18 Março 2015
Diego Fares é o escritor que o papa aconselha que os jornalistas leiam. Sobre Bergoglio, ele diz: "Ele mostra como olhar os outros nos olhos".
A reportagem é de Paolo Pegoraro, publicada na revista Credere, n. 11, 15-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Hoje, defrontamo-nos sem nos tocar. Fala-se muito de "diálogo", pouco de "encontro". Como se as pessoas fossem feitas de ideias, mas não de carne e sangue, desejos, afetos. O Papa Francisco insiste no contrário.
"Ele nos diz: quando vocês dá esmola, se não olhar nos olhos da pessoa, se você não a tocar e, ao contrário, deixar a moeda e se afastar, você vai estar em problemas." Quem explica é o jesuíta argentino Diego Fares, novo membro da casa dos escritores da revista La Civiltà Cattolica em Roma. Para ele, o papa é "padre Jorge", a quem ele conhece há quase 40 anos.
O padre Fares é uma figura incomum: lecionou metafísica em diversas universidades, mas, ao mesmo tempo, comprometeu-se por 20 anos com uma equipe de leigos no centro de acolhida para adultos indigentes Hogar de San José e no hospital para doentes terminais Casa de la Bondad.
Ele tem o perfil intelectual que agrada ao Papa Francisco, geralmente alérgico aos acadêmicos "puros". Tanto que, no voo de retorno do Rio de Janeiro, aconselhou a um jornalista que lesse "os livros do padre Fares". Em italiano, eles ainda não foram traduzidos, mas ele assinou o livro Papa Francesco è come un bambù [Papa Francisco é como um bambu] (Ancora, 78 páginas).
Eis a entrevista.
Padre Fares, a maioria de nós não tem a experiência de "tocar" os pobres. O senhor trabalhou longamente com eles: o que se aprende apenas estando com eles?
Na medida em que nos deixamos ferir na própria humanidade pelo outro ferido, pela sua doença terminal ou pela exclusão social – que também é terminal –, descobrimos a alegria de poder compadecer e de que o outro o perceba. E é isso que nos distingue dos animais e das máquinas.
O então padre Jorge chegou a passar pelo Hogar de San José?
No ano 2000, eu participava como sempre da Missa do Crisma da Quinta-Feira Santa. Enquanto eu passava para cumprimentá-lo, ele me disse, ali no meio da multidão de sacerdotes, que naquela noite ele gostaria de ir ao Hogar de San José para lavar os pés dos nossos hóspedes, na missa da Última Ceia. Ele me pediu para não fazer publicidade com os jornalistas, porque eles prestavam muita atenção a esses gestos "novos" que o cardeal tinha começado a fazer no ano anterior, indo lavar os pés dos presos da prisão de Devoto.
Como ocorreu a celebração?
Foi uma cerimônia muito emocionante, da qual conservamos apenas algumas fotos – naquele tempo ainda não havia a moda dos selfies! –, mas a sua presença ficou gravada no nosso coração. Ao único jornalista que tomou conhecimento do evento e que o esperava do lado de fora do Lar, ele disse que as pessoas sem-abrigo "mereciam uma missa como essa" e que ele "sentia muito carinho pelo Hogar, porque tinha sido fundado por um amigo seu, o padre Jorge Chichizola, jesuíta", ao qual eu prestava ajuda. Treze anos depois, um dia antes de partir para o conclave, ele me telefonou e me disse que, antes de se aposentar, queria passar a sua última Quinta-Feira Santa no Hogar. Lembro-me que ele me disse: "Na volta, vamos falar a respeito e combinaremos". A Quinta-Feira Santa de 2013 ele não passou no Hogar, mas já como papa, aqui em Roma, com os jovens da prisão juvenil Casal del Marmo.
Ele também foi à Casa de la Bondad?
A Casa de la Bondad faz parte do Manos Abiertas, um movimento fundado pelo padre jesuíta Ángel Rossi, ele também grande amigo do papa, e reúne uma enorme quantidade de voluntários leigos. O cardeal Bergoglio doou uma parte substancial dos fundos para que ela fosse construída. De fato, as nossas obras de caridade social – centros de acolhimento, casas para doentes terminais, lares de idosos e crianças, centros de formação, a Cooperativa de Trabalho Padre Hurtado... – são fruto da formação que Bergoglio deu aos jovens jesuítas quando foi mestre de noviços, provincial e reitor na nossa etapa de formação.
O senhor é professor de filosofia. O Papa Francisco recomenda que a ciência seja "humana" e não "de laboratório". Como muda o modo de conhecer estando em contato com os últimos?
No laboratório, não se pensa na realidade que vivemos e construímos socialmente, todos juntos, mas em uma realidade limitada à hipótese que está sendo investigada. As perguntas não são as mesmas quando alguém as faz ou quando, por exemplo, fazemos uma investigação anônima no Hogar e mais de 100 pessoas que vivem nas ruas respondem. Pensar a partir daquilo que esses nossos irmãos expressam em total espontaneidade nos levou a modificar muitos critérios que nos pareciam óbvios.
Por exemplo?
Entre a infinita quantidade de apreciações e julgamentos sinceros, sensíveis e alguns realmente geniais, eu me lembro de um sócio da Cooperativa de Trabalho Padre Hurtado, que interveio por ocasião da festa pelos 10 anos da cooperativa. É preciso ter em mente que, ao menos na Argentina, das cooperativas que se formam, depois de um ano, sobrevivem apenas 50% e, depois de cinco anos, apenas 20%. Pois bem, esse sócio disse que, na cooperativa, compartilhavam muito e que, no ano passado, estavam compartilhando "as perdas".
Na realidade, justamente o fato de estar disposto a compartilhar as perdas é o que faz de nós uma cooperativa, porque todos são capazes de compartilhar os lucros! Lembro-me que, naquele momento, eu pensei: essas pessoas muito humildes, que deram origem à cooperativa, compartilhando tantas dificuldades, progrediram socialmente mais do que nós, que tentamos nos unir para ajudá-las. É bom julgar o progresso e a solidez de uma sociedade a partir das perdas que está disposta a compartilhar. Nada é mais certo do que aquilo que o Papa Francisco diz: vê-se melhor a realidade a partir da periferia!
O Papa Francisco fala muitas vezes de "cultura" e de "povo". Mantêm-nas juntas. Mas, no Ocidente, são opostos: o que é popular não é cultura. Talvez, a crise do mundo da educação está justamente aí?
"Cultura" é o que um povo cultiva com amor, para compartilhar com os outros e transmitir aos seus filhos. O que se compartilha e se transmite com amor é sempre importante. Eu não faria distinções entre o que é "popular" e que é "culto", mas entre "valores comuns" – o Espírito, segundo São Paulo, é o que é comum, enquanto a carne é unicamente própria – e "desvalores", que se esgotam no próprio egoísmo consumista.
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Cultura, povo, pobres: ''Francisco nos ensinou a arte do encontro.'' Entrevista com Diego Fares - Instituto Humanitas Unisinos - IHU