Neste espaço se entrelaçam poesia e mística. Por meio de orações de mestres espirituais de diferentes religiões, mergulhamos no Mistério que é a absoluta transcendência e a absoluta proximidade. Este serviço é uma iniciativa feita em parceria com o Prof. Dr. Faustino Teixeira, teólogo, professor e pesquisador do PPG em Ciências da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora – MG.
O santo
O benefício maior do santo
é para com ele mesmo, o que não importa:
pois quando ele atinge a própria largueza,
milhares de pessoas ficam alargadas
pela sua largueza e dela vivem,
e ele ama tanto os outros
assim como ama o seu próprio
terrível alargamento,
ele ama seu alargamento
com impiedade por si mesmo.
O santo quer se purificar
porque sente a necessidade de amar o neutro?
De amar o que não é acréscimo,
e de prescindir do bom e do bonito.
A grande bondade do santo –
é que para ele tudo é igual.
O santo se queima até chegar ao amor do neutro.
Ele precisa disso para ele próprio (...)
Viver é uma grande bondade para com os outros.
Basta viver, e por si mesmo
isto resulta na grande bondade.
Quem vive totalmente
está vivendo para os outros,
quem vive a própria largueza,
está fazendo uma dádiva,
mesmo que sua vida se passe dentro
da incomunicabilidade de uma cela.
Viver é dádiva tão grande
que milhares de pessoas se beneficiam
de cada vida vivida.
Fonte: Clarice Lispector. A paixão segundo G.H. Rio de Janeiro: Rocco, 2020, p. 169-170.
Clarice Lispector (Foto: Acervo Instituto Moreira Sales - Wikimedia Commons)
Clarice Lispector (1920 - 1977): Escritora e jornalista ucraniana, naturalizada no Brasil. É vista como uma das maiores escritoras brasileiras do século XX, de grande influência na literatura nacional e no modernismo. Escreveu diversos romances, contos e ensaios, Clarice publicou uma vasta obra literária, com mais de 20 livros. Além de livros infantis, como, O mistério do coelho pensante (1967) e A mulher que matou os peixes (1968), é autora de Perto do coração selvagem (1943); O lustre (1946); A cidade sitiada (1949); A maçã no escuro (1961), A paixão segundo G. H. (1964), Água viva (1973), Um sopro de vida (1978), entre outros.