10 Março 2014
É preciso que se difunda um novo modo – mais crível e concreto – de ser testemunhas do Evangelho, se não queremos que a revolução do Papa Francisco conheça o destino daquele grafite que apareceu nos muros de Roma no fim de janeiro, uma caricatura do papa vestido como Super-Homem.
Publicamos aqui o editorial da edição de março da revista Popoli, dos jesuítas italianos. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Há um modo para diluir ou até mesmo sufocar a revolução iniciada pelo Papa Francisco no dia 13 de marco de 2013. Vimos esse modo em obra continuamente nestes meses e atende pelo nome – feio, mas eficaz – de "papolatria".
Explicava Otto Kallscheuer, filósofo católico alemão, na sequência da renúncia de Bento XVI, decisão que representou a radical negação de tal fenômeno: "A identificação da Igreja com o papa, depois do Concílio Vaticano I, sofreu uma concentração ainda mais acentuada pela sociedade das mídias, em formas nunca antes registradas. Antes, no máximo, o papa era um monarca espiritual dentre muitos outros, e nem mesmo com um poder tão grande sobre a Igreja. A 'papolatria', ao invés, é fruto da modernidade" (Il Foglio, 18 de fevereiro de 2013).
Justamente por estar conectada à modernidade no seu conjunto, e não apenas à dimensão religiosa, essa dinâmica está em ação também em muitos outros âmbitos: sabemos bem, por exemplo, como é pervasiva a personalização no mundo da política, a busca obsessiva e sempre irremediavelmente decepcionante de um líder taumatúrgico ao qual se pode confiar a salvação própria e alheia.
O papa argentino – digamo-lo para evitar equívocos – com o seu estilo sóbrio e o seu exercício do poder como serviço, não faz nada para alimentar o culto à personalidade. E é compreensível que um pontífice que veio "do fim do mundo", principalmente de modos tão insólitos, desperte curiosidade. De fato, já sabemos tudo sobre Jorge Mario Bergoglio, graças também ao impressionante boom editorial destes meses (feito de algumas ótimas publicações e de muitas operações de marketing religioso).
Mas – passado um ano desde aquele célebre "Boa noite" da sacada de São Pedro – chegou o momento de olhar não só para o Vaticano e pôr sobre os refletores (não midiáticos, mas da consciência) também as nossas relações, o nosso estilo de vida, as nossas escolhas pessoais e coletivas.
As oportunidades para esse exercício não faltam. Todos nós acompanhamos com emoção a histórica visita do papa a Lampedusa e o seu grito contra a globalização da indiferença: desde então, algo mudou no nosso modo de combater a marginalidade e as injustiças estruturais, como indivíduos, como Igreja, como comunidade política?
Também foi impressionante, em setembro, a mobilização mundial que se seguiu à proposta do papa de um jejum pela paz na Síria: e, depois, que herança de compromisso pela paz essa iniciativa deixou?
Francisco também está trabalhando por uma gestão mais transparente e ética das finanças vaticanas: é um imperativo que assumimos como nosso, nas nossas escolhas de consumo e de investimento?
São apenas perguntas exemplificativas, cada um pode acrescentar as suas próprias. O importante é que as respostas cheguem e, sobretudo, se difunda um novo modo – mais crível e concreto – de ser testemunhas do Evangelho, se não queremos que a revolução do Papa Francisco conheça o destino daquele grafite que apareceu nos muros de Roma no fim de janeiro, uma caricatura do papa vestido como Super-Homem. Acabou nas primeiras páginas e nos sites de todo o planeta, arrancou muitos sorrisos, para depois ser rapidamente removido.
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Um papa super-homem? Como diluir a revolução de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU