável na década de 1970 do Comitê para o referendo contra a lei sobre o divórcio, e Riccardo Lombardi, um incansável pregador da Companhia de Jesus.
A entrevista é de Giovanni Panettieri, publicada por Quotidiano.net, 06-01-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Mas vamos falar sobre o senhor, padre. Como foi trabalhar lado a lado com dois Pontífices?
Eu me lembro de uma bela década de serviço, vivida na perspectiva da mediação. Por um lado, eu tentei ajudar colegas jornalistas a compreender os atos e os eventos da Santa Sé, e por outro lado, não deixou de submeter às autoridades do Vaticano observações e problemas não resolvidos levantadas pela opinião pública.
Com um papa comunicativo como Bergoglio, é fácil imaginar que o senhor tenha trabalhado muitas horas extras.
No início na Sala de imprensa, tivemos que entender e nos adaptar ao novo estilo. A rapidez e a capacidade de entrar imediatamente em sintonia com as pessoas, duas características-chave de Francisco, também me surpreenderam positivamente, não apenas a vocês, jornalistas.
Horas extras à parte, deve ter sido mais complexa a temporada com Bento XVI, que precisou lidar com uma grande parte da imprensa hostil ao seu pontificado, em luta com o relativismo e o trato teológico mais que pastoral?
Isso é verdade, o papado de Ratzinger foi enquadrado desde o início sob premissas erradas. Pensava-se que Bento XVI fosse um censor, pois havia sido prefeito do antigo Santo Ofício. Claro, ele sempre considerou os tempos atuais como a época de esquecimento de Deus, destacando, entre outras coisas, os riscos do subjetivismo, no entanto, nunca evitou o diálogo, sem timidez, com a cultura moderna.
Um papa gentil e capaz de ouvir?
Nele sempre encontrei um desejo autêntico de entender as razões do outro, mesmo quando o interlocutor não possui títulos específicos.
Alguma vez manifestou algum sofrimento com as críticas que estava recebendo?
Estamos falando de uma pessoa corajosa em suas ideias. Isso não significa que ele não tenha vivido momentos de profunda discussão interior ou que não tenha sofrido com algumas críticas recebidas, especialmente se provenientes da Alemanha. Em particular, lembro-me em 2009 do momento da crise após a revogação da excomunhão aos bispos lefebvrianos, entre os quais o negacionista Richard Williamson.
Naquela ocasião, Ratzinger foi acusado de lesar a sensibilidade dos judeus.
Sim, e ele ficou muito indignado, reivindicando que em toda sua vida sempre havia dado prova cristalina de seu compromisso em favor do diálogo e da compreensão recíproca com o povo judeu. Ele desconhecia as teses de Williamson.
Este caso e o caso Vatileaks afetaram sua decisão de renunciar?
Sim e não. Preocupações semelhantes, combinadas com os esforços de viajar pelo mundo e escrever documentos, contribuíram para o colapso de suas forças, verdadeira e única razão para o passo atrás. Nego, no entanto, que tenha renunciado em decorrência dos escândalos.
O senhor havia sido avisado da sua renúncia?
Eu tinha sido informado pouco tempo antes, de maneira muito reservada. E eu não fiquei muito surpreso.
Realmente?
Em 2010, no livro Luz do mundo, Bento XVI havia falado sobre a possibilidade e, se necessário, até mesmo o dever de um pontífice renunciar caso percebesse que não tinha mais a energia necessária para desempenhar um ministério tão exigente.
Como presidente da Ratzinger Foundation, certamente terá a oportunidade de se encontrar com ele. Quando o senhor o viu pela última vez e como parecia?
Nós nos encontramos um mês atrás. Conserva uma memória surpreendente para um homem de 91 anos, mas é claro que a velhice progride e as forças físicas diminuem. A voz é menos trovejante e, para evitar quedas nos movimentos, usa uma cadeira de rodas, mas o que é importante é sua presença mental e espiritual, que está perfeita.
Bento XVI entrará na história por sua renúncia?
Dada a excepcionalidade do gesto, é quase inevitável que isso aconteça. Dito isto, considero que o legado de Bento XVI seja muito mais amplo. Penso à sua preocupação por uma sociedade ocidental que multiplica os direitos humanos até que eles entrem em contradição, como no caso do direito à vida e de um suposto direito ao aborto. Resta a ser redescoberta também a sua obra teológica sobre Jesus.
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As memórias do padre Lombardi. "Eu, voz de dois Papas durante dez anos" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU