05 Novembro 2015
Trata-se de uma correspondência confidencial, que remonta a 1970, sobre negócios entre o Vaticano, o negociador da Propaganda Due [ex-loja maçônica italiana] Umberto Ortolani e o banqueiro Michele Sindona, enviada no dia 26 de abril do ano passado para a Prefeitura para os Assuntos Econômicos, "para ameaçar o Papa Francisco" e "causar grave embaraço para a Santa Sé".
A reportagem é de Fabrizio Caccia, publicada no jornal Corriere della Sera, 04-11-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Para Sindona, como testemunho de como o banqueiro siciliano estava identificado na época com a Cúria Romana, chegavam diretamente cartas do Vaticano assim endereçadas: "Mr. Michele Sindona c/o Pope Paul VI, The Vatican, Rome (Italy)".
Folheando as páginas de Via Crucis, o livro de Gianluigi Nuzzi (Ed. Chiarelettere) que foi apresentado nessa quarta-feira em Roma, percebe-se muito claramente o voo obscuro dos "corvos" sobre a colunata de Bernini e o choque de poder em curso no Vaticano, a guerra "já declarada" entre velho e novo, segundo as mesmas palavras relatadas em Via Crucis pelo maltês Joseph Zahra, braço direito do cardeal australiano George Pell, o chefe da Secretaria para a Economia vaticana.
Mas também há o relato de um roubo surpreendente, digno do Watergate, que ocorreu no dia 30 de março de 2014 no Palácio das Congregações, para saquear arquivos e documentos do arquivo secreto da Coşea, a comissão pontifícia de estudo sobre as estruturas econômicas e administrativas do Vaticano.
Cartas muito delicadas e uma mensagem clara dirigida "a quem leva adiante a mudança". O furto, do qual nunca se tinha ouvido falar nada até agora, teria sido um alerta. Como se dissesse: "Sabemos onde vocês guardam os seus arquivos. Podemos chegar até eles quando e como quisermos. Sabemos e podemos tudo".
O outro livro, que será publicado nesta quinta-feira, escrito para a editora Feltrinelli por Emiliano Fittipaldi, intitulado Avarizia, que gera muita ansiedade nos Sagrados Palácios, também oferece um quadro de gastos loucos, desperdícios e abusos vários que, com a Igreja pobre de Francisco, não têm propriamente nada em comum.
Em janeiro deste ano – escreve Fittipaldi – alguém enviou ao papa todos os itens de despesas da recém-nascida Secretaria para a Economia, que Bergoglio havia confiado alguns meses antes a George Pell, o cardeal chamado da Austrália para endireitar usos e costumes nefastos da Cúria.
E a prestação de contas publicada é assustadora: centenas de milhares de euros para voos em classe executiva, paramentos sob medida, móveis finos, um salário – o de um consultor muito próximo de Pell, Danny Casey – de 15.000 euros líquidos por mês. Até mesmo uma pia de cozinha paga por nada menos do que 4.600 euros. Em apenas seis meses de atividade, o novo dicastério custou às finanças vaticanas mais de meio milhão de euros.
E ainda: os caixas de fundações e hospitais usados como caixas eletrônicos pelos prelados. E o Vaticano como "duty free", que continua vendendo gasolina e cigarros a preços de barganha aos proprietários de nada menos do que 41.000 cartões de compra doados por aí, enquanto os que teriam direito deveriam ser apenas 5.000.
No entanto, os sábios da Coşea tinham escrito claramente para Bergoglio: "Algumas das atividades comerciais não estão em linha com a imagem pública da Santa Sé e prejudicam a sua missão". Alguns exemplos? "Tabaco, perfumes, roupas, produtos eletrônicos, gasolina."
No livro Avarizia, há todo o relatório dos analistas da Ernst&Young: "O combustível – escrevem – é a fonte de renda e de margens mais importantes. As bombas de gasolina são duas, e o preço para os consumidores é 20% mais baixo do que o italiano". Assim, dos 27 milhões de euros de gasolina vendida em 2012 no Vaticano "18% foram vendidos a clientes desconhecidos". Ao todo, 27.000 pessoas fizeram a fila na bomba, "muitas mais do que as autorizadas".
A última estranheza? A dos quatro fundos de caridade geridos pelo IOR. Cruzando as tabelas, Fittipaldi descobriu que, em 2013 e em 2014, o fundo à disposição da comissão cardinalícia liderada pelo cardeal Santos Abril y Castelló, apesar de um saldo líquido de 425.000 euros não alocou um centavo para os necessitados.
O fundo criado para financiar as "Santas Missas", com um saldo que chegou a 2,7 milhões de euros, também preferiu guardar o dinheiro no bolso: em 2014, aos sacerdotes de todo o mundo, chegou ao todo a minúscula cifra de 35.000 euros.
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Uma velha carta maçônica para constranger o papa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU