09 Setembro 2011
Professor de cristologia e de diálogo inter-religioso na Universidade de Chennai (Madras), em Tamil Nadu, mas também em todo o mundo, esse jesuíta é um dos pensadores indianos mais conhecido no Ocidente.
A reportagem é de Claire Lesegretain, publicada no jornal francês La Croix, 03-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Depois de uma hora de motocarrro, no tráfego barulhento e empoeirado de Bangalore, cidade vitrine da Índia moderna, a chegada na tranquilidade do verde campus do Dharmaran College é um alívio. É aqui que Michael Amaladoss nos recebe durante a sua passagem pela capital de Karnataka para os seus cursos anuais.
O escritório que ele ocupa, no piso térreo do Bloco Bhavan Savari, é decorado só com duas cadeiras e com uma mesa onde ele apoia o seu laptop. Esse jesuíta de 74 anos vive, assim, a metade do ano fora da sua residência do Loyola College, a renomada universidade dos jesuítas de Chennai (Madras).
De fato, é na capital do seu Tamil Nadu natal que ele voltou a viver depois da aposentadoria em 2002, para dirigir o Instituto para o Diálogo com as Culturas e as Religiões (IDCR). O centro universitário de pesquisa do Loyola College tem como objetivo ajudar o diálogo e a paz entre hindus, muçulmanos e cristãos. "Queremos que o governo e os responsáveis políticos tomem consciência de que, enquanto sofrimentos e desejos de vingança persistam, os conflitos entre comunidades continuarão envenenando várias gerações".
Assim, em 2009, os estudantes do IDCR foram para Coimbatore, 12 anos depois dos sangrentos confrontos de dezembro de 1997 entre nacionalistas hindus e militantes muçulmanos, para recolher os depoimentos das duas partes. "Esses jovens perceberam como as feridas ainda estavam vivas e de como um nada poderia revivê-las", explica o jesuíta, que lembra que 45 muçulmanos – dos cerca de 150 que haviam sido presos na época – ainda estão presos.
Segundo ele, as tensões entre a maioria hindu e a minoria muçulmana remontam ao fato de a divisão do país em 1947 não ter sido aceita: "Essa continua sendo uma ferida profunda na identidade indiana. Paralelamente, os muçulmanos, sentindo-se oprimidos, se defendem unindo-se a grupos fundamentalistas".
Com os seus pequenos grupos de estudantes, "provenientes da base", Michael Amaladoss também trabalha sobre as violências entre castas, em três vilarejos do Tamil Nadu. "Essas violências se enraízam nas estruturas feudais de opressão econômica e política", afirma, antes de lamentar que o seu instituto não dispõe de recursos humanos e financeiros para um trabalho de grande escala em longo prazo, como as ONGs especializadas na justiça e na reconciliação podem fazer.
A mesma busca de diálogo e de paz leva o Pe. Amaladoss a recomendar, no plano mundo, uma harmonia alegre, feita de "boa vontade e de partilha entre os seres humanos, com a Criação e com o Absoluto divino". É isso que o jesuíta indiano chama de "harmonia advaítica", do sânscrito, "advaíta", que significa não dualidade – ou seja, a não diferenciação da individualidade e da Totalidade.
Como ele escreveu no seu último livro traduzido para o francês, Le Cosmos dansant, a harmonia advaítica é caracterizada por "uma unidade fundamental na diversidade e um dinamismo, como um corpo em movimento, uma dança de vida". Portanto, não é por acaso que o versículo evangélico sobre a unidade do Pai e do Filho (Jo 17,21) lhe vem à mente espontaneamente quando lhe é pedida uma dedicatória: "Assim como Deus e Jesus eram um, há uma unidade fundamental de todo ser com Deus", continua, ressaltando a urgente necessidade de se recentrar e de unificar a si mesmo por meio do silêncio, da interioridade, da aceitação, da criatividade...
Uma vocação semelhante para a unidade e para a harmonia não pode ser desconectada com o seu nome. "Como eu nasci no dia 8 de dezembro, fui chamado Amaladoss, do tamul Amala, imaculada, e Doss, servidor", sorri. Aquele que ele usa como sobrenome no Ocidente é, portanto, na Índia, um nome do meio. Originário de Dindigul, "pequena" cidade de 60 mil habitantes, perto de Madurai (Tamil Nadu), onde seus pais cristãos eram professores, Michael foi inscrito, com a idade de 11 anos, no colégio dos jesuítas de Tiruchirappaly. Seis anos depois, entrou na Companhia de Jesus, como ocorria habitualmente nessa época. Depois dos anos de postulantado, noviciado, estudos clássicos e filosofia, ele estudou por dois anos a música clássica do sul da Índia, em Chennai.
Então, depois de um ano de preparação para obter um diploma de educador, estudou teologia em Kurseong, a antiga faculdade de teologia dos jesuítas no Himalaia. De lá, chegou a Paris, onde, morando na Rue de Sèvres, encontrou famosos jesuítas da época, como o liturgista Gelineau e o exegeta Paul Beauchamp... "Era apaixonante escutá-los".
De retorno à Índia, o jesuíta se dividiu entre o seminário maior de Saint-Paul Tiruchirappalli e a faculdade de teologia dos jesuítas Vidya Jyoti em Nova Delhi. Naqueles anos pós-conciliares, deu-se muita ênfase à inculturação e ao diálogo inter-religioso, o que não desagradou o Pe. Amaladoss, que se entusiasma com literatura e espiritualidade indiana.
"Participei do lançamento de muitos ashrams (centros espirituais), sessões, livros... para fazer a teologia cristã dialogar com a cultura indiana", diz, lamentando o fato de que, 15 anos depois, "bloqueios provenientes de Roma e de bispos indianos formados na Europa" impuseram uma suspensão dessas iniciativas. "O Vaticano confunde unidade e uniformidade, e a uniformidade é percebida através da perspectiva europeia, sem tentar compreender as especificidades da África, da América Latina ou da Ásia", continua.
Foi então que o novo geral da Companhia, o Pe. Peter-Hans Kolvenbach, o chamou como assistente em Roma. Amaladoss permaneceu ali por 12 anos. Anos enriquecedores, marcados pelos domingos passados na paróquia de Frosinone, a 80 km da capital italiana. "Foi em Roma que eu me tornei missiólogo", sorri. De fato, para defender o seu ponto de vista asiático no diálogo e na inculturação, ele se interessou por eclesiologia e cristologia, e colaborou com o grupo Sedas, que reúne várias congregações missionárias que refletem sobre a missão e inculturação. Foi assim que ele foi nomeado consultor junto ao Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-Religioso, então presidido pelo cardeal nigeriano Francis Arinze.
Durante os anos romanos, uma vez que ele tinha mais tempo para escrever, tornou-se um autor prolífico. Durante 24 anos, ele escreveu regularmente para a revista bimensal cristã The New Leader, publicada em Chennai, mas lida em toda a Índia. "Muitas religiosas, leigos, mas também padres e bispos me conhecem por meio desses artigos, nos quais eu tentava divulgar os desafios e o que estava em jogo na pesquisa teológica".
O Pe. Amaladoss também publicou 30 livros em inglês, a maior parte traduzida – particularmente O Jesus asiático, traduzido em sete línguas, incluindo o vietnamita e o indonésio. Muitos livros testemunham pesquisas conduzidas por uma geração inteira de padres universitários que, como ele, contribuíram para a difusão de teologia indiana: George Soares, Samuel Rayan, Felix Wilfred, John Tike ou também George GispertSauch, um pouco mais idoso, e Aloysius Pieris, do Sri Lanka.
"Não existe teólogo sério na Índia que negue que o Cristo é único, mas o nosso desafio é afirmar tudo isso em um mundo plural", irrita-se, quando são lembradas as sanções romanas destes últimos anos contra alguns religiosos indianos. "A teologia indiana está realizando o que São Paulo fez há dois mil anos", ele gosta de repetir. "Asim como o apóstolo nas nações inculturou o Cristo no logos e na filosofia gregas, nós o inculturamos no espírito indiano do advaíta". E quando ele é perguntado sobre quanto tempo será necessário para esse trabalho de inculturação, ele não hesita em responder: "25 anos".
Ele enfatiza a sua identidade indígena, "porque não se pode fazer teologia sem estar enraizado em uma língua, em uma cultura", mas se considera um "ser mundial". Depois de um ano, em 2007-2008, na Universidade Georgetown em Washington para dar cursos de cristologia e de inculturação, Michael Amaladoss continua ensinando em Berkeley (Califórnia), assim como em diversas universidades dos jesuítas: Lumen Vitae (Bruxelas), Tchan Maï (Tailândia) e Manila (Filipinas). Sem falar das conferências que ele é convidado a dar na China, na Coreia, na Alemanha, na Romênia... Em todas as suas viagens, ele prefere "reencontrar bons amigos ao invés de visitar museus", uma forma de cultivar uma vida social dentro de uma vida de trabalho muito intenso com poucas férias.
Por onde quer que ele passe, ele quer ser uma voz da Índia e da Ásia, para ajudar a repensar a mundialização: não a do comércio e do consumo, que aprofunda ainda mais o fosso entre ricos e pobres, mas sim a da harmonia.
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Michael Amaladoss, teólogo indiano da harmonia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU