24 Novembro 2016
Muitas pessoas acreditam que a castanheira-do-brasil (Bertholletia excelsa, Lecythidaceae), uma das árvores mais exuberantes da Amazônia e de grande importância econômica para pessoas que vivem do extrativismo, depende de um único tipo de abelha para polinizar suas flores. Essa crença levava à hipótese de que, quando a árvore está isolada na pastagem, não produz frutos porque essa abelha não tem como chegar até a copa da castanheira. Isso porque acredita-se que o inseto depende das outras árvores da floresta para chegar até a copa da castanheira, que geralmente está a mais de 40 metros de altura. No entanto, pesquisas recentes derrubam essa crença. Cientistas descobriram que existem mais de 25 espécies de abelhas nativas de médio a grande porte responsáveis por levar o pólen entre as árvores de castanheira. Além disso, os estudos mostram que as abelhas têm capacidade de voar até a copa das castanheiras isoladas em pastagens.
A reportagem é Renata Silva, publicada por Embrapa, 23-11-2016.
A descoberta de que há uma grande quantidade de polinizadores da castanheira e que todos são abelhas nativas da Amazônia oferece grande vantagem a essa árvore. “Em uma situação de falta de uma das espécies de abelha, existirão outras que podem assumir o papel de polinizador, mantendo a formação de frutos, sementes e a perpetuação da castanheira”, destaca a pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental (PA), Márcia Maués, que também é coordenadora da rede de pesquisa sobre polinização da castanheira-do-brasil, que vem desvendando esse e outros mitos sobre a polinização dessa árvore tão importante para a Amazônia.
De acordo com Maués, os gêneros de abelhas que mais se destacam como polinizadores da planta são: Bombus, Centris, Eulaema, Eufriesea, Epicharis e Xylocopa, sendo Xylocopa frontalis, Eulaema bombiformis, Eulaema mocsaryi, Centris denudans e Bombus transversalis as espécies mais frequentes. Esses insetos são capazes de voar longas distâncias e entram na flor por meio de movimentos vigorosos das pernas anteriores, acessando tanto o pólen quanto o néctar da flor. Abrir a flor é a tarefa mais difícil, por isso é que se achava que poucas espécies de abelhas eram capazes de realizar a polinização. Alguns autores chegaram a relatar que apenas uma espécie desse inseto teria capacidade de executar a polinização das castanheiras.
A pesquisadora da Embrapa Rondônia, Lúcia Wadt, explica que essa dedução bem popular de que as abelhas não tem acesso às copas de castanheiras isoladas no pasto vem do fato de diversos estudos relatarem que uma castanheira isolada não pode dar frutos porque existe algum mecanismo em que a fertilização só ocorre quando a flor recebe pólen de outra árvore geneticamente diferente. Para receber esse pólen, a castanheira isolada dependeria que as abelhas polinizadoras percorressem longas distâncias de espaço vazio na pastagem.
Para desmistificar isso, foi feito um estudo de fluxo gênico em castanheiras isoladas na pastagem, em que foi possível estimar a distância entre o pai (doador de pólen) e a mãe (produtora de sementes) de uma plantinha obtida pela germinação das sementes de uma castanheira isolada no pasto. Para fazer essa estimativa de fluxo de pólen, foram coletados frutos de oito castanheiras distribuídas em uma pastagem no município de Senador Guiomard, no Acre, e obtidas as sementes para produção de mudas.
Além disso, todas as castanheiras da pastagem e outras presentes em floresta próxima, mapeadas em uma área de aproximadamente 163 ha, tiveram material vegetal coletado para extração de DNA e genotipagem em laboratório a fim de verificar uma possível paternidade. Foram genotipados também dez mudas de cada castanheira-mãe. Com os genótipos das mães, dos filhos e dos possíveis pais, foi possível identificar quais foram os pais de cada muda feita no viveiro. Esse procedimento é o mesmo utilizado em testes de paternidade.
Os resultados mostraram que houve troca de pólen entre castanheiras que estavam a distâncias variando de 104 metros a 911 metros, sendo a média 442 metros. Foram identificados pais que estavam tanto na floresta vizinha como na pastagem, e que mesmo árvores distantes sem nenhuma vegetação entre elas foram visitadas pelas abelhas, pois houve troca de pólen. “Descobrimos que a incapacidade de as abelhas voarem até a copa das castanheiras isoladas em pastagens é um mito”, revela Lúcia Wadt. Essa informação pode ter impacto no interesse das pessoas em plantar a castanheira em áreas abertas como é o caso de pastagens.
A descoberta desvenda apenas uma das hipóteses da baixa produção de frutos em castanheiras isoladas em pastagens. A pesquisadora afirma que ainda não se sabe quais fatores limitam a produção das castanheiras isoladas, mas, com certeza, o microclima e condições de stress fisiológico em que essas árvores se encontram tem algum efeito. “O que não podemos mais sair dizendo por aí é que a castanheira isolada no pasto não produz frutos porque as abelhas não conseguem chegar até sua copa”, conclui.
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Pesquisa derruba mitos sobre polinização da castanheira - Instituto Humanitas Unisinos - IHU