28 Mai 2018
Em 20 de abril, o general da reserva Franklimberg Ribeiro reuniu um grupo de servidores da Funai (Fundação Nacional do Índio) em uma sala fechada à imprensa para se despedir do órgão que ele presidiu por 11 meses.
A reportagem é de Rubens Valente, publicada por Folha de S. Paulo, 27-05-2018.
Ele desabafou: "Tem muitas outras coisas que nós poderíamos dar, mas que também não é culpa de vocês, tá certo? A Funai, todos aqui sabem, tem um orçamento de R$ 100 milhões/ano, não atende em quase nada as demandas das nossas populações indígenas".
Revelou que prestou contas ao comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas. "Expliquei para ele o que é a Funai. E ele entendeu muito bem. Que o problema não é a Funai. O problema são os vetores que atuam sobre a Funai. Alguns vetores descompromissados com a base. Alguns vetores que não sabem o que acontece lá na ponta da linha."
Frases nessa linha não foram repetidas em público por Franklimberg. O primeiro militar a presidir o órgão desde 1991 caiu sem dar nomes aos "vetores".
Um ano antes, seu antecessor na presidência, o técnico em saúde indígena Antônio Costa, que durou apenas quatro meses no cargo, fez diferente: deu entrevista coletiva na frente do órgão, quando foi direto sobre a sua queda: "ingerências políticas" do líder do governo na Câmara, André Moura (PSC). Costa disse que se recusou a nomear alguns indicados pelo partido.
Quando chegou à Funai também pelas mãos do conservador PSC, Franklimberg foi visto como alguém capaz de apaziguar os ânimos entre o partido, a bancada ruralista, indigenistas e antropólogos. Deu tudo errado.
Segundo servidores ouvidos pela Folha, Franklimberg também não cedeu a pressões para nomeações no órgão, o que levou o PSC a abandonar o apoio que vinha lhe dando.
A saída do general foi o movimento visível de uma divisão profunda no seio da Funai.
O órgão foi cindido ao meio por interesses políticos no governo, fato inédito na sua história recente. A presidência e a DPDS (Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável) são hoje ocupadas por indicados do PSC, enquanto a Dages (Diretoria de Administração e Gestão) e a DPT (Diretoria de Proteção Territorial) são comandadas pela bancada ruralista.
Os interesses muitas vezes conflitantes entre as duas alas estão na raiz da troca frequente dos presidentes.
Estão subordinadas à DPT duas das atividades mais sensíveis do órgão, a demarcação de terras e a proteção a grupos isolados. As demarcações despencaram no governo Temer, com apenas três decretos.
Os objetivos ocultos da pressão dos parlamentares são ocupar mais cargos estratégicos na Funai, forçar o órgão a trabalhar pela legalização do arrendamento de terras indígenas (foco de interesse de produtores rurais, em especial sojicultores do Centro-Oeste) e pressionar por autorização do órgão para a construção de uma linha de transmissão de energia que cortará 123 km dentro da terra indígena waimiri-atroari, entre Amazonas e Roraima.
Em nota, a bancada ruralista, que diz ter 252 parlamentares, confirmou que solicitou ao Planalto a demissão de Franklimberg, após ter recebido uma carta assinada por "mais de 170 lideranças indígenas" contra o general.
As brigas encontram a Funai cada vez mais esvaziada. Há 2.037 servidores no quadro permanente, contra 2.531 em 2012, redução de quase 20%.
"Informo que estamos fechando as portas da CTL [coordenadoria] Eirunepé ao atendimento do público por absoluta falta de condições de trabalho. [...] Até os atendimentos sociais de indígenas que se encontravam em situação de vulnerabilidade social, necessitando de alimentação, também vêm sendo custeados com recursos pessoais há mais de 5 meses, por uma questão puramente humanitária, dada a gravidade das situações", relatou Arquimimo Silva, coordenador técnico da Funai em Eirunepé (AM), em ofício enviado a Brasília no último dia 14.
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Sigla conservadora e bancada ruralista loteiam a Funai - Instituto Humanitas Unisinos - IHU