05 Março 2018
Com a criação obrigatória da festa de Maria, Mãe da Igreja no calendário litúrgico romano para a segunda-feira após a Pentecostes, estabelecida pelo Papa Francisco com um decreto divulgado no sábado, 3 de março de 2018, concretiza-se um percurso iniciado há 54 anos. Era 21 de novembro, quando Paulo VI no discurso de encerramento da terceira sessão do Concílio, durante a sessão de promulgação da Constituição Lumen gentium dedicada à Igreja e aos decretos sobre o ecumenismo e as Igrejas orientais, proclamava diante de mais de dois mil bispos reunidos em São Pedro, Maria como "Mãe da Igreja".
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada por Vatican Insider, 03-03-2018.
Várias vezes, nos anos de 1959 e 1960, João XXIII tinha chamado dessa maneira Nossa Senhora e Paulo VI, no final da segunda sessão dos trabalhos conciliares expressou a esperança de que se chegaria a tal proclamação. Em sessões anteriores do Vaticano II havia sido discutido se promulgar em separado um esquema dedicado à Nossa Senhora ou incluí-lo em um capítulo mariológico no esquema "De Ecclesia”. Havia prevalecido a posição dos bispos alemães e austríacos, que pediram ao teólogo Karl Rahner para preparar um estudo sobre o assunto.
De acordo com Rahner, o texto da Comissão Preparatória, intitulado "Sobre a Santíssima Virgem Maria, Mãe da Igreja", representava "fonte de grande preocupação" e "teria resultado em um dano inimaginável, do ponto de vista ecumênico, tanto no que dizia respeito aos orientais, tanto no que se referia aos protestantes”. O esquema havia assim sido reduzido para torná-lo um capítulo da Constituição sobre a Igreja, mas a proposta fora aprovada por apenas 17 votos (1.114 em favor, 1.097 contra): no título do capítulo haviam, portanto, desaparecido as palavras "Mãe da Igreja”.
Em 4 de setembro de 1964 o cardeal Stefan Wyszynski, primaz da Polônia, em nome do episcopado de seu país, havia enviado ao Papa uma petição para que fosse renovada a consagração do gênero humano ao Coração Imaculado de Maria e a Virgem fosse proclamada "Mãe da Igreja" ou "Mãe dos povos”. Paulo VI solicitou à Comissão doutrinal para estudar a questão, e o parecer contrário que esta retornou foi exclusivamente ligado a razões de "conveniência ecumênica”.
"O Cardeal Ottaviani comunicou ao secretário Felici a decisão da Comissão", lembrava Dom Vincenzo Carbone, "explicando que o voto negativo fora motivado por razões pastorais, psicológicas e ecumênicas”. O órgão doutrinário tinha, no entanto, reconhecido que o título poderia ser teologicamente permitido. Ao ser informado da decisão da comissão, o Papa Montini havia comentado: "Sinto um pouco, mas paciência”.
A maioria dos padres conciliares, como está documentado por suas intervenções e petições apresentadas na sessão, não era contrária à proclamação. E quando o Papa inesperadamente e por sua pessoal iniciativa, afirmou durante o discurso de encerramento da terceira sessão do Concílio: "Para a glória da Virgem e para o nosso conforto, proclamamos Maria Santíssima, Mãe da Igreja", a assembleia dos padres irrompeu em aplausos.
Não faltaram, no entanto, as críticas, inclusive pesadas, contra a iniciativa papal. Jean Guitton, o filósofo amigo de Montini, presente na basílica, escreveu que o gesto de Paulo VI parecia o de "um anfitrião que coloca em embaraço os seus convidados”. Os convidados, neste caso, eram os observadores não-católicos. “A decisão do Papa não foi apressada, nem súbita. Ela amadureceu após cuidadosa consideração do debate, longa reflexão e consulta", lembrou Dom Carbone.
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Mãe da Igreja, aquela proclamação de surpresa de Paulo VI - Instituto Humanitas Unisinos - IHU