05 Janeiro 2012
Um bispo de Illinois fecha as associações de caridade para não torná-las "cúmplices" da lei que as obriga a considerar os homossexuais como pais adotivos.
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vatican Insider, 02-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
As normas sobre a adoção por casais gays limitam a liberdade religiosa. Com esse argumento, no estado norte-americano de Illinois, o bispo de Springfield, Thomas J. Paprocki, fechou a maior parte das instituições de caridade católicas não para torná-las "cúmplices" da nova regulamentação estatal que as obriga a considerar como potenciais "pais adotivos" os casais homossexuais.
Há alguns meses, o Departamento para os Serviços às Crianças e à Família de Illinois havia anunciado às quatro dioceses católicas desse Estado que não queria renovar os contratos de serviço para a adoção e o acolhimento familiar, porque elas não preveem o fornecimento desses serviços a casais homossexuais também.
"A novidade deriva de uma lei paradoxalmente chamada de Illinois Religious Freedom Protection and Civil Union Act, que entrou em vigor no dia 1º de julho de 2011", explica o legionário de Cristo padre John Flynn à agência católica Zenit. A nova lei legaliza as uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, sem prever isenções para as organizações religiosas.
Posteriormente, as organizações católicas da diocese de Joliet, Springfield e Belleville recorreram à Corte de Apelações do Estado porque para que bloqueie a transferência das práticas de acolhimento familiar a outras organizações. Ao mesmo tempo, também pediram à Corte que examine a decisão do Estado para dar fim aos contratos de acolhimento com as organizações católicas, defendendo que isso viola a liberdade religiosa. A Corte, no entanto, recusou-se a impedir a transferência.
Ainda no final de outubro, o bispo de Springfield, Thomas John Paprocki, havia criticado a exclusão das organizações católicas por parte do Estado, denunciando que isso criou dificuldades inúteis para as crianças e as famílias, que poderiam ser ajudadas. Desde que as uniões civis foram legalmente reconhecidas no Estado de Illinois, as agências de adoção de marca católica, que recebiam fundos públicos mas se recusavam a permitir a adoção de crianças por casais gays, tiveram que suspender suas atividades também em outras dioceses do Estado. Por decisão do bispo Thomas Doran da diocese de Rockford, das cerca de 330 crianças a serem adotadas, ocupa-se uma entidade secular, o Youth Service Bureau of Illinois Valley. Dirigido por um fiel, David McClure, a entidade não nega adoções para casais homossexuais.
Aumento das adoções
A Universidade da Califórnia concluiu um estudo baseado nos dados do último censo realizado pelas autoridades dos EUA para conhecer a taxa de adoção existente entre os casais de mesmo sexo. Foi revelado que, em 2009, 31.571 crianças foram adotadas por parceiros homossexuais. Esse número sugere uma quadruplicação das adoções com relação ao ano 2000, quando as crianças adotadas foram 8.310.
Acirra-se assim as disputas entre o Estado norte-americano de Illinois, que reconhece as uniões civis homossexuais, e a Igreja Católica, cujas agências de adoção não estão autorizados a gerir as solicitações por parte de casais gays e lésbicas.
Depois do "não" do bispo Doran, da diocese de Rockford, que levou à passagem da gestão da atividade a um centro secular, a Thomas More Society, uma associação ativa em quatro dioceses, perdeu a ação apresentada no tribunal para que lhe fosse concedida a isenção das leis antidiscriminação em vigor. O juiz John Schmidt determinou que o Estado de Illinois pode interromper legitimamente a colaboração com as agências católicas, para que ninguém goze de "um direito legal reconhecido" de ter um contrato com o Estado.
Documento vaticano
O "não" dos bispos de Illinois se baseia em um documento vaticano produzido pelo então cardeal Joseph Ratzinger, que, em julho de 2003, definiu as uniões homossexuais como "nocivas para o reto desenvolvimento da sociedade humana" e exorta os políticos a não cometer o ato "gravemente imoral" de legalizar de algum modo os casais gays.
Além disso, não se deve permitir às uniões homossexuais nenhum tipo de adoção de crianças: seria, segundo a Santa Sé, um ato de "violência" contra os menores, uma "prática imoral", em conflito com os princípios da ONU. O texto de referência, que traz a assinatura do então cardeal Joseph Ratzinger quando era prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, consiste em uma dezena de páginas de Considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais. O documento visa abertamente, como explica a introdução, a "iluminar a atividade dos políticos católicos", para que se oponham a qualquer tipo de tutela legal das uniões homossexuais. Não fazer isso seria uma "prática gravemente imoral".
Joseph Ratzinger usa tons muito severos nas suas argumentações. As uniões homossexuais não têm nenhum papel social, "não se encontram em condição de garantir de modo adequado a procriação e a sobrevivência da espécie humana" e, portanto, não há nenhuma razão para o seu reconhecimento legal. "O matrimônio é santo, ao passo que as relações homossexuais estão em contraste com a lei moral natural. Os atos homossexuais, de fato, fecham o ato sexual ao dom da vida. Não são fruto de uma verdadeira complementaridade afetiva e sexual. Não se podem, de maneira nenhuma, aprovar", adverte.
O documento relembra passagens da Sagrada Escritura onde as inclinações homossexuais são condenadas como "graves depravações". A Igreja Católica de hoje, observa Joseph Ratzinger, exorta a acolher "com respeito, compaixão e delicadeza" as pessoas com tendências homossexuais, mas elas são chamadas à castidade. As uniões não podem ser – na opinião do Vaticano – nem encorajadas, nem toleradas, muito menos legalizadas.
"As uniões homossexuais não desempenham, nem mesmo em sentido analógico remoto, as funções pelas quais o matrimônio e a família merecem um reconhecimento específico e qualificado. Há, pelo contrário, razões válidas para afirmar que tais uniões são nocivas a um recto progresso da sociedade humana, sobretudo se aumentasse a sua efetiva incidência sobre o tecido social".
Portanto, "reconhecer legalmente as uniões homossexuais ou equipará-las ao matrimônio, significaria, não só aprovar um comportamento errado, com a consequência de convertê-lo num modelo para a sociedade atual, mas também ofuscar valores fundamentais que fazem parte do patrimônio comum da humanidade".
Por esse motivo, a parte final do documento se concentra em uma série de indicações comportamentais para os políticos católicos: os parlamentares têm o "dever moral" de se opor a qualquer projeto de lei favorável ao reconhecimento legal das uniões homossexuais. "Conceder o sufrágio do próprio voto a um texto legislativo tão nocivo ao bem comum da sociedade é um ato gravemente imoral", adverte a Santa Sé.
No caso de político católico se encontrar na presença de uma lei já em vigor, ele deve dar a conhecer a sua oposição e pode licitamente apoiar iniciativas legislativas destinadas a limitar os danos. O documento é intransigente sobre a possibilidade de adoção de crianças por casais homossexuais.
"Inserir crianças nas uniões homossexuais através da adopção significa, na realidade, praticar a violência sobre essas crianças, no sentido que se aproveita do seu estado de fraqueza para introduzi-las em ambientes que não favorecem o seu pleno desenvolvimento humano", especifica-se. "Não há dúvida – continua – que uma tal prática seria gravemente imoral e pôr-se-ia em aberta contradição com o princípio reconhecido também pela Convenção internacional da ONU sobre os direitos da criança".
O Vaticano, que, em julho de 2003, havia enviado o documento sob embargo para todas as dioceses do mundo, optou por publicá-lo sem nenhuma coletiva de imprensa de apresentação. E o apelo da Santa Sé contra a legalização dos casais gays chegou justamente no dia seguinte ao pedido do então presidente norte-americano George W. Bush de uma nova lei contra os matrimônios homossexuais.
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A batalha da Igreja dos EUA contra as adoções por casais gays - Instituto Humanitas Unisinos - IHU