Por: André | 18 Janeiro 2016
Poderoso lugar de transformação e de metabolização dos alimentos, o abdômen ocupa um lugar importante no pensamento e na medicina chinesas. O doutor Gilles Andrès, presidente da Associação Francesa de Acupuntura, explica por quê.
A entrevista é de Sophie Bartczak e publicada por La Vie, 12-11-2015. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
Os intestinos também são considerados como o segundo cérebro na medicina chinesa?
Muitos pontos de acupuntura do meridiano do intestino grosso são específicos para as doenças neurológicas, como a hemiplegia, e alguns pontos situados sobre o abdômen têm indicações digestivas e psíquicas, até mesmo exclusivamente físicas. Mas designar os intestinos como o nosso segundo cérebro me parece exagerado. Há neurônios no intestino, mas não pensamentos. Estamos mais no domínio do inconsciente. Por outro lado, problemas digestivos estão muitas vezes associados ao estresse e a coisas difíceis de formular, inconscientes. No pensamento chinês, o cérebro é o lugar da mente e das funções superiores do ser humano, ao passo que o tórax abriga a alma e o ventre antes os apetites grosseiros.
Se o abdômen é o centro dos desejos, ele é também, portanto, o centro do ser humano?
Aí está, efetivamente, toda a sutileza do pensamento chinês, que mistura diferentes níveis de interpretação. O tronco, na Grande Tríade chinesa, é composto pelo tórax, que representa o Céu, pelo baixo tórax, que corresponde à Terra, e pelo abdômen, que simboliza o próprio Homem. O abdômen é o centro do ser humano, o lugar das transformações. É o receptáculo geral dos sopros (o qi) e a fonte da vitalidade, designado pelos japoneses por hara.
Qual é o papel dos órgãos digestivos na medicina chinesa?
Eles são considerados como zonas energéticas e cada órgão é associado a uma estação, a um sabor, um elemento e uma qualidade. Assim, o estômago é um lugar de transformação, o intestino delgado um lugar de recepção e de purificação e o intestino grosso um lugar de transformação e eliminação. Esses processos não são puramente químicos, mas sobretudo energéticos. Cada alimento nutre assim um órgão particular através dos seus sabores (ácido para o fígado, doce para o baço, amargo para o coração...) ou sua natureza (úmido, frio, quente, seco). Daí a importância de uma alimentação variada, mas também adaptada às estações, aos organismos ou às patologias na dietética chinesa.
Como são interpretadas as patologias digestivas?
O intestino delgado recolhe, faz prosperar o que vem do estômago sob a ação do fogo do coração: sem isso, assistimos a angústias, insônias, problemas de concentração e dificuldades digestivas. O baço tem um papel importante e regula as passagens à ação ligando o pensamento, o sentido e a intenção. Sua deficiência – reflexo de ruminações – pode acarretar em lentidão, gases ou queimações digestivas.
Fígado e vesícula biliar formam um conjunto à parte. A vesícula biliar é o órgão da decisão e está na gênese da ação. As pessoas que têm problemas de vesícula têm muitas vezes dificuldades para começar o dia. O fígado é o general do exército e regula as agressões digestivas. Ele está associado à raiva, mas também à luz e à possibilidade de ascensão espiritual. Órgão da primavera, da exteriorização, da ascensão e da criatividade, ele tem um papel importante nos problemas digestivos, e eu constato com frequência que as pessoas bloqueadas em seu imaginário apresentam muitas vezes problemas de fígado com refluxos, náuseas, vômitos ou crises de fígado.
Finalmente, o intestino grosso está associado aos pulmões, e um desequilíbrio desses dois órgãos pode se manifestar pela tristeza. Nesse sentido, a medicina chinesa está em sintonia com as recentes descobertas sobre as relações entre emoções e intestinos...
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“O abdômen é um símbolo poderoso na medicina chinesa”. Entrevista com Gilles Andrès - Instituto Humanitas Unisinos - IHU