02 Junho 2017
"Durante o período da conferência, o dia começava com a celebração da Missa logo pela manhã, à qual participaram as multidões de fiéis vindas ao Santuário. Quando, na quarta-feira 16 de maio, Bergoglio concluiu a sua homilia em espanhol, foi aplaudido por todos os presentes. Foi a única vez que algo similar aconteceu durante as semanas de Aparecida". Padre Diego Fares, jesuíta, filósofo e escritor da revista La Civiltá cattolica estava entre aqueles que, naquela manhã, sentiram a vontade de bater palmas às palavras do presidente da Comissão de Redação do Documento Final da V Conferência do episcopado latino-americano. "Naquela homilia aplaudida, podemos identificar, de maneira surpreendente, a origem remota de seu pontificado", acrescenta o sacerdote que, na última edição de La Civiltà cattolica, dedicou um aprofundado estudo ao evento, intitulado "Dez anos depois de Aparecida. As origens do pontificado de Francisco".
A entrevista é de Lucia Capuzzi, publicada por Avvenire, 31-05- 2017. A tradução é de Luisa Rabolini.
O que Bergoglio disse de tão formidável?
Eu me lembro como se fosse hoje. Estava descrevendo a imagem de São Turíbio de Mogrovejo, bispo e grande evangelizador do século XVI. Quando ele morreu, em 1606, um índio acompanhou a cerimônia tocando a sua flauta tradicional, para que o espírito do pastor descansasse em paz. Em um determinado ponto, o então cardeal disse: "Não queremos ser uma Igreja autorreferencial, mas missionária, não queremos ser uma Igreja gnóstica, mas uma Igreja adoradora e orante. Nós, povo e pastores que constituímos esse santo povo fiel de Deus, que tem a infalibilidade da fé, juntamente com o Papa, nós, povo e pastores, dialogamos com base no que o Espírito nos inspira, oramos juntos e construímos a Igreja juntos, ou melhor, nós somos instrumentos do Espírito que a constrói". Uma ponte ideal conecta essas palavras, enraizadas nos ditames do Concílio, com a primeira saudação do papa Francisco para a multidão reunida na Praça de São Pedro.
O que representou Aparecida para a Igreja?
Foi um verdadeiro e próprio acontecimento eclesial. Lá, de fato, a realidade superou a ideia. Ou seja, a realidade do acontecimento foi superior às ideias que foram discutidas, votadas, escritas e corrigidas durante a Conferência. A questão central foi a vida concreta dos nossos povos. Reunidos no subsolo do Santuário de Aparecida, percebíamos constantemente o peso suave do povo fiel de Deus que caminhava e rezava sobre as nossas cabeças. Isso também nos ajudou a amadurecer uma visão que tem se revelado frutífera. Não só para a América Latina. Os frutos de Aparecida se estenderam para toda a Igreja e foram inclusive além, graças ao impulso que o Papa Francisco deu a uma evangelização em que todo o povo de Deus, em seu conjunto, é um discípulo missionário.
Qual é a relação entre a quinta Conferência e os anteriores?
Aparecida é a expressão de um caminho latino-americano que começou em Medellin, ganhou força em Puebla e, em Santo Domingo, parou só para recuperar o fôlego. Ao mesmo tempo, o documento final busca inspiração no Evangelii nutiandi de Paulo VI e, portanto, no Concílio Vaticano II.
Existe realmente uma "música" especial em Aparecida. Qual seria?
O Cardeal Bergoglio convenceu os demais participantes a principiar o documento com um "olhar espiritual" que antecedeu a análise da realidade. Paradoxalmente, justamente esse olhar, de louvor e oração, foi o que permitiu a coragem e a audácia do Reino para discernir os sinais dos tempos. Harmonizando entre si a perspectiva científica e a dogmática. Esse olhar, finalmente, é que "revela" a unidade entre os dois temas que muitos gostariam de manter em separado: pobreza e cuidado com o meio ambiente. Nesse sentido, o documento de Aparecida contém o germe da Laudato sí’.
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Aparecida. Depois da homilia aplausos para Bergoglio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU