Por: Cesar Sanson | 22 Janeiro 2015
Para o economista José Silvestre, medidas que alteram regras de concessão de benefícios sociais e incluem aumento de tributos e redução de crédito têm 'caráter recessivo' que se refletirão no mercado de trabalho.
A reportagem é de Vitor Nuzzi e publicada pela agências de notícias Rede Brasil Atual - RBA, 21-02-2015.
No próximo 3 de fevereiro, centrais sindicais e governo voltarão a se reunir para tentar um acordo em relação às medidas provisórias que alteram acesso a benefícios sociais. Até lá, assessores técnicos dos dois lados vão se debruçar sobre os textos. O coordenador de relações sindicais do Dieese, que coordenará o grupo técnico de assessoria das centrais, José Silvestre, acredita que alguns itens poderão ser alterados, mas não tem dúvida sobre a natureza das propostas apresentadas até agora pela nova equipe econômica, que incluem ainda aumento de tributos e redução de crédito, entre outros itens. "A lógica é de colocar a economia no chão", afirma Silvestre.
Segundo ele, as medidas têm caráter recessivo e terão impacto no mercado de trabalho. "Deve haver aumento da taxa de desemprego, uma desaceleração do ritmo de formalização e crescimento da informalidade", avalia. E o próprio governo, que espera conter gastos e aumentar a arrecadação, pode ver a sua receita diminuir.
"Partes das medidas anunciadas pelo (Joaquim) Levy vai direto ao consumo", observa Silvestre, em referência ao aumento de tributos anunciado na segunda-feira (19) pelo ministro da Fazenda. E as medidas provisórias sobre benefícios trabalhistas e da Previdência Social, acrescenta, tira recursos do sistema de proteção. "É um ajuste que está pegando uma parcela mais vulnerável da população."
Como recuperar depois?, questiona o economista. "Você está atacando áreas e recursos que vão para parcela grande da população, que em certa medida dinamizam a economia. São medidas que vão ter um efeito não apenas conjuntural. E vão na contramão do que a gente vinha assistindo nos últimos anos", diz Silvestre. "É claro que o modelo anterior já tinha dado sinais de fadiga, mas também por conta da questão externa." Uma preocupação do técnico do Dieese refere-se a uma aparente falta de foco na questão industrial. "Pelos depoimentos da nova equipe (econômica), principalmente do Levy, a indústria não está no centro das preocupações", avalia.
Desde que as medidas que alteram (e dificultam) o acesso a benefícios como seguro-desemprego, abono salarial e auxílio-doença foram anunciadas, ministros se revezaram na justificativa de que o objetivo era corrigir "fraudes e distorções" nos programas. Mas o discurso foi um pouco diferente na reunião com as centrais na última segunda-feira, mostrando que a preocupação não é apenas pontual. O ministro-chefe da Secretaria-geral da Presidência, Miguel Rossetto, por exemplo, afirmou que o objetivo era garantir o sistema de proteção social e proteger o patrimônio dos trabalhadores, citando a Previdência e o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
Segundo relatos de quem participou da reunião, Nelson Barbosa, do Planejamento, também adotou essa linha, falando da importância das medidas para o conjunto da economia. Foi Barbosa, por sinal, que ao final do encontro – realizado em São Paulo – informou sobre as medidas que Levy anunciava em Brasília. Foi mais um fator de irritação para os dirigentes das centrais, que já reclamavam de terem sido apenas informados sobre as propostas relativas ao benefícios, sem discussão prévia. O próprio Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) foi excluído.
"O governo está tentando justificar que as medidas não tinham caráter apenas estrutural, mas não aponta as fraudes e distorções. Não dá para aceitar que, em nome disso, você exclua milhões de pessoas", critica Silvestre. Ele lembra que uma das razões para o aumento de gastos do FAT é a rotatividade no mercado de trabalho. Você tem quase metade da mão de obra formalizada que fica menos de seis meses no emprego", acrescenta. O governo quer aumentar de seis para 18 meses o período mínimo para a primeira requisição do seguro-desemprego, o que já excluiria boa parte dos trabalhadores com direito ao benefícios. Sindicalistas acreditam que, nas negociações, é possível reduzir esse período.
A área econômica diz que espera economizar R$ 18 bilhões/ano com as medidas, sendo metade apenas com o seguro-desemprego. Rossetto alega que o anúncio ocorreu ainda em 2014, em 29 de dezembro – de forma "açodada", segundo o presidente da CUT, Vagner Freitas – por causa do princípio de anualidade, para garantir a sua aplicação. O ministro ressaltou que as mudanças só valem para futuros beneficiários.
Silvestre teme os efeitos da série de medidas restritivas, que incluem ainda aumento de taxas do crédito imobiliário, veto à correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda e alta dos juros, na atividade econômica, já fraca. Isso em um momento em que há indícios de crescimento da informalidade ou, pelo menos, de diminuição no ritmo da formalização do mercado, que por sua vez também dá sinais de ritmo menor, com pouca criação de vagas. Em certa medida, o desemprego nos últimos meses só não aumentou porque não houve entrada de pessoas no mercado de trabalho.
"A taxa de desemprego caiu em razão da expansão do mercado, mas também pela pressão menor da PEA (população economicamente ativa), especialmente daquela parcela jovem", lembra Silvestre. Parte da mão de obra mais jovem retardou sua entrada no mercado de trabalho por fatores como aumento da renda familiar e programas sociais. Agora, essa mão de obra pode voltar a pressionar o mercado, fazendo a taxa subir. A nova conjuntura também poderá ter impacto nas campanhas salariais deste ano. "Em 2015, vamos ter um cenário muito difícil. Não vamos ter os patamares de ganho real (acima da inflação) que vinha tendo até então."
Em março, o Dieese divulgará o balanço anual das campanhas salariais. Segundo o economista, 2014 poderá resultado ainda melhor do que o ano anterior, quando 87% das negociações pesquisadas tiveram aumento real. "Mas 2015 não deve manter."
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Técnico do Dieese diz que medidas do governo deixam a economia 'no chão' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU