Por: Cesar Sanson | 14 Junho 2016
Manifesto, organizado pelo Observatório do Clima reune assinaturas de médicos, cientistas especialistas em poluição do ar, organizações de pesquisa, entidades ambientalistas e de defesa do consumidor, de empresários e de cinco ex-ministros do Meio Ambiente – Rubens Ricupero, José Carlos Carvalho, Marina Silva, Carlos Minc e Izabella Teixeira.
No Manifesto criticam o Projeto de Lei 1.013/2011, que libera a fabricação e a venda de carros de passeio a diesel no Brasil. Segundo os signatários, o projeto é um atentado contra a democracia, o ambiente, a saúde e a economia.
Eis o manifesto.
Uma comissão especial da Câmara dos Deputados votará nos próximos dias o Projeto de Lei no 1.013/2011, que libera a fabricação e a venda de veículos leves movidos a óleo diesel no país. Nós, signatários deste manifesto, repudiamos a proposição e exigimos sua retirada, por considerarmos que ela atenta contra os interesses da sociedade brasileira em pelo menos quatro aspectos.
Trata-se, primeiramente, de um atentado à democracia. O PL já foi examinado em duas comissões da Câmara em 2014, e rejeitado em ambas – apenas para voltar à tona por uma comissão especial criada em 2015. Desta vez, a proposta tem caráter terminativo, ou seja, vai direto ao Senado sem passar pelo Plenário da Câmara. Fazer avançar à sorrelfa uma proposição derrotada enfraquece a democracia e envergonha ainda mais o Parlamento brasileiro.
O PL também atenta contra o meio ambiente, já que sua aprovação ampliará no Brasil o uso do mais poluente dos combustíveis automobilísticos, além de incentivar o uso do transporte individual. Isso poria o país, mais uma vez, na contramão do planeta: cidades europeias como Londres e Paris já anunciaram o banimento dos carros a diesel após 2020, e os combustíveis fósseis no sistema de transportes estão com os dias contados após a assinatura do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas.
Segundo a Agência Internacional de Energia1, para cumprir a meta do acordo do clima de limitar o aquecimento global a menos de 2oC, será preciso que as emissões do setor de transportes atinjam o pico e comecem a declinar ainda nesta década, e o número de carros elétricos precisará chegar a 150 milhões em 2030. O PL 1.013 vai contra esses dois objetivos. Além disso, cria dificuldade adicional para o cumprimento da meta (NDC) do Brasil, já que amplia a participação de combustíveis fósseis na matriz e cria um desestímulo aos carros a álcool – combustível que precisa ter seu uso enormemente ampliado para que o Brasil possa cumprir a meta.
Veículos a diesel são fortes emissores de material particulado fino (PM2,5), potencial carcinógeno humano, e de óxidos de nitrogênio (NOx), precursores do tóxico ozônio troposférico. No Brasil, os limites de emissão dessas substâncias 1 IEA, Energy Technology Perspectives, 2016 são quatro vezes mais altos do que na Europa, o que torna inviável a instalação de filtros de particulados como os que existem nos carros europeus. Mesmo que os limites fossem menores, os filtros exigem um diesel com teor de enxofre ultrabaixo – e o Brasil ainda comercializa, fora das regiões metropolitanas, diesel S500 (com 50 vezes mais enxofre do que o diesel vendido nas cidades). Com base nessas condições, pesquisadores do Conselho Internacional de Transporte Limpo estimaram2 que a liberação de carros de passeio a diesel no Brasil aumentaria as mortes precoces por poluição do ar em 50% a 230% até 2050 – um saldo líquido de até 150 mil óbitos adicionais.
Por fim, segundo o próprio Ministério de Minas e Energia, a liberação dos carros a diesel no país não faz sentido do ponto de vista econômico. Mesmo com o aumento da capacidade de refino nos últimos anos, o Brasil segue importando óleo diesel: projeta-se que a dependência do Brasil de diesel importado seja de 17% em 2024 mesmo sem a liberação dos veículos leves3. Como o diesel tem incentivos tributários devido à sua importância no transporte de cargas e no transporte coletivo de passageiros, aumentar sua importação para atender a veículos leves, num país que tem biocombustíveis em abundância, forçaria a uma revisão dessa tributação especial, sob pena de causar ainda mais prejuízo à Petrobras. Isso aumentaria o custo do transporte de carga no país – exatamente o que os proponentes do PL dizem estar querendo evitar.
O PL 1.013 é uma violência contra a sociedade brasileira. O único destino aceitável para essa proposição legislativa é o arquivamento.
Assinam este manifesto:
Adriana Fernandes - administradora
Alfredo Sirkis – diretor-executivo do Centro Brasil no Clima
Aquiles Pisanelli – engenheiro,
Aqtra Bruno Fernando Riffel – geólogo, Leben Consultoria
Calvin Iost – engenheiro ambiental, IRM
Carla Vilela Jacinto - arquiteta C
Carlos Minc – ex-ministro do Meio Ambiente
Carlos Eduardo Frickmann Young – professor do Instituto de Economia da UFRJ
Daniela Reis – Minha Garopaba
Délcio Rodrigues – físico, Global Strategic Communications Council
Eduardo Jorge – médico sanitarista, ex-secretário municipal do Meio Ambiente de São Paulo
Fabio Feldmann – advogado e ex-secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo
Fernando Aparecido Benvenutti – tecnólogo agrícola
Fernando José Balbo – engenheiro agrônomo, Usina São Francisco Gesse Brito dos Santos - professor
Gilberto Natalini – médico, vereador pelo PV, São Paulo Gina Besen – IEE-USP
Guilherme do Couto Justo – gestor ambiental,
Bunge Hermano Albuquerque de Castro – médico, diretor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz
Isabel Dauer - jornalista
Izabella Teixeira – ex-ministra do Meio Ambiente
Jacyr Costa Filho - Tereos João Gabriel Fernandes - economista
João Marcos Miragaia – Universidade Santa Cecília
José Carlos Carvalho – ex-ministro do Meio Ambiente
José Cláudio da Silva – Usina Alto Alegre S/A
José Eli da Veiga – professor da Faculdade de Economia da USP
Laís Faszjerstejn – pesquisadora, Faculdade de Medicina da USP
Lucian de Paula Bernardi - Unifesp
Luiz Gylvan Meira Filho – pesquisador-visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP
Luiz Pereira – médico, Universidade Católica de Santos
Luísa Abreu Rodrigoes – estudante
Mara Angelina Magenta – bióloga, Universidade Santa Cecília Marcelle
Lacerda Corrêa - Adecoagro
Márcio Maia Vilela – Instituto de Física da USP
Mariana Veras – médica, diretora do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da USP
Marina Silva – ex-ministra do Meio Ambiente
Natalie Unterstell – Harvard Center for Public Leadership
Nelson Gouveia – epidemiologista, professor da Faculdade de Medicina da USP
Nilvo Silva – Nord Meio Ambiente
Oded Grajew – empresário, Rede Nossa São Paulo
Olímpio de Melo Álvares Júnior – engenheiro, L’Avis Eco-Service
Oswaldo Lucon – professor do IEE (Instituto de Energia e Ambiente) da USP e membro do IPCC
Artaxo – professor-titular do Instituto de Física da USP e membro do IPCC
Paulo Saldiva – médico, diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP
Pedro Roberto Jacobi – professor do IEE-USP
Raphael Lorenzetti Losasso – administrador,
Zilor Roberto Schaeffer – professor da Coppe-UFRJ e membro do IPCC
Rubens Ricupero – ex-ministro do Meio Ambiente
Sérgio Besserman Vianna – economista, professor da PUC-RJ
Sérgio Margulis – economista, Instituto Internacional para a Sustentabilidade
Sônia Maria Flores Gianesella – professora, USP
Suani Coelho – professora do Programa de Pós-Graduação em Energia da USP
Tasso Azevedo – coordenador do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa
Agroicone Alcopar – Associação de Produtores de Bioenergia do Estado do Paraná
Amigos da Terra Amazônia Brasileira
Aprec Ecossistemas Costeiros
Apremavi
Associação Brasileira de Biotecnologia Industrial (ABBI)
Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura
Ecoa – Ecologia e Ação Engajamundo
Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social
Fundação SOS Mata Atlântica
Fundación Avina
Greenpeace
Grupo Libra Iclei – Governos Locais pela Sustentabilidade
Imaflora Iniciativa Verde
Instituto Akatu
Instituto Arapyaú
Instituto Centro de Vida (ICV)
Instituto Ethos
Instituto Internacional de Educação do Brasil
Instituto Socioambiental
Observatório do Clima
Odebrecht Agroindustrial Projeto Hospitais Saudáveis
Proteste Associação de Consumidores
Siamig – Associação das Indústrias Sucroenergéticas do Estado de Minas Gerais
SOS Amazônia Uma Gota no Oceano
Unica – União da Indústria da Cana-de-Açúcar
Clima e Sociedade Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema)
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam)
Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon)
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Carro diesel. Um atentado contra a democracia, o ambiente, a saúde e a economia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU