Por: André | 10 Mai 2016
Em uma nova Carta ao Povo de Deus, os Padres em Opção pelos Pobres, da Argentina, chamaram a atenção para as demissões e a situação social. Eles questionaram também “o repugnante silêncio dos bispos” e recordaram que “Milagro Sala continua injusta, política e ilegalmente presa”.
A reportagem é de Washington Uranga e publicada por Página/12, 08-05-2016. A tradução é de André Langer.
Prosseguindo a prática de divulgar informações sobre a realidade do país através de Cartas ao Povo de Deus, os Padres em Opção pelos Pobres emitiram sua sexta epístola. Nela fazem uma análise crítica dos acontecimentos políticos e sociais das últimas semanas, assinalando fatos positivos e negativos. O longo texto de quase seis páginas inclui uma severa crítica a Mauricio Macri. “Ouvi-lo dizer (o Presidente) que ‘o trabalho dignifica’ é cruel na boca de um ‘causador de desemprego em série’”, porque “também os escravos trabalham”, dizem os padres. “Ressoa em nossa sensibilidade – acrescentam – a frase ‘o trabalho liberta’ (Arbeit mach frei), que se encontrava nas portas de Auschwitz”, em referência ao campo de concentração da Alemanha nazista.
Os padres católicos que trabalham em meios populares defendem que “o trabalho que dignifica é o trabalho remunerado com justiça e socialmente protegido pelo Estado”. E em referência às palavras do presidente sobre a felicidade destacam que “não é uma energia que nos atravessa”, mas “um estado de plenitude que se compartilha porque se encarnou” e que “desejar felicidade a quem acaba de ser demitido é, além de sádico, desalmado”. Concluem que “a sensibilidade não parece ser uma qualidade dos membros deste governo”.
O texto do grupo de sacerdotes – um dos seus coordenadores é o padre Eduardo de la Serna – faz uma síntese dos fatos da vida nacional, com avaliações políticas e religiosas sobre os mesmos. Começa recordando que “Milagro Sala continua injusta, política e ilegalmente presa” e denunciando “os ataques, a violência e os maus tratos de pessoas ligadas ao Tupac Amaru de Jujuy” silenciados pela imprensa.
No parágrafo seguinte, trata-se das demissões provocadas em várias áreas do Estado nacional, muitas delas por “serem militantes”, e a consequente paralisação de programas sociais. “Solidarizamo-nos com todos os trabalhadores demitidos com a desculpa falaz de serem ‘ñóquis’ – dizem os padres –, motivo pelo qual têm sua fonte de trabalho ameaçada, tanto no setor público como no privado”. E fazem chegar “um abraço fraterno” aos/às “trabalhadores/as da Rádio del Plata, 360 TV e Infonews, como fizemos antes com os de Tiempo Argentino, Rádio América e CN 23”.
Também não falta a crítica direta aos bispos católicos. O texto – escrito para ser lido nas capelas e paróquias onde trabalham os padres – diz que “dói o repugnante silêncio dos bispos diante da atual situação”, advertindo que “a presença de membros da Cáritas no Ministério do Desenvolvimento Social não deveria tapar suas bocas, mas parece que muitos não tomaram conhecimento do sofrimento de suas ovelhas”.
Em relação à ação da Justiça, o documento defende que “a assim chamada ‘corrupção’ deve ser enfrentada com a lei e a Justiça”, mas, “lamentavelmente, o Poder Judiciário atual nos inspira pouca confiança”. E acrescentam que “é importante assinalar que não há ‘corruptos bons’ e ‘corruptos maus’”, porque “não se trata de buscar ostensivamente e em ‘cadeia nacional’ alguns supostos corruptos enquanto se dissimulam ou escondem outros”. Acrescentam os padres que “muitos desses se repetem em contas no exterior ou nas compras de dólar a futuro, tema que parece algo ilegal ou ilegítimo para uns, ao passo que é inocente ou quase meritório para outros”.
No mesmo sentido, os sacerdotes sustentam que “o silêncio da imprensa hegemônica diante da gravidade representada pelas empresas offshore de funcionários deste governo, seus familiares e amigos, de empresários e responsáveis por meios de comunicação é coerente com o mesmo silêncio com as denúncias de Hernán Arbizu, JP Morgan, Hervé Falciani e do HSBC na Suíça”. Destacando que “parece que para alguns a corrupção é ‘dos outros’, embora naqueles casos o que está escondido seja imensamente mais escandaloso”.
A este respeito dizem também que “a super atuação do Poder Judiciário é grotesca, com a cumplicidade dos meios de comunicação que mostram em cadeia nacional uma retroescavadeira, um buraco e um cachorro na Província de Santa Cruz e omitem mostrar os cada vez mais frequentes nomes próximos ao governo nacional envolvidos nos Panama Papers”.
Quando começaram a escrever suas Cartas ao Povo de Deus, os Padres em Opção pelos Pobres expressaram que a intenção ao produzir este tipo de documento é informar e tornar transparente nas comunidades em que trabalham aquelas notícias e acontecimentos que estão sendo, na sua opinião, ignorados, censurados ou manipulados pelos meios de informação e pelas autoridades do governo.
Na carta há um longo parágrafo dedicado ao chefe de Gabinete, Marcos Peña. “O fato de que afirme que estão sendo dados passos na unidade dos argentinos quando se persegue sistematicamente todos aqueles que apoiaram o governo anterior, que diga que se está avançando na luta contra o narcotráfico, exatamente quando cinco mortes enlutam a cidade de Buenos Aires apesar do repugnante silêncio do prefeito Rodríguez Larreta e a cumplicidade das forças de segurança; que assegure que se avança na direção da pobreza zero, quando as demissões aumentam de modo notável e os preços dos alimentos da cesta básica de nosso povo estão disparando, nos faz pensar que as conquistas que o governo ostentará são todas peças publicitárias, vazias e sustentadas por um fenomenal aparelho midiático”.
No capítulo destinado aos fatos positivos, os padres ressaltam, entre outros, “a recente mobilização do Dia do Trabalhador/a”, assinalando também como positivo “algumas ausências no palco, que colocam preto no branco o seu compromisso a favor dos opressores e afastando-se dos oprimidos”. Destacam também “a sentença da Justiça que ordenou o governo da Província de Buenos Aires a reabrir as negociações com seus funcionários”, que foram encerradas unilateralmente, e “a associação de diferentes grupos reunidos sob a convocação da Frente Cidadã para refletir e defender-se das perdas de direitos e liberdades experimentadas”.
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Governo de Mauricio Macri: “Um causador de desemprego em série” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU