24 Novembro 2017
Algumas reflexões do pontífice sobre a oração foram publicadas pela editora Rizzoli e pela Libreria Editrice Vaticana, em um texto nascido das conversas do papa com o Pe. Marco Pozza (foto acima) e intitulado Quando pregate dite Padre nostro [Quando rezarem digam Pai nosso] (144 páginas).
O jornal Corriere della Sera, 23-11-2017, antecipou dois trechos do livro. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No relato da paixão de Jesus, há três episódios que nos falam da vergonha. Três pessoas que se envergonham. A primeira é Pedro. Pedro ouve o galo cantar e, naquele momento, sente algo dentro de si mesmo e vê Jesus sair e olhar para ele. A vergonha é tamanha que ele chora amargamente (cf. Lucas 22, 54-62).
O segundo caso é o do bom ladrão: “Nós estamos aqui”, diz ele ao outro companheiro de infortúnio, “porque fizemos coisas feias e injustas, mas este pobre inocente não tem culpas...”. Ele se sente culpado, se envergonha e, assim, defende Santo Agostinho, com essa vergonha, roubou o paraíso (cf. Lucas 23, 39-43).
A terceira, que me comove mais, é a vergonha de Judas. Judas é um personagem difícil de entender, houve tantas interpretações da sua personalidade. No fim, porém, quando vê o que fez, vai ao encontro dos “justos”, dos sacerdotes: “Eu pequei porque traí sangue inocente”. Aqueles lhe respondem: “E o que temos nós com isso? O problema é seu” (cf. Mateus 27, 3-10). Assim, ele vai embora com a culpa que o sufoca. Talvez, se tivesse encontrado Nossa Senhora, as coisas seriam diferentes, mas o pobrezinho vai embora, não encontra uma saída e se enforca.
Mas há uma coisa que me faz pensar que a história de Judas não acaba ali... Talvez alguém pensará: “Este Papa é um herege...”. Mas não! Vão ver um capitel medieval na basílica de Santa Maria Madalena, em Vézelay, na Borgonha (imagem abaixo). Os homens da Idade Média faziam a catequese por meio das esculturas, das imagens.
Judas e o Bom Pastor retratados em um capitel medieval na basílica de Santa Maria Madalena, em Vézelay, na Borgonha
Naquele capitel, de um lado, está Judas enforcado, mas, do outro, está o Bom Pastor que o carrega sobre os ombros e o leva embora consigo. Nos lábios do Bom Pastor, há um aceno de sorriso, não digo irônico, mas um pouco cúmplice.
Atrás da minha escrivaninha, eu tenho a fotografia desse capitel dividido em duas seções, porque me faz meditar: há tantos modos de se envergonhar; o desespero é um, mas devemos tentar ajudar os desesperados para que encontrem a verdadeira estrada da vergonha e não percorram aquela que acabou com Judas.
Esses três personagens da paixão de Jesus me ajudam tanto. A vergonha é uma graça. Entre nós, na Argentina, uma pessoa que não sabe se comportar e faz mal é um “sem vergonha”. (...)
Isto é o mal. O mal não é algo impalpável que se difunde como a névoa de Milão. É uma pessoa, Satanás, que é também muito esperta. O Senhor nos diz que, quando ele é expulsado, ele vai embora, mas, depois de um certo tempo, quando alguém está distraído, talvez depois de alguns anos, ele volta pior do que antes.
Ele não entra invadindo a casa. Não, Satanás é muito educado, bate na porta, toca a campainha, entra com as suas típicas seduções e os seus companheiros. No fim, este é o sentido do versículo: “Não nos deixeis cair no mal”. É preciso ser esperto no bom sentido da palavra, ser rápido, ter a capacidade de discernir as mentiras de Satanás com o qual, estou convencido, não se pode dialogar.
Como Jesus se comportava com Satanás? Ou o expulsava ou, como fez no deserto, se servia da Palavra de Deus. Nem Jesus jamais iniciou um diálogo com Satanás, porque, se você começa a dialogar com ele, está perdido. Ele é mais inteligente do que nós e vira você de ponta-cabeça, faz você virar a cabeça e, no fim, está perdido. Não, “vá embora, vá embora!”.
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A oração de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU