29º domingo do tempo comum - Ano B - Subsídio exegético

15 Outubro 2021

 

O subsídio é elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana – ESTEF:

- Dr. Bruno Glaab
- Me. Carlos Rodrigo Dutra
- Dr. Humberto Maiztegui
- Me. Rita de Cácia Ló


Edição: Prof. Dr. Vanildo Luiz Zugno

 

Leituras do dia


Primeira Leitura: Is 53, 10-11
Salmo: 32, 4-5.18-19.20.21
Segunda Leitura: Hb 4, 14-16
Evangelho: Mc 10, 35-45

 

O Evangelho e seu contexto literário

 

Este episódio também aparece em Mt 20,20-21, onde a “mulher de Zebedeu”, isto é, a mãe de Tiago e João - que não são mencionados nominalmente como aqui - pede que eles, no Reino, se assentem a sua direita e esquerda. Já a comunidade de Marcos não “culpa” a mãe ou “mulher” por esta pretensão, mas responsabiliza os dois discípulos, que tem destaque, assim como Pedro, entre o grupo dos doze (1,29;5,37;9,2). Assim se busca prevenir que outras pessoas usem o nome ou seguimento de Cristo como instrumento de prevalecimento sobre outras pessoas, o que potencialmente pode transformar o Evangelho em instrumento de opressão e morte.

 

O texto em si

 

Este Evangelho tem um estilo simples com repetição rítmica de conjunções e artigos, estrutura a narrativa. Neste caso, a partícula estruturante é “ho”, em grego um artigo definido que pode ser traduzido ao português como “o” ou “a”, mas também como pronome demonstrativo “este” ou “aquele”. Vejamos o texto, colocando em negrito a partícula estruturante de forma resumida:

 

A. Introdução

v.35 – “E (kai) proximaram-se os filhos de Zebedeu, Tiago e João, Mestre queremos que nos atendas/concedas”.

 

B. Ensinamento do mestre

v.36 – “Este/aquele – Jesus – então disse a eles...”; v.38 – “Este/aquele Jesus, então disse a eles”; v.39 – “Este/aquele Jesus, então disse a eles”.

 

C. O critério sapiencial do ensinamento de Jesus

v.40 – “Quando a se assentar a minha direita ou minha esquerda não cabe a mim conceder, porque é para quem está preparado.

 

B’. Resposta ao ensinamento do mestre

v.41 – “E (kai) ouvindo os dez ficaram indignados com Tiago e João”.

v.42 – “Este Jesus, então, chamando-os, lhes falou...”

 

A’. Jesus, servo.

v.45 - “E (kai) pois o Filho do Ser Humano não veio para ser servido, mas para servir”

 

A aproximação: Como vemos na estrutura acima, os versículos 35 e 45, partes A e A’, Jesus é apresentado de duas formas diferentes. Primeiro é chamado de “Mestre” e depois se auto-apresenta como “Filho do Ser Humano” e aquele que veio para servir. Assim, dentro da estrutura quiástica, este é o caminho de reaproximação de Jesus: não como detentor do poder hierárquico, mas como promotor do serviço como relação alternativa ao poder excludente do prevalecimento de quem domina sobre as pessoas dominadas.

 

O caminho sacramental do seguimento: Já as partes sinalizadas com B e B’ trazem o caminho percorrido por Jesus e por quem lhe segue diante do poder da morte. A isto se refere Jesus quando afirma que não sabem do “cálice”, isto é a perseguição, a tortura, o martírio, que será o preço ser pago por se apresentar como alternativa ao poder da morte. O “batismo” relacionado ao “cálice” (os dois sacramentos principais da Igreja Cristã) deixa claro que este caminho de doação e entrega da vida na luta contra o poder da morte, será o caminho de todas as pessoas que seguirão Jesus como servo.

 

O critério sapiencial: No v. 40 aparece um critério sapiencial que resgata a primazia do projeto divino sobre as “vontades” de poder humanas. Não só para indicar porque as disputas pelo poder hierárquico são inúteis e estranhas ao projeto do reinado divino, mas para dar segurança de que há um plano divino, através do serviço, capaz de vencer todos os poderes de morte. O projeto não está na relação estreita de Jesus com as pessoas mais próximas – “não cabe a mim conceder” – mas com toda a humanidade: o “Filho do Ser Humano” que serve e dá sua vida “em resgate de muitos” (v.45).

 

Relacionando com os outros textos

 

A leitura de Isaías ou “Deutero-Isaías”, escrito no final do Exílio Babilônico, traz o final de um dos Cânticos do Servo Sofredor. Nestes textos se fala de alguém que sofre a serviço de todo o povo, resistindo à opressão babilônica e animando o povo seguir o caminho do serviço na reconstrução do povo cativo.
Já a Carta aos Hebreus apresenta um “sumo sacerdote” que se compadece das fraquezas, porque ele mesmo passa por elas, apontando assim para Jesus, servo e solidário.

 

 

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