16 Setembro 2017
"Apesar do boicote silencioso de muitas Igrejas locais (Dioceses) - que é um grave pecado de omissão, do qual os responsáveis terão que prestar conta a Deus - o Grito dos Excluídos/as aconteceu no Brasil inteiro e alcançou seus objetivos", escreve Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP) e professor aposentado de Filosofia (UFG).
A respeito do 23º Grito dos Excluídos 2017 - cujo tema é “Vida em primeiro lugar” e lema “Por direitos e democracia, a luta é todo dia” - a CNBB Nacional enviou às Comunidades, Paróquias e Dioceses três Cartas ou Mensagens. A primeira “Apoio ao 23º Grito dos Excluídos” (12 de julho) da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora (Pastorais Sociais) solicita “efetivo apoio” ao 23º Grito dos Excluídos/as 2017.
A segunda “Unidos para servir” (16 de agosto), da Presidência da CNBB, pede que o dia 7 de setembro seja também um dia de oração e jejum pelo Brasil. A terceira “Vida em primeiro lugar” (31 de agosto), também da Presidência da CNBB, pede novamente às Comunidades o apoio ao 23º Grito dos Excluídos/as. “Encorajamos, mais uma vez, as pessoas de boa vontade, particularmente em nossas Comunidades, a se mobilizarem pacificamente na defesa da dignidade e dos direitos do povo brasileiro, propondo ‘a vida em primeiro lugar’”.
Apesar dessas Cartas, muitas Dioceses - como a Arquidiocese de Goiânia - não atenderam ao pedido da CNBB e preferiram o silêncio, a indiferença e o desinteresse, lavando as mãos como Pilatos e traindo Jesus na pessoa dos Excluídos/as como Judas. A Arquidiocese de Goiânia, em seus meios de comunicação, como o “Encontro Semanal” (distribuído em todas as Comunidades e Paróquias) e outros, não publicou uma só palavra sobre o 23º Grito dos Excluídos/as.
É uma falta de comunhão com a CNBB. As Cartas - dizem os defensores desse posicionamento - não têm caráter de obrigatoriedade. Que visão legalista e farisaica! A comunhão constrói-se a partir do compromisso com a promoção da vida e não do que é canonicamente obrigatório.
Para quem (como eu, que fui colaborador direto de Dom Fernando Gomes dos Santos) acompanhou e viveu intensamente a caminhada de renovação pós-conciliar da Igreja de Goiânia na década de setenta e oitenta, tudo o que está acontecendo hoje é muito doido! O Papa são João XXIII abriu as janelas (e as portas) da Igreja para que entrasse ar puro, mas atualmente muitas Igrejas locais (Dioceses) preferem fechar novamente as janelas (e as portas) e ficar com o ar contaminado. É uma provação pela qual a Igreja da Caminhada - como se costumava chamar - está passando. Ela não morreu! Está muito viva, mesmo que seja nas catacumbas! Ela voltará fortalecida e com mais vigor! Tenho certeza, na fé, que Deus vai me dar a graça de ver esse dia!
A desculpa apresentada para tentar justificar a não participação no 23º Grito dos Excluídos/as foi: o Grito defende algumas bandeiras com as quais a Igreja não concorda. Ora, se os seguidores e seguidoras de Jesus de Nazaré são chamados a ser sal da terra, luz do mundo e fermento na massa, podem - eles e elas - escolher o tipo de terra que querem salgar, o tipo de mundo que querem iluminar e o tipo de massa que querem fermentar? Não é isso um absurdo?
Vejam com que simplicidade, respeito e espírito fraterno o Papa Francisco - no meio dos Movimentos Populares - se coloca diante da questão da diversidade e das diferenças. “Nós que hoje estamos aqui, de diferentes origens, credos e ideias, talvez não estejamos de acordo acerca de tudo, certamente pensamos de modo diverso sobre muitas coisas, mas sem dúvida estamos de acordo sobre estes pontos”, ou seja, as três tarefas imprescindíveis para a mudança de estruturas e a construção de uma alternativa humana: “pôr a economia ao serviço dos povos; construir a paz e a justiça e defender a Mãe Terra” (Discurso aos participantes do 3º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Roma - Itália, 05/11/16)
Vejam também o que diz o Papa a respeito da participação dos cristãos/ãs nos Movimentos Populares e o convite que ele faz a todos e todas nós. “Soube que são muitos na Igreja aqueles que se sentem mais próximos dos Movimentos Populares. Muito me alegro por isso! Ver a Igreja com as portas abertas a todos vocês, que se envolve, acompanha e consegue sistematizar em cada Diocese, em cada Comissão ‘Justiça e Paz’, uma colaboração real, permanente e comprometida com os Movimentos Populares. Convido-vos a todos, bispos, sacerdotes e leigos, juntamente com as organizações sociais das periferias urbanas e rurais, a aprofundar este Encontro” (Discurso aos participantes do 2º Encontro Mundial dos Movimentos Populares. Santa Cruz de la Sierra - Bolívia, 09/07/15).
Por que muitos padres e bispos - pastores de Comunidades, Paróquias e Dioceses - não fazem como o Papa e não atendem ao seu convite? Por que a Arquidiocese de Goiânia não publicou uma palavra sequer sobre os três Encontros Mundiais dos Movimentos Populares com o Papa, que são a “marca registrada” do seu ministério pastoral?
Infelizmente, temos hoje na Igreja dois tipos de oposição ao Papa Francisco: a direta - que, mesmo não concordando com ela, devemos respeitar - e a silenciosa, que é uma oposição seletiva e cita do Papa só aquilo que lhe interessa. Essa oposição é hipócrita e farisaica! Não podemos aceita-la!
Apesar do boicote silencioso de muitas Igrejas locais (Dioceses) - que é um grave pecado de omissão, do qual os responsáveis terão que prestar conta a Deus - o Grito dos Excluídos/as aconteceu no Brasil inteiro e alcançou seus objetivos.
Em Goiânia - como foi amplamente divulgado - o Grito aconteceu na Região Noroeste. Participaram mais de 500 pessoas, a maioria líderes de Movimentos Populares e Sindicais, animadores e animadoras de Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), agentes das Pastorais socioambientais, da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e (um testemunho que nos edificou a todos e todas) muitas religiosas inseridas, que (com o apoio da CRB Nacional e Regional) vivem a vida do povo e são solidárias com suas lutas (mesmo tendo que enfrentar às vezes - como diz o Papa Francisco - a “peste do clericalismo”. Os Padres éramos três.
Pela gravidade das situações que os nossos irmãos e irmãs vivem - entre os presentes no Grito - merecem um destaque especial e todo nosso apoio o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) e o Movimento Nacional dos Trabalhadores/as Sem Teto (MTST).
À luz da fé, fizemos a experiência da presença de Jesus de Nazaré. “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome (ou seja, por causa de mim e do meu projeto de vida), eu estou no meio deles” (Mt 18, 20).
Lembremos as palavras do Papa Francisco - pronunciadas há poucos dias - que nos animam a todos/as e fortalecem a nossa esperança. “Existem os pecados dos dirigentes da Igreja, carentes de inteligência ou que se deixam manipular. Mas a Igreja não são os bispos, os papas, os padres. A Igreja é o povo”.
“Na medida em que - diz ainda Francisco - nos envolvermos com a vida de nosso povo fiel e sentirmos a profundidade de suas feridas, podemos ver, sem filtros clericais, o rosto de Deus”.
“Trata-se de diariamente trabalhar no campo, lá onde vive o Povo de Deus. A missão se faz no corpo a corpo” e - acrescento eu - não morando em palacetes.
“A proposta dos Grupos Bíblicos, das Comunidades Eclesiais de Base e dos Conselhos Pastorais - continua o Papa - se colocam na linha de superação do clericalismo e de um crescimento da responsabilidade dos leigos”. Meditemos!
A esperança nunca morre! Vamos à luta!
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Pecado de omissão da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU