10 Abril 2015
Graças a palavras como as de Bonhoeffer, a teologia protestante do pós-guerra teve a formidável sacudida conhecida como "teologia da secularização", que contribuiu para suscitar a "théologie nouvelle" em âmbito católico e, a partir desta, a renovação do Vaticano II.
A opinião é do teólogo italiano Vito Mancuso, professor da Universidade de Pádua, em artigo publicado no jornal La Repubblica, 09-04-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Exatamente 70 anos atrás, na madrugada do dia 9 de abril de 1945, completamente nu, era executado no campo de concentração nazista de Flossenbürg o teólogo protestante Dietrich Bonhoeffer, que pagava assim pela sua participação na Resistência.
Em 1955, o médico do campo de concentração, H. Fischer-Hüllstrung, concedeu um testemunho, desde então repetidamente citado, segundo o qual o condenado, antes de se despir, tinha se recolhido em oração: "A oração tão devota e confiante daquele homem extraordinariamente simpático me abalou profundamente; mesmo no lugar do suplício, ele fez uma breve oração. Então, subiu corajoso e resignado a escada do patíbulo. A morte veio depois de alguns segundos". O médico concluía: "Na minha atividade médica de quase 50 anos, eu nunca vi um homem morrer com tanta confiança em Deus".
Hoje, sabemos que essas belas palavras edificantes são uma mentira. Com elas, o médico pretendia, na realidade, encobrir a própria responsabilidade, já que a sua tarefa, como testemunhado por um sobrevivente do campo de concentração, Jørgen Mogensen, diplomata dinamarquês, era de reanimar os condenados para submetê-los ao suplício uma segunda vez e prolongar a sua agonia.
Além disso, segundo Mogensen, em Flossenbürg, não havia nenhum patíbulo, e Bonhoeffer morreu como o almirante Canaris e o general Oster, seus superiores nas fileiras da resistência, "lentamente estrangulados até a morte por uma corda que subia e descia de um gancho de ferro preso em uma parede" e reanimados várias vezes pelo médico para repetir sadicamente o procedimento.
Bonhoeffer, portanto, não foi enforcado, mas repetidamente estrangulado e não morreu depois de poucos segundos. Quanto à "tanta confiança em Deus", é bom esperar nisso.
Ele tinha acabado de completar 39 anos e era uma das mentes mais brilhantes da teologia alemã, professor da Universidade de Berlim aos 25 anos, distante parente de Goethe, o pai titular da cátedra berilense de neuropsiquiatria.
Depois do advento de Hitler ao poder, no dia 30 de janeiro de 1933, enquanto as Igrejas alemãs estipulavam acordos com o regime nazista (Eugenio Pacelli, futuro Pio XII, assinou a Concordata no dia 20 de julho de 1933), Bonhoeffer, no dia 1º de fevereiro, depois de dois dias, manifestava na rádio a sua preocupação com a transformação do conceito de Führer no de Verführer, "sedutor".
Três meses depois, ele publicava o artigo A Igreja diante da questão judaica e, depois da "noite dos cristais" do dia 9 de novembro de 1938, começou a repetir aos seus estudantes: "Só quem grita pelos judeus pode cantar o canto gregoriano".
A mesma lógica imbuída de retidão e de justiça o levou à Resistência para matar Hitler, porque, "se um louco na direção de um carro atropela os pedestres, a minha tarefa não é só cuidar dos feridos, mas, acima de tudo, parar aquele maluco" (Gandhi, no dia 4 de novembro de 1926, havia expressado a mesma ideia com um exemplo semelhante).
Ele foi preso no dia 5 de abril de 1943 e trancado na prisão de Tegel, onde passou um ano e meio (depois, a prisão berlinense da Gestapo, depois Buchenwald, finalmente Flossenbürg). Também pelo fato de ser neto do comandante de Berlim, o general Paul von Hase, em Tegel, Bonhoeffer passou um período relativamente confortável: assim nasceram as cartas e os escritos publicados, depois, em 1951, com o título Resistência e submissão, hoje ponto de referência capital da teologia contemporânea.
Em uma carta ao amigo Bethge, lê-se: "Eu posso muito bem imaginar que, algumas vezes, você começa a odiar o sol. Porém, você sabe, eu gostaria de poder percebê-lo mais uma vez em toda a sua força, quando ele arde na pele e, pouco a pouco, inflama todo o corpo, de modo que você sabe de novo que o homem é um ser corpóreo. Eu gostaria de me cansar dele em vez dos livros e das ideias, gostaria que ele despertasse a minha existência animal, não aquela animalidade que diminui o ser humano, mas aquela que o libera do mofamento e da inautenticidade de uma existência apenas espiritual e torna o homem mais puro e mais feliz".
Quem fala assim não é um materialista, mas quem fez da fé o centro da vida. Mas ele adverte que a tradicional configuração religiosa já é inadequada para expressar a potência espiritual da vida. A partir da força do sol, Bonhoeffer intui que o espírito não desce do alto, apesar da matéria, mas sobe de baixo, do calor da natureza, quase como uma efusão da matéria, como já tinham expressado Teilhard de Chardin na frente católica e Pavel Florensky na frente ortodoxa, abrindo territórios inexplorados à teologia cristã.
Assim disse ele, no dia 30 de abril de 1944, ao amigo: "Você se admiraria ou talvez até se preocuparia com as minhas ideias teológicas e com as suas consequências". Quais ideias? Aquelas segundo as quais "o divino não está nas realidades absolutas, mas na forma humana natural".
Escrevendo para a sua noiva, Bonhoeffer explica a sua ideia de fé: "Eu não me refiro à fé que foge do mundo, mas a que resiste no mundo e ama e permanece fiel à terra, apesar de todas as tribulações que ela nos provoca. O nosso matrimônio deve ser um sim à terra de Deus, deve reforçar em nós a coragem de trabalhar e de criar algo sobre a terra. Temo que os cristãos que ousam estar sobre a terra com um pé só estarão com um pé só no céu".
Graças a palavras como essas, a teologia protestante do pós-guerra teve aquela formidável sacudida conhecida como "teologia da secularização", que viu como protagonistas nomes como Bultmann, Gogarten, Tillich e que contribuiu para suscitar a "théologie nouvelle" em âmbito católico e, a partir desta, a renovação do Vaticano II.
Hoje, desse teólogo devoto tanto a Deus quanto ao mundo, são publicados pela editora Piemme, com o título La fragilità del male [A fragilidade do mal], alguns escritos. O editor declara que se trata de "escritos inéditos"; na realidade, nem todos o são, porque aqueles datados depois do dia 5 de abril de 1943 foram publicados na Itália em Resistenza e resa.
Trata-se de textos ocasionais, provenientes de pregações, lições exegéticas e meditações. Assim, o leitor encontra, na prosa límpida de Bonhoeffer, temas como o medo, a dor, a morte, a guerra, a solidão, o pecado, a tentação, a cólera de Deus, o diabo, a dor de Jesus...
Serve de epígrafe esta frase de 1939: "Comumente, no decorrer das nossas existências, nós não falamos de boa vontade de vitória: é uma palavra grande demais. Ao longo dos anos, sofremos perdas demais, muitos momentos de fraqueza, e cedimentos graves demais sempre nos obstaculizaram a vitória. No entanto, o espírito que habita em nós anseia por ela, deseja o sucesso final contra o mal e contra a morte".
Qualquer que seja o modo pelo qual ocorreu a morte em Flossenbürg 70 anos atrás, a vida de Bonhoeffer permanece hoje como uma promessa para o "sucesso final" do bem e da vida.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Amor pela vida, o centro da fé de Bonhoeffer. Artigo de Vito Mancuso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU